1472 ACTAS DA CÂMARA CORPORATIVA N.º 133
prevenir abusos por parte dos utentes, inevitáveis na hipótese de prestações gratuitas.
Estas últimas apenas serão de outorgar em casos de comprovada indigência ou pobreza, salvo no que respeita à medicina preventiva, como adiante se dirá. Nos mais casos deverá efectuar-se o pagamento do custo efectivo do serviço, total ou parcial, conforme as condições económicas de cada interessado.
Admite-se, porém, que ao utente se substitua, legal ou contratualmente; outra entidade no pagamento dos referidos serviços. É o caso, por exemplo, das instituições de previdência obrigatória com respeito aos seus beneficiários.
142. Para fazer face aos encargos que resultem para as câmaras municipais do facto de ficarem obrigadas ao pagamento da quota-parte que lhes caiba na despesa com a assistência de que beneficiem os pobres e indigentes com o domicílio de socorro nos respectivos concelhos, a proposta aponta as receitas próprias e, em segundo lugar, o produto de derramas.
Ainda que nada haja a objectar em princípio quanto ao pagamento dos encargos pelas receitas próprias, o mesmo não sucede em relação às derramas.
É que na nossa técnica tributária as derramas são formas de obter receita extraordinária, pelo que o seu produto não deve ser afecto ao pagamento de despesas ordinárias. Ora, não há dúvida de quê as despesas com a saúde e a assistência constituem encargos normais, e não eventuais ou excepcionais. Há, pois, que achar para eles fundos de natureza correspondente.
As câmaras municipais afirmam não dispor de receitas suficientes para ocorrer às obrigações que o Código Administrativo e outras leis lhes impõem. As suas dívidas para com os hospitais, cujo pagamento se arrasta por longos anos, comprovam a afirmação.
No entanto, verifica-se que dos 273 concelhos do continente apenas 164 solicitaram o lançamento de derramas no ano de 1959, variando a percentagem destas sobre as contribuições directas cobradas entre o mínimo de 2,5 e o máximo de 14.
O produto das derramas no referido ano foi de cerca de 24 000 contos e variou entre um mínimo de 250 contos e um máximo de 2594 contos, respectivamente nos distritos de Aveiro e de Santarém.
Tendo em conta esta situação, parece que a solução definitiva não reside na autorização para lançar derramas, processo excepcional, anual e contingente, mas em equacionar um processo normal de realização de receitas com esse fim, a qual não pode deixar de revestir a natureza de imposto.
Esse processo consistiria em lançar sobre os impostos arrecadados para o Estado um adicional destinado a ocorrer aos encargos municipais com a assistência aos pobres e indigentes.
Não se ignora que esse adicional, pela afectação do seu produto, ofende um dos princípios clássicos dos impostos - o da sua universalidade - e contraria a orientação seguida na política financeira, que constitui extraordinário activo do Regime.
Assim, a Câmara Corporativa, tendo algumas dúvidas quanto à solução que mais convém, limita-se a sugerir a criação do adicional que permita equilibrar os orçamentos municipais nesta matéria.
Ao Governo, se a sugestão for aceite, cabe indicar os impostos sobre que recairá o adicional e, uma vez votado este pela Assembleia Nacional, tomar as medidas necessárias para que o seu produto seja exclusimente afectado à satisfação dos referidos encargos.
Tendo em atenção a necessidade de melhorar o nível das regiões mais atrasadas e mais pobres, o produto do adicional referido seria afectado a um fundo especial, que podia designar-se por «Fundo Nacional de Assistência».
As suas receitas seriam gastas obrigatoriamente no concelho em que fossem cobradas, na percentagem de 75 por cento, e os 25 por cento restantes constituiriam um fundo comum a distribuir, tendo em atenção o grau de necessidades de cada região.
Na Inglaterra, a par dos subsídios para fins especiais, existe um subsídio geral que é concedido às colectividades locais em cujas circunscrições se verifique que o rendimento colectável por habitante é inferior à média do mesmo rendimento no país, subsídio este que se destina a reduzir a desigualdade dos seus recursos (Roger Garreau, Le Local Governement en Grande-Bretagne, p. 144).
143. O Fundo de Socorro Social foi instituído pelo Decreto-Lei n.º 35.427, de 31 de Dezembro de 1945, «com o fim de auxiliar os indivíduos em casos de calamidade ou sinistro, ou quando os recursos da sua economia forem por circunstâncias anormais insuficientes para dar satisfação às necessidades mínimas da família».
Dado o seu carácter provisório, a autorização para a cobrança das receitas que o constituem carece de ser renovada todos os anos.
Presentemente rege-se pelo Decreto-Lei n.º 42 093, de 9 de Janeiro de 1959, com as alterações introduzidas pelos Decretos-Leis n.ºs 42 293, 42 818 e 43 144, respectivamente de 3 de Junho de 1959, 25 de Janeiro e de 3 de Setembro de 1960.
As receitas serão aplicadas não só na prossecução do fim especialmente previsto no Decreto-Lei n.º 35 427, mas ainda na assistência materno-infantil e na prevenção e repressão da mendicidade, não podendo ser inferiores a 60 por cento das importâncias arrecadadas as destinadas a esta última modalidade.
Nos catorze anos da sua existência foram despendidos pelo Fundo de Socorro Social mais de 500 000 contos, cifra que dá a medida do volume da acção assistencial desenvolvida com base nas suas receitas.
As despesas administrativas e todas as outras relativas à sua gerência não atingiram 1 por cento das receitas cobradas.
Dado o objectivo para que foi criado, e que deve ser mantido, não se justifica que parte do seu produto, como na proposta se prevê, seja afecto ao reforço das dotações insuficientes, o que equivaleria à sua aplicação indiscriminada.
Ora, desde que se mantenham as circunstâncias que motivaram a afectação do fundo a determinados fins - necessidade premente de socorros, com dispensa de formalidades burocráticas, designadamente em relação às vítimas de sinistros ou de calamidades públicas, luta contra a mendicidade -, parece que esses fins não devem ser alterados.
144. O domicílio de socorro é a circunscrição a que cada cidadão pertence, para efeitos de assistência.
A sua determinação obedece a critérios diversos nos vários países, desde o da naturalidade ao da residência, ou até ao da origem do ramo familiar.
Em Portugal, para só referir a legislação mais recente, o domicílio de socorro determinava-se no Código Administrativo pela residência do necessitado (artigo 751.º, n.º 7) e na Lei n.º 1998 pela sua naturalidade conjugado com o critério da residência.
O projecto regressa ao regime do Código Administrativo, optando pela residência.
Parece de apoiar este retorno ao sistema anterior. Na verdade, a localidade do nascimento pode não ter