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Sessão de 19 de Maio de 1924 5

O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — Sr. Presidente: desejo chamar a atenção do Govêrno para o jôgo de azar. É a centésima vez que êste importante assunto é tratado no Parlamento; mas parece-me que tem sempre toda a oportunidade, dada a ineficácia das medidas tomadas paio Govêrno e pela polícia, para reprimir o jôgo de azar.

Ninguém ignora que de novo se joga descaradamente em Lisboa e continuam constantemente a abrir novas casas de tavolagem em todos os cantos da cidade, mesmo muito próximo de esquadras da polícia e até do governo civil, junto do qual existe, há muitos anos um clube luxuoso, que vive do jôgo.

Li há tempos nos jornais que o chefe do Gabinete do Sr. Ministro do Interior tinha mandado uma circular aos governos civis, para que providenciassem no sentido de o jôgo ser reprimido. Não sei se na província essas circulares produziram algum efeito.

Como V. Exa. sabe, não é, por emquanto, a época do ano em que se torna mais indispensável a repressão do jôgo na província.

Do que estou inteiramente convencido é de que, no Pôrto e em Lisboa, essa circular não produziu qualquer efeito, visto que se continua a jogar às escâncaras.

Os clubes luxuosos continuam a realizar festas ostentosas que só podem ser custeadas pelo jôgo.

Isto não pode continuar.

Os crimes que têm origem no vício do jOgo são constantes, e são cada vez mais freqüentes os suicídios.

Para que V. Exa. veja até que ponto pode levar e jôgo, basta apontar o caso sucedido em Espanha. O crime do expresso da Andaluzia teve origem no vício do jôgo.

O Sr. Ministro do Interior, apesar das promessas feitas, nenhumas providências tomou no sentido do ser reprimido o jôgo de azar.

Continua-se jogando com a manifesta complacência das autoridades.

Não há muito tempo, o Sr. Sá Cardoso declarou perante o Parlamento que se não dispunha de meios suficientes para reprimir o jôgo. Quando um Ministro do Interior declara a sua impotência para reprimir um crime, evidentemente não po-

demos esperar que, na sua gerência, as autoridades o queiram reprimir.

E é preciso que o Govêrno se disponha a acabar com o escandaloso hábito do o Govêrno Civil de Lisboa receber quaisquer subsídios das casas de jôgo, seja qual fôr o fim para que se destinem.

Ainda no carnaval os jornais noticiaram que as casas de jôgo tinham contribuído com determinadas quantias para os cofres do Govêrno Civil.

É preciso que esta prática imoral e escandalosa termine de vez. E preciso que a polícia procure por outros meios obter os recursos necessários para o seu cofre de assistência.

Entra o Sr. Ministro do Interior.

O Orador: — É preciso que o Sr. Ministro do Interior se disponha a cumprir o seu dever pondo, de vez, termo a esta situação mandando fechar definitivamente as tavolagens, não só as ricas, mas também as pobres.

Ninguém ignora que nas vielas mais escusas da cidade existem tavolagens, onde os operários consomem os seus salários.

Confio no major Sr. Ferreira do Amaral, a quem presto homenagem, e, por isso, acredito que não é baldadamente que apresento êste novo protesto contra o que se está passando com o jôgo e com a imoralidade que infamemente campeia.

É preciso que as autoridades da República se resolvam a cumprir o seu dever, em proveito da ordem e tranqüilidade publicas, e reprimindo os abusos e imoralidades.

Cuidem menos de política e mais das suas obrigações.

Como exemplo daquilo com que certas autoridades se preocupam e em que dispendem a sua actividade, vou contar-lhes um episódio curioso, ocorrido há dias e de que foi protagonista uma dessas autoridades: um regedor de freguesia.

Um indivíduo tinha à janela do seu quarto um papagaio, ave de estimação, que, palrador como todos os papagaios, por amor ao passado ou para arreliar os republicanos vizinhos, se entretinha exclamando repetidamente:

— Papagaio real! Quem passa? E o rei que vai para à caça. Viva o rei espanhol!...

Risos.