DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO 411
tuir o ministerio a cuja frente se achava o sr. duque d'Avila e de Bolama, que tão dignamente nos preside.
S. exas vieram cedo e talvez por isso saiam do poder mais cedo do que suppõem.
A falta de plano, a permanencia do systema de expedientes, são o mote mais dilecto, a epigraphe unica da bandeira da regeneração.
A bandeira da regeneração foi hoje desfraldada aqui com uma franqueza que, se honra o sr. ministro, não póde deixar de ser agradavel a nós todos.
O partido regenerador é o unico que tem realisado todos os grandes commettimentos!
Agradeçamos-lhe em nome da nossa divida sempre crescente e das difficuldades com que lutámos.
Ao menos o milagre não é grande, e não dá direito a s. exas a exigirem a sua canonisação decretada por nós. Os abysmos não se abrem, dizem s. exas, sr. presidente, porque os abysmos não existem. Falia se nos abysmos constantemente, roas as cousas caminham, e governo robustece-se.
É verdade, sr. presidente, mas quando o sr. Fontes nos fallava em um barril de pólvora, sobre o qual se havia de sustentar, viamo-lo nós cair meia duzia de dias depois diante de alguns penicheiros.
Esses abysmos não existem? A algibeira do contribuinte que o diga. Aonde se vão buscar as receitas para fazer face a estes constantes encargos, que crescem quotidianamente?
Ignoram porventura s. exas, que se apregoam os unicos mantenedores da ordem, que ha uma lei expressa que ordena que se não criem despezas sem se crear ao mesmo tempo a verba de receita donde ellas devem sair?
S. exas, que não são revolucionarios, que são os unicos sustentaculos da ordem, expulsaram do poder aquelle homem digno, honrado e venerando que preside aos trabalhos desta casa, porque estando no poder procurava extirpar os abusos e perseguir os culpados.
Curvaram-se diante de s. exa. para mais tarde o derribar do poder.
Honra ao sr. duque d'Avila, a quem fizeram sair do poder, por querer fazer respeitar as leis deste paiz; e fez-se tudo isto para manter a ordem e de certo para assegurar o credito das nossas finanças!
Diz-se, e é verdade, que o estado das nossas colonias carece da maior solicitude e attenção por parte do governo; e o que fazem s. exas, que por tantos annos teem estado á frente dos negocios publicos.
Trazem aqui este projecto, que não é definido, que nos não adianta em cousa nenhuma, e declaram que para o anno procurarão estudar um systema conveniente para a regeneração das nossas colonias!
Eu não regateio os dinheiros que se pedem para o ultramar, porque sou o primeiro a reconhecer a necessidade de melhorar e administrar convenientemente os nossos dominios de alem mar, mas para isso é necessario que se saiba o plano a que se obedece e o systema que se adopta.
O estar constantemente a pedir ao paiz encargos sobre encargos sem lhe crear as receitas correspondentes, é perigosissimo, e o viver de expedientes é deploravel.
Não se ludibria assim um paiz, e esses abysmos de que s. exas não têem medo foram previstos em França por muitos homens distinctos antes de 1789.
O governo fecha os olhos, cria as difficuldades, estas aggravam-se, e nós nem ao menos havemos de clamar, nem ao menos nos querem dar o direito de poder dizer ao paiz que attenda a este estado de cousas!
Porque o paiz tem, e deve ter sempre, as camaras que merece.
Se elle não conhece a sua força, se se deixa ludibriar,
se não sabe o que é a vida constitucional, queixe-se de si!
Os partidos que se reunam todos numa colligação verdadeiramente patriotica, para fazer conhecer aos homens, que se inculcam como os unicos que podem salvar o throno, a obrigação que teem de entrar no verdadeiro caminho da economia, que não é a mesquinharia, mas a boa ordem na administração das finanças.
Não é possivel deixar passar todos estes projectos, sem se perguntar quaes são as receitas que hão de fazer face as despezas que elles criam. Em que regimen vivemos? Estamos no governo absoluto ou no liberal? Fluctua nos ares a bandeira azul e encarnada, ou a bandeira azul e branca? A do absolutismo ou a da liberdade? O sr. ministro da marinha pede-nos agora 200:000$000 réis para comprar navios, amanhã pede-nos 800:000$000 réis para obras publicas, mas não nos diz quaes as fontes de onde ha de vir este dinheiro.
Se s. exa. guardasse estes pedidos para o anno, e os precedesse de um plano regenerador das nossas terras de alem mar, de bom grado lhe concederia estes pedidos, mas assim é impossivel.
Sr. presidente, eu não posso, repito, votar estes augmentos de despeza em tão larga escala, sem que venham acompanhados da receita precisa, sem que sejam dadas as explicações que pedi, e que a opinião publica reclama, porque não quero ver augmentar essa divida fluctuante, que tudo paga, e que, do mesmo modo que o déficit, nunca se vê extincta. (Apoiados.)
(O orador não reviu as notas do seu discurso.) O sr. Presidente: - Seguia-se agora, na ordem da inscripção o sr. conde de Cavalleiros, mas como s. exa. não está na sala, vou dar a palavra ao sr. Vaz Preto.
O sr. Vaz Preto: - O sr. conde de Cavalleiros acaba de entrar na sala.
O sr. Presidente: - Então tem a palavra o sr. conde de Cavalleiros.
O sr. Conde de Cavalleiros: - Peço desculpa desta pequena demora, mas tive de sair da sala por me sentir incommodado de saude.
Sr. presidente, parece-me que o projecto mais simples, mais natural, mais necessario, que tem vindo a esta camara, é o que o nobre ministro da marinha acabou de defender.
O sr. Visconde de Soares Franco: - Apoiado. O Orador: - Não ha duvida que se trata de um projecto, que todos os homens amigos da prosperidade das nossas colonias encaram com sympathia, mas. dir-se-ha porque é que se guerreia?
Guerreia-se, pelo estado nervoso em que todos estamos, estado nervoso filho de um excesso de trabalho com que já não podemos, uns pela idade, outros pelos achaques e outros pela indolencia, que é o caracteristico nacional.
Sr. presidente, esta táctica de dar sessões á noite é velha, e o fim é cansar a opposição, e o governo conseguir que passem todas as leis, sem haver tempo, nem sequer para as examinar.
O sr. Vaz Preto: - Apoiado.
O Orador: - Eu já esperava que o meu nobre amigo, o sr. Vaz Preto, me apoiasse; estava bem certo disso.
Mas, sr. presidente, é uma infinidade de projectos que ninguem se entende.
Hoje mettem-me na algibeira o codigo administrativo, na outra algibeira o projecto de instrucção publica, na outra o do caminho de ferro; amanhã repete-se a mesma scena com outros projectos novos, de modo que são projectos de toda a parte, e tantos elles são que nem tempo ha de os ler, e para menos tempo termos ainda nos dão sessões a toda a hora, de dia e de noite!
Mas o povo fica sabendo que os projectos são approvados pela força, pelo excesso de cansaço a que nos levam muito de proposito, sr. presidente, para nada podermos fazer, e as questões passarem sem que ninguem possa occupar-se dellas.