1294 ACTAS DA CÂMARA CORPORATIVA N.º 128
tura territorial das Casas do Povo e a afinidade estreita das actividades agrícolas. A criação de um organismo central coordenador e, mais recentemente, a possibilidade da constituição de federações distritais, permitem corrigir muitas das dificuldades que, neste aspecto, se suscitaram na organização de previdência do comércio e da indústria. Falta, todavia, estabelecer a necessária coordenação entra a agricultura e aqueles sectores, num plano orgânico e solidário de segurança social - embora sem prejuízo dás necessidades e limites próprios da sociedade rural.
Na organização de previdência da pesca não se levantam problemas de unificação administrativa, e até os de eventual coordenação com os mais sectores apresentam aqui aspectos diferentes, dado o carácter muito peculiar das actividades e meios piscatórios.
§ 3.º
Os sectores da saúde e assistência
87. O Estatuto da Assistência Social (Lei n.º 1998, de 15 de Maio de 1944) consagra o princípio de que "as actividades de assistência serão exercidas em coordenação com as de previdência, por forma a favorecer o desenvolvimento desta ..." (base VI, norma 2.ª).
Daqui resulta que a organização de assistência desempenha, em relação à de seguro social obrigatório, uma função complementar - visando a proteger camadas sociais não abrangidas pelo seguro ou a cobrir eventualidades e encargos que excedam os esquemas da previdência obrigatória.
A outra regra fundamental nesta matéria é a de que, embora o Estado tome, em princípio, a iniciativa no desenvolvimento da política assistencial, á sua função na prestação da assistência é normalmente supletiva das iniciativas particulares (Estatuto, base III).
O mesmo preceito admite, no entanto, que em determinados sectores a posição do Estado seja dominante, quer por se tratar de serviços que necessariamente lhe pertencem - é o caso da defesa da saúde pública, por força de disposição constitucional -, quer pela complexidade, e superior interesse público de. outros serviços, como por exemplo os da organização hospitalar de base (Lei n.º 2011, de 2 de Abril de 1946).
A actividade sanitária destina-se a assegurar os serviços de salubridade e higiene geral, e, bem assim, a organizar a profilaxia e a luta contra as doenças sociais mais generalizadas - v. g., a tuberculose, o sezonismo, o cancro, as doenças infecciosas, as doenças e anomalias mentais (Estatuto, bases III e VII).
A organização hospitalar visa as actividades curativas e reabilitadoras da doença, especialmente sob a forma de internamento e concentração de meios terapêuticos. A complexidade, extensão e custo de uma estrutura hospitalar de base, estendida a todo o País, aconselhou a cometer ao Estado, na maior parte, a iniciativa e a manutenção de uma organização dessa natureza (Lei n.º 2011, base XIX).
Para além destes objectivos de interesse geral, vigora o princípio, acima expresso, da intervenção supletiva do. Estado e das autarquias na protecção contra os riscos sociais, por intermédio de actividades de natureza assistencial,
88. No que respeita ao campo de aplicação, o sector da defesa sanitária e o da acção hospitalar do Estado têm a natureza de serviços oficiais e, como tal, dirigem-se à generalidade dos indivíduos, independentemente da sua condição económica ou social. A obrigação de pagar, no todo ou em parte, o custo da
assistência prestada não retira aos serviços aquela natureza.
A actividade assistencial stricto sensu também, em princípio, não visa grupos sociais determinados, ao contrário do que sucede no seguro. A necessidade de provar a carência do auxílio solicitado, que ë própria daquela actividade, nada tem a ver com o campo de aplicação da assistência, mas sim com os requisitos de outorga das respectivas prestações.
Aqui, pois, tem aplicação legal o princípio da universalidade, o que não quer dizer que tenha aplicação efectiva.
Na realidade, quanto aos serviços de sanidade geral, é ainda sensível a carência de meios de acção (em pessoal e material) com que lutam, designadamente os que dependem da Direcção-Geral de Saúde, não obstante as respectivas dotações orçamentais terem vindo a ser reforçadas de ano para ano. Em 1958 gastaram-se 39 126 contos 110. O orçamento para 1961 inscreve 49 521 contos.
Relativamente à rede hospitalar do Estado, também são conhecidos os limites que impedem, na prática, a utilização desses serviços pelo comum da população do País.
O número de camas dos hospitais civis existentes em 31 de Dezembro de 1959 era de 20 879, o que corresponde a cerca de 23 camas por 10 000 habitantes. Se se considerar a totalidade de camas no conjunto dos estabelecimentos de saúde do País, nesse ano - 47 108 -, aquela média sobe para 52, quando já em 1951 a Itália dispunha de 80, a França de 112 e a Inglaterra de 117 111.
Com respeito aos médicos, basta referir o número dos que se encontram ocupados em estabelecimentos oficiais - 1586 - para imediatamente se avaliar a extrema carência dos serviços 112. Claro que o número total de médicos no País é bastante superior. Mas a sua distribuição apresenta-se irregularíssima - 67 por cento estão concentrados nos distritos de Lisboa, Porto e Coimbra, onde a média é de 1 clínico para 660 habitantes, ao passo que no resto do País há 1 médico para 2800 pessoas. As condições actuais da medicina hospitalar não estimulam, antes contrariam, a modificação desse estado de coisas. Além disso, fora dos grandes centros, verifica-se sobretudo carência de médicos especializados, embora também de clínicos gerais, e aqueles faltam igualmente nas principais cidades 113.
Pelo que toca à enfermagem, a míngua de pessoal é, porventura, ainda mais flagrante. A média geral cifra-se em uma unidade por 1600 habitantes, registando-se concentração paralela à dos médicos nos três distritos mencionados.
89. No capítulo das eventualidades a que ocorre o conjunto dos sectores da saúde e assistência, pode dizer-se que estes abarcam, em princípio, a protecção contra a generalidade dos riscos sociais, sem a predeterminação típica que caracteriza o seguro.
Como diz o Estatuto, "a assistência social propõe-se valer aos males e deficiências dos indivíduos, sobretudo pela melhoria das condições morais, económicas ou sanitárias dos seus agrupamentos naturais" (base I).
no Assembleia Nacional, Parecer sobre as Contas Gerais do Estado, 1958, vol. i, p. 275.
110 Assembleia Nacional, Parecer sobre as Contas Gerais do Estado, 1958, vol. I., p. 275.
111 Anuário Estatístico de 1959, pp. 51 e 53; Dr. Miller Guerra "A Política da Saúde", Boletim da Assistência Social, ano 16.º, Julho a Dezembro de 1958, p. 335.
112 Dados fornecidos pela Direcção-Geral da Assistência, em relação a 1957.
113 Dr. Miller Guerra, artigo citado, pp. 305 e seguintes.