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APPENDICE Á SESSÃO N.° 10 DE 1 DE FEVEREIRO DE 1892 9

O sr. Rebello da Silva: - Sr. presidente, estava longe de pensar, quando no ultimo dia de sessão tive a honra de fazer algumas considerações a esta camara, que a opinião por mim expendida de que a situação da fazenda publica não era positivamente desesperada, seria confirmada com o luminoso relatorio do sr. ministro da fazenda. Para restabelecer o equilibrio nas finanças do estado, exigem-se, é verdade, grandes sacrificios ao paiz; mas, quando todos se submetterem patrioticamente a esta lei de salvação publica, ter-se-ha inscripto mais uma pagina heroica em a nossa historia e poderemos encarar sem receio o futuro.

Mas, sr. presidente, a crise economica, o equilibrio da nossa balança do commercio, esse é que é difficil de attingir, nem vejo meios faceis e promptos a que os governos possam lançar a mão para conseguil-o.

Oe numeros da estatistica, simples como são 5 eloquentes ao mesmo tempo, provam que de todas as industrias aquella que mais precisa de protecção é a agricola, porque é a que manifesta maior decadencia.

Comprehende-se que uma nação industrial como a Inglaterra, que tem um vasto commercio em todo o mundo, troque os seus artefactos pelos productos alimentares de que carece para viver; mas, a Inglaterra e mesmo a Belgica tem nos seus territorios a alma das industrias fabris, o carvão de pedra, ao passo que nós temos que o importar.

É certo que as nossas industrias, attendendo ás circumstancias do paiz, tem progredido de uma maneira não vulgar, comtudo, ainda não attingiram nem talvez attingiram nunca uma importancia tal que lhes permitta competirem com a industria agricola, e saldarem pela sua exportação o nosso deficit commercial.

Quaes são pois aã causas do atrazo da nossa agricultura? É difficil em uma unica sessão resumil-as, mas ainda assim poderemos dividil-as em dois grandes grupos: umas são de origem remota e derivam da nossa legislação, outras são puramente economicas, dependem do estado geral dos mercados, dos preços de producção, das differentes doenças, etc.

Uma agricultura definha e morre quando a propriedade se immobilisa em mãos que não sabem aproveital-a, mas da mesma maneira se arruina quando a extrema divisão do solo reduz a propriedade a insignificante glebas quasi sem valor real. D'aqui derivam necessariamente as questões da grande, media e pequena propriedade, que tambem dependem muito do clima, das condições economicas de cada paiz e ainda de cada localidade; mas ha uma força artificial que se antepõe a todas estas annullando-as nos seus effeitos e obstando a que se constitua naturalmente a propriedade que mais convem a cada região; esta força é a da legislação que em o nosso paiz tem sido profundamente nefasta á nossa agricultura.

Os publicistas inglezes, com aquelle bom senso que os caracterisa, notam grandes defeitos na legislação franceza no que se refere á divisão da propriedade que se tem exagerado a ponto de prejudicar em extremo a agricultura. Pois a nossa moderna legislação n'este ponto é ainda mais correcta e augmentada do que a franceza, e tem feito já sentir ao paiz os seus effeitos prejudiciaes. Portugal tem uma superficie pequena, uns 9 milhões de hectares, mas apresenta factos economicos, curiosos e em extremo oppostos. Ao sul encontra-se a propriedade centralisada em poucas mãos, ao norte vê-se exactamente o contrario, e quando o retalhamento do solo chega ao exagero, a producção baixa até ao maior extremo, porque faltam os meios para fertilisar a terra. Em alguns conselhos do norte do nosso paiz chega a ser irrisorio o titulo de proprietario. (Apoiados.)

Estou lembrado que ha mezes, o sr. conde do Casal Ribeiro, num excellente, discurso aqui proferido, revelou um facto que mostra a falta de attenção com que certos assumptos graves são tratados pelos poderes publicos. Na freguezia de Moreira de Rei, concelho de Fafe, a propriedade tem soffrido um fraccionamento tão exagerado que ha proprietarios possuindo apenas uma leira com 80 centimetros de largura e 10 metros de comprimento! Ora, está bem claro que proprietarios nestas condições não são menos desgraçados do que qualquer misero pedinte!

Ao sul do paiz, na provincia do Alemtejo, observa-se exactamente o contrario a isto. A propriedade é muito grande e mal cuidada; não se divide, porque a lei oppõe-se á subemphytheuse - a grande moralisadora da propriedade, como lhe chamava Alexandre Herculano. São estes os grandes inconvenientes da nossa legislação, que por um lado exagera o retalhamento da propriedade e por outro obsta a que a grande propriedade possa ser fecundada pelo trabalho do pobre que tem como unico capital o seu braço e a sua enxada.

Na Inglaterra ha grandes propriedades; o movimento da opinião publica e os trabalhos de muitos economistas têem sido favoraveis a este systema de explorar o solo, porque, se a terra pertence aos land lords, estes não a exploram sempre pelo absenteismo, e entregam-na a rendeiros illustrados e poderosos que sabem cultivar em harmonia com os ultimos aperfeiçoamentos agronomicos, obtendo assim as maiores producções. Em Inglaterra os arrendamentos a longo praso são a principal causa do aperfeiçoamento da sua agricultura.

Entre nós não ha o que verdadeiramente se deve considerar arrendamento a longo praso, porque o fisco vem inutilisal-o com as suas garras extinguindo toda a riqueza nascente! Os nossos arrendamentos a longo praso são onerados com a contribuição de registo, e, portanto como é possivel que o rendeiro que dispõe de alguns meios vá plantar vinhas, olivaes, fazer drenagens, emfim que vá realisar todos os melhoramentos dispendiosos que só no fim de trinta ou quarenta annos é que estão pagos e amortisados? Assim, com esta legislação, pretende-se obstar á creação da riqueza e pune-se quem tem iniciativa e quer trabalhar! Os nossos legisladores têem sido a este respeito de uma myopia desgraçada, pretendendo arrecadar receitas para o thesouro, obstam a que ellas se criem, pois que difficultam que as superficies incultas e sem valor collectavel sejam transformadas em vergeis e terras araveis!

Assim, é impossivel no Alemtejo substituir pela alodialidade vantajosa a subemphyteuse, e sem um ou outro meio de beneficiar as grandes propriedades, continuam estas perdidas para a riqueza publica a constituir enormes charnecas!

Nas provincias do norte era necessario que uma lei especial promovesse e facilitasse a congregação de glebas, á similhança do que se tem feito em todos os paizes civilisados, em a França, na Austria, na Dinamarca, e até na pensadora Allemanha, onde se fazem reunir os retalhos da propriedade microscopica para a constituir depois em condições de poder ser explorada com maiores vantagens. N'este paiz para que se realisem estas congregações, basta ique sejam exigidas pela quarta parte dos proprietarios. A lei ahi foi mais longe, e, com o fim de conseguir que as boas propriedades de lavoura se não retalhem e depreciem com as partilhas entre herdeiros, permitte que se constitua a propriedade indivisa numa geração, regulando-se a integridade da herança por meio de tornas.

É opinião de muita gente illustrada que as vastas superficies incultas do sul do paiz só poderiam desapparecer por meio da colonisação. Eu estou perfeitamente de accordo em theoria, mas na pratica deveremos não esquecer que a colonisação exige grandes capitaes, e, nas circumstancias actuaes do paiz, seria talvez mais facil e exequivel que se permittisse a subemphyteuse.

São estas, a largos traços descriptas, as causas que prejudicam a constituição da propriedade, e que é preciso modificar. O restabelecimento dos prazos em vida de livre nomeação, seria um grande beneficio para as provincias do norte, principalmente para o Minho, que a elles deve a

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