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2 ANNAES DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

Se é para esse fim — e o Sr. Presidente do Conselho gesticula affirmativamente — nada tenho a objectar. Insurjo-me, porem, contra o facto de o deposito se ter realizado no Banco de Portugal, quando devia ter sido feito na Caixa Geral de Depositos, que é o estabelecimento official, destinado a operações d'essa natureza.

Do Sr. Presidente do Conselho e Ministro do Reino desejo igualmente saber quando se verifica a nova installação da luz electrica, para que não ha prazo marcado no programma do concurso. Todavia, as mais elementares conveniencias aconselham que a installação esteja ultimada ao inaugurar-se a nova epoca lyrica. Não só se attende, por essa forma, ás justas aspirações idos frequentadores do theatro, mas, sobretudo, se evitam gravissimos perigos e riscos previstos naturalmente, em virtude da inutilização absoluta do material empregado naquelle serviço.

Segundo o parecer de engenheiros, o qual deve existir no Ministerio das Obras Publicas, e a opinião do inspector dos incendios, da qual ha conhecimento no governo civil, a installação electrica actual ficou completam ente inutilizada no fim da ultima epoca.

Não a renovar, sem perda de tempo, importa um erro palmar, cujos resultados podem ser essencialmente funestos, se se der qualquer desastre na illuminação, como tudo deixa suppor.

Pergunto, pois, ao Sr. Presidente do Conselho,:

Está S: Exa. disposto a providenciar, por modo a que a nova installação comece a funccionar, no inicio da proximo epoca lyrica?

Se o Sr. Presidente do Conselho não proceder nesse sentido, assumirá grandes responsabilidades, pelas quaes terá de dar contas, se algum sinistro se der, motivado pela deficiencia e incapacidade manifesta do material do serviço da illuminação electrica.

Posto isto, mais uma vez protesto contra a censura theatral, exercida pelo chefe da policia administrativa, que cousa alguma tem que ver com tal assunto. Não permitte a legislação vigente a censura previa theatral; mas, quando a permittisse. poderia ella ser exercida pela ignara policia administrativa?

O decreto com força de lei de 29 de março de 1890, que regula o assunto, estatue:

Artigo 1.° São prohibidos os espectaculos publicos ou representações theatraes que contenham offensas ás instituições do Estado e seus representantes e agentes, provocações ao crime, criticas injuriosas ao sistema monarchico representativo, fundado na Carta Constitucional e seus Actos Addicionaes, caricaturas ou imitações pessoaes, referencias directas a quaesquer homens publicos ou pessoas particulares, ou offensas ao pudor ou á moral publica.

§ unico. A autoridade administrativa poderá prohibir a continuação do espectaculo logo na primeira representação, e em qualquer estado d'ella, ou a repetição d'elle.

Completando estas providencias, encontra-se no decreto de 20 de janeiro de 1898 o seguinte:

Artigo 29.° Fica competindo exclusivamente ao corpo de policia civil a policia dos theatros, espectaculos e reuniões publicas.

Confirmam-se, portanto, com o texto da lei as minhas asseverações.

As exorbitancias do chefe da policia administrativa não podem permittir-se. Só na constancia de um Governo ultra-reaccionario, como é aquelle a que preside o Sr. Ferreira do Amaral, se consentem ataques tão directos á livre emissão do pensamento.

Trilhando por tal caminho, tenha ao menos a coragem de criar a censura, exercida por entidades idoneas, como se praticava no regime absoluto legal.

Na minha opinião,, não é licito admitti-la sequer em hypotese, e muito menos que ella seja exercitada por qualquer salafrario policial, cuja ignavia não admitte duvidas. Mas não é esta a unica manifestação a que tenho de me referir, da ditadura policial existente.

A organização de cadastros constitue outra arbitrariedade, e esta, originaria da Bastilha, cujas violencias e torpezas não teem conta. Pelo abominavel decreto de 23 de abril de 1908, da paternidade do Sr. Presidente do Conselho e do Sr. Ministro da Fazenda, preceitua-se:

Artigo 1.° O inspector geral dos impostos, coadjuvado pelo pessoal da sua dependencia e pelo que requisitar das repartições policiaes de Lisboa, procederá immediatamente á organização do cadastro................

A policia, conforme se observa, é apenas o agente auxiliar do inspector geral dos impostos, para a realização do serviço cadastrense.

Pois é ella agora que se arvora em mandante e dirigente, vexando o pessoal dos jornaes de Lisboa, cujo arrolamento ella se permitte fazer no antro infecto da Parreirinha.

O cadastro policial é exclusivo dos criminosos.

Para cadastros de outra qualquer ordem, não tem idoneidade a Bastilha, a cujo desprezivel pessoal está vedado desempenhar serviços honestos.

E é por isso que ella, na questão da incommunicabilidade dos presos, por motivo mysterioso, illudiu o Sr. Ministro da Justiça, levando-o a fazer declarações que não correspondiam, á verdade dos factos. A incommunicabilidade d'esses presos só foi levantada no dia 20 e não em 17, como assevarou o Sr. Ministro da Justiça.

Demais, essa tortura inquisitorial prolongou-se por 20 dias para alguns dos martyrizados.

As revelações feitas pelos presos, nas entrevistas jornalisticas dos ultimos dias, patenteiam quanto convinha á Bastilha conservá-los naquelle estado de tortura. Todos elles, os detidos, confessam que ainda lhes não foi declarada a culpa, pela qual estão privados da liberdade. Um d'elles, segundo hoje noticia o Mundo, foi instado para casar catholicamente com a mulher de quem tem uma filha.

Será possivel que o juiz de instrucção criminal se impusesse por forma tão descaroavel á consciencia de um detido, que acabava de lhe declarar que desejava legalizar a sua união, mas pelo casamento civil?

É indispensavel que o Sr. Presidente do Conselho averigue o que occorre, e que facilite a legitimação, pela união, exarada no Codigo Civil, da criança, filha do detido a que me reporto.

Por muito que estejam dominando as imposições ultramontanas, não se pode permittir que um funccionario publico, como é o juiz de instrucção criminal, cultive o carolismo até ao extremo de desacatar as leis do reino, e simultaneamente abuse do cargo que exerce para opprimir os seus prisioneiros, no que mais respeitavel é na consciencia e foro intimo de cada um.

Tenha em mente o Sr. Presidente do Conselho que S. Exa. é o immediatamente responsavel por este e por todos os outros abusos, praticados na abjecta Bastilha.

Assim o estatue o scelerado decreto de 19 de setembro de 1902, no seu artigo 1.° — decreto que, conjugado com o de 23 de abril ultimo — o dos cadastros — colloca este país entre os que possuem legislação mais deprimente e exautorante.

O Sr. Presidente do Conselho não revogou o primeiro e criou o segundo. Passará indubitavel e tristemente á historia como um dos reaccionarios mais completos do seculo xx, como quem mais tem fustigado-a liberdade, quando ella é tão potente e generosa que illumina até os seus mais crueis detractores.

Para sentir é que o Sr. Presidente do Conselho não comprehenda o que ha de verdade nas minhas affirmações, e que persista em erros que nem sequer se desculpam, como o respeitante á demora na publicação da syndicancia derivante das sangrentas occorrencias eleitoraes de 5 de abril derradeiro.

Quando é que o Sr. Presidente do Conselho, harmonizando o seu procedimento pelas declarações do Sr. Ministro da Justiça, manda publicar a syndicancia ?

Extrahidos como já foram d'ella os