238 ACTAS DA CÂMARA CORPORATIVA N.º 31
[entre as quais o artigo 1450.º (1)], e ainda com algumas disposições regulamentares, designadamente sobre n forma de se proceder u disposição dos bens quando esta se torne necessária, ou sobre o processo através do qual o curador de doentes mentais se certificará de que a pessoa que exige a entrega de bens do internado tem realmente direito a essa entrega, recursos possíveis da sua recusa, etc.
A disposição referida, dado que apenas pode dizer respeito a internados, parece à Câmara dever colocar-se entre as normas que regem o internamento.
28. Fora destes casos, é possível encontrar uma solução para os problemas de administração do património dos dementes que se compadeçam mal com a morosidade do processo de interdição por serem urgentes ou que se compadeçam mal com a sua impopularidade e o seu preço por serem relativamente simples.
Notem-se antes de mais dois pontos.
Em primeiro lugar, urgente e simples são palavras a entender aqui em termos hábeis - designadamente em sentido relativo e não absoluto. Urgente não é a questão a solucionar em horas ou de um dia para o outro é a questão cuja solução não permite aguardar a cura do doente ou o resultado de um processo de interdição. Simples, por seu turno, é a questão cujos termos tornam o recurso ao pesado processo interditório um dispêndio inútil de energia processual.
Em segundo lugar, as questões para que a Câmara propõe um regime inovador revestir-se-ão em regime normalmente das duas características. É o caso do pagamento da renda da casa do doente sujeito a tratamento, pagamento que, se negligenciado, envolverá a possibilidade de despedimento deste; é o caso do levantamento do vencimento ou pendão do mesmo muitas vezes único sustento de todos os seus dependentes familiares; e hipóteses semelhantes. Hipóteses humildes - não será frequente verificarem-se acerca de grandes fortunas -, mas hipóteses que poderão comparativamente trazer mais dano aos pequenos patrimónios (a que o Estado deve particular atenção, Constituição Política, artigo 6.º, n.º 3.º) do que a transitória paralisação da administração de uma grande riqueza.
Sobre estas questões debruçou-se a Câmara com especial carinho, procurando um regime com as seguintes características facilidade de ser constituído e facilidade de ser levantado (pedia-se que se cingisse estreitamente a situação de necessidade, sem hiato entre a constituição ou a cessação do estado psicológico e a do estado jurídico de demência) e ausência ou pelo menos carácter diminuto do perigo de injustiças.
Em virtude da primeira exigência, pôs a Câmara de lado qualquer regime judicialmente constituído. Repita-se que a morosidade é uma constante judicial, resultante já do assoberbamento normal dos nossos tribunais, já da necessidade de exigir das suas decisões a devida e necessária ponderação, incompatível com a celeridade.
E assim foi a Câmara levada a considerar a única alternativa (ao sistema da instauração da tutoria ou curadoria pelo tribunal) que, como se diz atrás, a Câmara considera digna de atenção a instauração dessa tutoria ou curadoria ipso jure, pelo simples facto da sujeição a tratamento - e, repita-se sempre, para o âmbito restrito dos problemas urgentes e mau simples, compatíveis com uma solução meramente provisória do problema da administração de um património deixado vago pela doença do seu titular.
A questão que imediatamente então se levantou foi a da designação do curador ipso jure nomeado.
E nesse ponto, ponderadas as diversas, soluções possíveis, parece à Câmara de propor um sistema que, inovador embora (1), lhe parece prático e eficaz.
O sistema que parece à Câmara preferível é o da criação, junto de cada centro de saúde mental, de um órgão novo, a que são atribuídas funções de curadoria dos bens dos doentes mentais tratamento, sempre que tal curadoria se monte necessária e conveniente.
Esse órgão - a que a Câmara dá o nome de curador de doente mentais (2) - é pelo projecto regulado nas suas grandes, linhas gerais, primeiro porque assim deve ser numa lei de bases (Constituição Política, artigo 92.º), segundo porque se pretende conservar neste campo uma certa elasticidade, permitindo ao Governo amoldar a instituição, através de regulamentos, às necessidades sentidas.
Fundamentalmente definem-se na lei - além da denominação, da integração administrativa e da necessidade de provimento em licenciado em Direito (1) - as funções dos curadores, que são bàsicamente e cinco função de habilitação, função de administração, função de promoção do processo interditório, função de protecção e função de esclarecimento e conselho.
A primeira função exerce-se caso o doente mental tenha administrador que o supra no seu impedimento - designadamente esposa (artigos 1117.º, $ único e 1189.º). Nessa altura o problema com que se debate o administrador legal é sempre o da prova desta qualidade. Essa prova será feita por certificado do curador, certificado esse que habilitará o administrador a praticar qualquer acto de administração, inclusivamente receber qualquer vencimento, pensão ou quantia devida a qualquer título.
A segunda função - que só será exercível quando o não for a primeira - é a mais delicada de traçar. Incumbe-se ao curador, não havendo administrador legal ou voluntário, praticar os actos de administração dos bens do doente mental que este não possa praticar e ou sejam urgentes (por a sua não realização causar ao doente prejuízo de outra forma evitável, como seja o despedimento do prédio que habita, a caducidade de uma compra a prestações por falta de pagamento de uma prestação, a perda de bens perecíveis, etc. ) ou se traduzam apenas ou muito prevalentemente em proveito do doente (como recebimento de uma dívida, pensão ou vencimento, a ser depositado em nome do doente) ou se destinem a prestar alimentos que o doente deva (sustentar os filhos, ou parentes a cargo deste)
Quando o curador seja da opinião que o património do doente e a duração provável da sua doença exijam
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(1)O depositante tem obrigação de indemnizar o depositário de todas as despesas que haja feito na conservação da coisa depositada ou por coisa depositada.
(2)Poderá haver se como provisório ou experimental em relação ao futuro Código Civil - então se colherão os frutos da experiência do sistema que, a ser acolhida a proposta da Câmara, ora se estabelece
(2) Em rigor deveriaser curador de dementes não (judicialmente) interditos, para o distinguir do curador de dementes (judicialmente) interditos que é o Ministério Público (artigos 187.º, 220.º e 321.º do Código Civil).
(3) Omitem-se, note-se, pontos de importância, como o carácter gratuito ou oneroso da intervenção do curador, a responsabilidade deste, etc.