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6 Diário da Câmara dos Deputados

Qualquer expediente de intervenção na venda forçada das existências na lavoura e no comércio seria desastrosa, pois em poucos meses se esgotaria o que há, com embaraços fortes na aquisição e no comércio de que viria a faltar.

O Govêrno respeita a propriedade, e não recorrerá nem a artifícios nem a violências, pois sabe por lições seculares que tais processos são contraproducentes.

O Govêrno encontra-se, de facto, cada vez mais perante aquela situação da "casa em que não há pão ... ".

O Govêrno não podo dar os géneros cada vez mais baratos, porque não os tem.

Já disse o bastante para definir a atitude do Govêrno perante a propriedade particular e a carestia da vida.

Esta só pode ser resolvida por uma produção muito maior e muito mais rendosa. Isto importa uma correcção do actual ambiento de gastos desmarcados e da tendência ancestral de esperar as cousas vindas do céu. É necessário trabalhar muito mais; mas isto ninguém o quere.

Aproveito o ensejo para enviar para a Mesa uma proposta de lei que tem por fim ao mesmo tempo aumentar a nossa produção agrícola e industrial, e promover a melhor harmonia e a maior valorização da nossa gente.

Pretende uma reforma agrária, o empreendimento de obras de rega, e o aperfeiçoamento da nossa agricultura pelo melhoramento da organização da casa agrícola e dos processos de cultivo.

A questão agrária vem do comêço da vida nacional, pelo menos em metade do País.

As terras de além Tejo foram divididas, logo depois das lutas sarracenas, em grandes domínios, pelas ordens militares, pela igreja e pelos nobres. Todas estas entidades, mais os concelhos e os reis, promoveram a povoação, que se fez principalmente nas imediações das vilas e cidades, pois o descampado alentejano estava quási todo ermo e bravio, por causa de séculos de correrias e "alancear mouros" até D. Afonso III.

O comercialismo, as descobertas e as conquistas perturbaram e até sustaram a marcha do povoamento do Sul; pode-se dizer que desde D. João I até o ouro do
Brasil se não fundaram mais aldeias no Alentejo.

Assim, mercê da nossa evolução histórica e da ingratidão agro-climática, encontra-se hoje o País no seguinte contraste demográfico: o Noroeste com mais de duzentos habitantes por quilómetro quadrado (o distrito do Pôrto com mais de trezentos) e todo o Alentejo com menos de quarenta.

A nossa densidade média da população é um absurdo aritmético. Por outro lado, mantemos uma enorme emigração, de cêrca ou mais de cinqüenta mil pessoas por ano, emquanto está quási tudo por fazer em Portugal para o aproveitamento dos nossos recursos naturais.

As imposições legais para maior e melhor cultivo da terra, que tam claras e violentas ficaram expressas na lei das sesmarias de D. Fernando, não deram resultado suficiente.

As riquezas orientais, o ouro e as pedrarias do Brasil libertaram-nos, por sé- culos, de cultivar as nossas terras, porque o estrangeiro fornecia-nos tudo em troca daqueles valores.

Depois os bens nacionais, nas guerras dos empregos públicos, os empréstimos do estrangeiro e por fim a emigração permitiram que nunca fôsse imposta a Portugal a necessidade do cultivo regular do nosso vastíssimo quadro geográfico e o aproveitamento dos seus recursos naturais, porque nunca nos faltavam assim elementos para o nosso equilíbrio económico e financeiro.

Mudaram, no emtanto, as circunstâncias: a fonte dos empréstimos está a esgotar-
-se; a colocação lucrativa dos nossos emigrantes na França e nas Américas está incerta; e por seu turno é premente como nunca a necessidade de produzirmos suficiência de trigo, de milha, de carne, de legumes e das restantes substâncias alimentícias, assim como das matérias primas fundamentais oriundas do solo.

A legislação de Mousinho da Silveira, acabando com os privilégios antigos, no terremoto legislativo de Abril a Agosto de 1832, não promoveu nem outro arranjo agrário, com estímulo forte à propriedade mediana e à fundação de muitas aldeias na terra de feitio alentejano, nem melhor cultivo.