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4 Diário das Sessões do Senado

analisados jurisconsultos, mas não estou era dia com os progressos da sciência, do Direito, que é evolutiva, como todas as sciências, e por isso a minha interferência no estudo e elaboração das leis será descabida, estéril e inútil, nisí atile quod facinus, stulta est gloria — o que quere dizer que é rematada loucura vaugloriar-se alguém com o seu trabalho de que não resulte alguma utilidade pública ou particular.

Sinto-me envelhecer, quebrantado do corpo e do espírito, na terceira, e última fase do enigma da esfinge, e faltam-me por isso a energia o actividade necessárias para empresas do grande fôlego, para cavalarias altas, como vulgarmente se diz. E depois sou uma figura apagada no nosso meio social e não tenho cotação alguma no mercado político, como homem de pouca roupa e nenhuns européis. Apesar disso, eu detestava cordialmente a política do pretérito, na acepção viciosa e abjecta em que êste vocábulo se costumava empregar, como sendo ima escola de depravação, um enxurro pestilento de cavilações, de enredos, de embustes e de arranjos com que se locupletaram os pássaros finos, à custa do património da Fazenda Nacional, com preterição e em detrimento daqueles que mais valiam pelos seus serviços, talentos o virtudes.

Queiram permitir-me uma breve digressão. A propósito de pássaros finos, acode-me à memória uma reminiscência interessante da história de Herodoto. Êste historiador grego da Ásia Menor empreendeu e levou e, feito longas e dispendiosas viagens de estudo para se instruir nas instituições, leis, costumes, sciências, letras, artes e monumentos dos povos, a fim de escrever a sua história. Viajou pela Grécia, Macedónia, Pérsia, Egito e Libia até as colunas de Hércules e escreveu as histórias da Grécia, da Pérsia, especialmente no tocante às guerras médicas, e do Egito. No país de Mizraim não se limitou êle a contemplar a majestade assombrosa das pirâmides, astronónicamente orientadas e a inquirir o hieroglífico da esfinge, que lhe parecia sondar atentamente os mistérios do deserto.

Foi mais longe e estudou tudo quanto viu, não lhe escapando os hábitos dos animais. Pois diz êle em uma, passagem da história do Egipto que, quando os crocodilos repousavam plácidamente nas margens do Nilo, com o dorso exposto ao ardor dos raios solares e as fauces escancaradas, se lhes metiam pelas guelas nus pequenos pássaros (talvez as tarâmbolas, que abundavam naquele país), os quais faziam a uma limpeza geral, dando caça aos vermes que estavam aderentes às mucosas e que bastante atormentavam os ferozes amfíbios. Entravam e saíam com toda a liberdade e sem cerimónia, não sendo colhidos nos seus movimentos nem molestados de qualquer maneira pelos donos da casa. Amor com amor se paga. Assim tambêm, no nosso turbilhão pseudo político os pássaros finos, os politicantes de profissão metem-se pelos olhos e pelos ouvidos dos grandes crocodilos, dos vorazes saurianos da política, que os tratavam com todas as complacências, deferindo a todas as suas pretensões, por mais injustas, ilegais e escandalosas que fossem. Isto é a verdade que é necessário dizer-se e repetir-se, para escarmento daqueles que prevaricaram.

Pelas matérias expostas e outras que me cumpre emitir para não ser prolixo, pensei em renunciar ao mandato que, sem solicitação minha nem consulta prévia de quem quer quem fôsse, me foi conferido pelos eleitores meus comprovincianos, que só tiveram em Avista nobilitar-me com a sua confiança e enaltecer-me no conceito público; mas, reflectindo depois com mais ponderação, desisti do meu intento para não ser desagradável a êsses eleitores, para não ofender o seu melindre, para não os maguar com um procedimento talvez monos correcto, atirando-lhes com os pratos à cara, como fazem os hóspedes desassizados ao anfitrião que os convidou para o banquete.

Alêm disso, eu e todos nós tínhamos uma grande divida de reconhecimento a saldar com o Chefe do Estado, que por seu feito patriótico e brilhante, eripuit sceptrum tyranno, libertando-nos duma escravidão afrontosa e ignóbil e de milésimas cousas urgicas, a que Dias Ferreira, eminente jurisconsulto o notável homem de Estado, com seu estilo humorístico e por vezes jocoso e cáustico, chamava intelequias e a que eu chamarei... não digo para não inquinar a palavra com a expressão de cousas sórdidas, tanto mais