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REPÚBLICA PORTUGUESA

ACTAS DA CÂMARA CORPORATIVA

N.º 44 VI LEGISLATURA 1955 2 DE ABRIL

Projecto de decreto n.º 508

1. Origens e actualidade do instituto da propriedade horizontal. - A figura ria chamada propriedade horizontal ou propriedade por andares, que o presente diploma se propõe regular, parece ser desde há muito conhecida nas nossas leis patriais. Já no título LXVIII do livro I das Ordenações Filipinas se dispunha assim: a Se uma casa for de dois senhores, de maneira que de um deles seja o sótão, e de outro o sobrado, não poderá aquele, cujo for o sobrado, fazer janela sobre o portal daquele cujo for o sótão, ou lógea, nem outro edifício algum».
Mais tarde, também o Código Civil (artigo 2335.º) faz meação da possibilidade de os diversos andares de um mesmo edifício pertencerem a proprietários diferentes e define, embora em termos muito elementares e deficientes, as obrigações que, na falta de título, competem a cada um deles na reparação dos tectos, das paredes e das escadas do prédio.
Apesar disso, o instituto não conseguiu passar até agora do limbo das meras previsões legais para o campo das realidades práticas, sinal evidente de não corresponder, no pretérito, a nenhuma necessidade económico-social premente. Mas corresponde, sem dúvida, a uma necessidade dos tempos modernos, como de algum modo o atestam, não só a larga divulgação do sistema num grande número de países estrangeiros, mas também as reiteradas solicitações que entre nós têm sido feitas ao Governo no sentido de ser dada execução ao disposto no artigo 30.º da Lei n.º 2030, de 22 de Junho de 1948.
Este preceito atribuiu ao Governo, como é sabido, o encargo de «proceder à revisão e regulamentação do artigo 2335.º do Código Civil, estabelecendo o regime da propriedade por andares ou propriedade horizontal».
Vários factores -uns, de natureza puramente técnica, outros de índole económico-social- contribuíram para a consagração,- nos sistemas jurídicos contemporâneos, de uma figura que, pelo menos entre nós, se diria condenada n não sair da letra morta dos textos legislativos.
De um lado está a necessidade que quase todos os estados modernos sentiram, em maior ou menor grau, de restringir de alguma forma o alargamento progressivo da área das grandes urbes, com o fim de facilitar a resolução do problema dos transportes colectivos -cujas dificuldades crescem naturalmente à medida que aumenta a distância do centro às zonas periféricas da cidade- e de impedir que a construção urbana fossem desnecessariamente sacrificados terrenos cuja utilização pode vir a fazer imensa falta à agricultura num futuro mais ou menos próximo. E o único processo viável de alcançar semelhante objectivo,, perante o aumento constante das populações e n intensidade crescente do urbanismo, consistiu na substituição do sistema tradicional das moradias independentes, mais a carácter com a pureza de costumes e a tranquilidade da nossa vida doméstica, pelo sistema dos blocos residenciais, mais adequado por sua vez às exigências da vida moderna nos grandes centros populacionais. A construção passou assim a desenvolver-se mais em altura, à custa do espaço aéreo, do que em superfície, à custa do solo.
Os progressos da técnica de construção, estimulados pelas necessidades da época, contribuíram por seu turno para desenvolver e consolidar o novo sistema.
Do outro lado está o desejo compreensível, manifestado a breve trecho por uma grande parte da população, de ver legalmente facultada a possibilidade de aquisição do domínio sobre cada uma das diversas fracções autónomas em que os grandes edifícios podem funcionalmente ser divididos, dada a impossibilidade económica que para a generalidade passou a representar a aquisição da propriedade sobre todo o prédio.
As empresas construtoras e os próprios proprietários dos grandes blocos residenciais têm patrocinado lá fora essa natural aspiração das classes menos abastadas, não só porque o novo regime promete um notável incre-