972 ACTAS DA CÂMARA CORPORATIVA N.º 97
tranquilidade e simplicidade o ambiente de confiança inteira em que toda a viagem decorreu.
É reconfortante verificar como, no meio de tantos ódios de raça, de tantas perturbações da vida internacional neles fundadas, de tanta acção subversiva da civilização que é a glória do Ocidente a toma-los como ocasião ou pretexto, tal demonstração da. unidade portuguesa é possivel. Eu creio que na acta desta sessão não podiam deixar de ficar ao menos estas simples palavras a exprimir ao Chefe do Estado o agradecimento da Câmara por mais este serviço prestado à Nação.
Vozes: — Muito bem!
O Sr. Presidente: —Em 14 de Dezembro de 1950 foi Portugal admitido na Organização das Nações Unidas. Merece o facto ser registado, não porque da nossa entrada naquela Organização dependesse, em qualquer medida, a posição ou o prestigio internacional do Pais, mas porque, aceitando Portugal pdr a sua candidatura em testemunho de um espírito de colaboração com os outros povos que sempre tem demonstrado, o empenho com que a grande maioria dos participantes enfrentou a obstinada oposição russa mostra bem o apreço em que aquela colaboração é tida. Poderá, porém, a O. Ni U. encontrar-se um dia em condições —que infelizmente não parecem por enquanto realizadas — de assegurar eficazmente a paz e a colaboração entre todos os povos e de por todos se fazer ouvir, em uniformidade de doutrina, na sua acção pacificadora?
Foi o nosso pais visitado em Janeiro deste ano pelo ilustre Presidente da República dos Estados Unidos -do Brasil, Dr. Kubitschek de Oliveira.
Curta foi a visita para o sentimento dos Portugueses, de coração sempre tão pronto a vibrar com tudo o que representa o Brasil ou lhe diz respeito. Mas foi suficiente, no entanto, para que esses sentimentos mais uma vez se manifestassem com sincero calor, mostrando que os laços de amizade que unem os dois povos não são um mero episódio político, mas uma profunda e duradoura realidade histórica—a solidariedade do mundo criado pelos Portugueses!
Anunciou-se há pouco que em breve terá Portugal a visita de Sua Majestade a Rainha Isabel de Inglaterra.
Desde as visitas do rei Eduardo Yn, em 1903, e da rainha Alexandra, em 1905, é a primeira vez que um soberano britânico visita Portugal. E vem, graças a Deus, visitar um Portugal renovado no sen espirito, nas suas realizações materiais, nas suas tradições políticas, no seu restaurado prestigio internacional.
Tratados de aliança, tradições de amizade entre os ' dois povos, numerosas famílias inglesas há gerações vivendo em Portugal, tão integradas no nosso meio que quase as consideramos como nossas, prestígio da Coroa inglesa e da jovem mas tão amada soberana que a ostenta, a importância das relações comerciais e das vizinhanças no ultramar, tudo concorre para que a noticia da visita de Sua Majestade Britânica —retribuição pronta e significativa da que o nosso Chefe do Estado há pouco mais de um ano fez à Inglaterra— tenha sido recebida pelo povo português com um júbilo a que esta Camará certamente se associa.
No aspecto interno, manteve-se a serenidade, a calma e a confiança, nas quais os governos de Salazar vem trabalhando para resolver os problemas do Pafs. Realizadas condições fundamentais, que não há muito alguns consideravam impossíveis por determinismo da raça ou por fatalidade da evolução histórica, novos problemas e necessidades surgem ao mesmo passo —senão em ritmo maior— do que os progressos feitos. Não deixava a acuidade-dos problemas mais graves. enxergar
a existência de outros que, à medida que àqueles se encontra solução, vão tomando relevo.
Não é isso um mal, antes uma comprovação do progresso realizado. E, quando o País toma consciência das suas possibilidades, ganha confiança, perante a evidência do caminho andado, na sua própria capacidade de realização tanto nos campos técnico e económico como no político e social, mais aspirações se esboçam, mais progressos se reclamam, novas reivindicações se formulam, que são saudável expressão de um novo espírito e força motora para novas realizações.
Próximo já o termo do prazo a que se refere o Plano de Fomento aprovado pela Lei n.º 2058, cuja execução parece nesta altura poder considerar-se assegurada, novos projectos se preparam, naturalmente mais largos e de projecção ainda maior na vida económica do Pafs. Naturalmente, o ritmo do desenvolvimento económico tende a acelerar-se, mas, para que não cause tensões excessivas que interrompam o seu ritmo, deve ser convenientemente ordenado, através de planos de âmbito cada vez mais largo.
Certamente esses planos1 terão base realista, o que não exclui ousadia nas concepções, por forma a evitar que puros conceitos teóricos não tendam a sobrepor-se a realidades concretas.
Esta Camará será naturalmente chamada a dar o seu parecer sobre este novo plano e não deixará de dedicar-lhe o maior esforço e atenção.
Dignos Procuradores: são de inquietação e incerteza redobradas os dias que o Mundo está vivendo.
Não pode Portugal furtar-se às consequências e repercussões de conflitos abertos ou latentes que afectam seriamente a economia de alguns países, interrompem vias de comunicação de decisiva importância para o tráfego internacional e trazem largos.desvios às correntes normais do comércio.
Não pode, por outro lado, manter-se alheio às exigências de uma cooperação tendente a defender o património comum, material e espiritual, da civilização do Ocidente, numa era em que a técnica, que tantas possibilidades novas, abre ao bem-estar dos povos, proporciona ao espírito de guerra e destruição, que parece impossível extirpar da humanidade, meios de força e alcance insuspeitados poucos anos atrás.
Não pode ainda Portugal manter-se indiferente aos barbarismos a que ò mais implacável e inumano dos imperialismos de todos os tempos —infelizmente ainda aceite, por inexplicáveis preconceitos, lamentáveis compromissos ou inconfessáveis fraquezas, como obedecendo àquele mínimo de princípios humanos e morais que deve exigir-se nas relações entre os povos—, a que o mais implacável e inumano dos imperialismos, dizia, recorre para dominar heróicos e nobres arrancos de nações escravizadas na reconquista das perdidas liberdades e autonomia.
Se se esperava ainda prova irrefutável de que as na-çOes t@m uma alma própria, uma individualidade que, sem excluir a cooperação, não pode ser aniquilada enquanto viverem os homens que as formam; se não estava ainda demonstrado que o sentimento nacional há-de ser sempre mais forte —nas verdadeiras nações— do que filosofias políticas, sentimentos de classe ou concepções ideológicas que as ignorem, essa prova está sendo dada nestes dias pela martirizada Hungria. Creio que não é sem um sentimento de vergonha que a consciência ocidental assiste, impotente e pávida, à criminosa repressão que, com inteiro desprezo dos mais elementares princípios da moral e do direito, se está exercendo sobre um povo que deu o mais nobre exemplo de intransigência perante a tirania a que o submetem.
Vozes: — Muito bem!