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16 DE MARÇO DE 1971 619

Esse sistema, de inspiração norte-americana, é mantido pela proposta de lei de revisão em análise, mas ficará sujeito a ser substituído por outro que tem, designadamente nos últimos decénios, e em seguida a certas experiências (designadamente na Checoslováquia e na Áustria) obtido as preferências dos legisladores constituintes europeus - o sistema de um (ou de mais que um) tribunal constitucional especial.
Sem embargo da transcendência desta prevista transformação, não se pode rigorosamente dizer que se ultrapassa, precisamente, o campo em que as revisões constitucionais se devem situar, que é o da "técnica", muito mais que o dos "princípios". No fundo, do que se trata, é do prever a instituição de um processo técnico, porventura melhor que o actual, de assegurar a defesa da Constituição, defesa que também constituiu preocupação do legislador constituinte de 1933.

7. Matéria de particular melindre, que na proposta igualmente se enfrenta, é a da administração ultramarina. Também neste domínio, analisadas serena e desapaixonadamente as coisas, não vêm recomendadas à apreciação da Assembleia Nacional inovações que possam entender-se como fractura ou desvio manifesto dos grandes princípios constitucionais, originariamente consagrados na lei fundamental. Sempre, desde que o mito assimilacionista, Intimamente ligado à ideologia de 1789, se desvaneceu, estes princípios consistiram, em que, sem prejuízo da sua integração política no Estado Português, sem prejuízo, portanto, da unidade nacional, o especial condicionalismo de cada um dos territórios ultramarinos impõe o reconhecimento deles como entidades, não apenas autárquicas, mas também autónomas - autónomas no sentido de que, através de órgãos locais, mais ou menos representativos, (terem intervir, não apenas na execução das leis emanadas de Lisboa e no desempenho das tarefas administrativas de interesse próprio, mas na própria feitura de uma legislação local especial, fora do que se pode chamar o "domínio reservado" do Estado.
Inscrever na Constituição as normas que dêem expressão de maior autenticidade a participação das gentes e dos interesses sociais ultramarinos na definição do direito relativo àquelas matérias que não são "reserva do Estado", não é, salvo melhor parecer, aferir as portas ao desmembramento deste é o consequente ruína da unidade nacional: é promover, nos nossos tempos, esta unidade, na única forma em que ela pode e em que ela, portanto, deve ser mantida.
Aliás, a proposta institui ou prevê todo um sistema de frenagem de tendências centrífugas que porventura se gerassem, sistema praticamente idêntico ao já. hoje existente, o qual se destina a funcionar tanto em relação ao legislador local como à própria administração e função executiva de cada território.
Isto significa que a proposta (r)e inspira, em duas ideias complementares e de nenhum modo contraditórias: a de que ó devido reconhecer as províncias ultramarinas como entidades com a sua personalidade e portanto com a sua descentralização administrativa e a sua autonomia legislativa; e a de que ó também necessário preservar, por instrumentos de centralização e de "reserva do Estado", a unidade nacional e a solidariedade entre todas as parcelas da Nação Portuguesa.
É precisa uma combinação sábia e feliz entre a descentralização e a autonomia, de um lado, e a centralização integrativa, do outro. A fórmula há-de ser esta: deve haver toda a descentralização e autonomia possíveis, dentro da integração política e da unidade nacional necessárias.
Em geral, a proposta corresponde a esta preocupação - e, assim, não infringe os princípios originariamente perfilhados na decisão constituinte de 1933: o que procura é dar-lhes uma explicitação mais adequada e desenvolvê-los até onde a sageza política o consente e recomenda.

8. Não seria justo deixar de acentuar neste momento o significado que assume o desígnio, expresso na sua proposta pelo Governo, de se dar tradução mais perfeita à ideia, que já teve qualquer revelação, ainda que imperfeita e inacabada, em 1951, de uma unificação do direito constitucional do Estado Português - unificação que terá agora lugar no plano substancial das declarações de princípios, e não apenas num plano formal ou sistemático. Não é, infelizmente, viável dar completo seguimento a esta directriz, com que o Governo seguramente quis exprimir, por mais uma forma, a unidade política da Nação organizada em Estado, um único Estado. A integração constitucional, traduzida ou explicitada em todas e cada uma das normas do texto da lei fundamental, significa de per si e visa significar, realmente, a unidade nacional, a todas as luzes. Na medida em que nos aproximamos deste ideal, servimos e proclamamos a unidade política da Nação. 0 limite nesta direcção será constituído apenas pelas realidades insuprimíveis. Os textos constitucionais assimilacionistas ignoraram no passado este limite e quiseram forçar estas realidades.
Saudemos, portanto, a louvável intenção do Governo, que e, seguramente, repete-se, sublinhar, por mais esta forma, a substancial unidade política da Nação.

9. Considera-se de grande relevo técnico e teórico, mas de somenos alcance político e prático, o conjunto das modificações e aclarações que na proposta se inscrevem, respeitantes às relações internacionais do Estado Português. De qualquer modo, elas não contendem com a orientação inicialmente perfilhada na lei fundamental, relativamente às relações entre o nosso país e a comunidade internacional e às relações entre o direito das gentes e o direito interno português. Do que se trata neste momento é simplesmente de aperfeiçoar um sistema que já nos não coloca mal em relação aos que são perfilhados no direito constitucional de outros Estados.

10. Julga-se, portanto, que a proposta de lei do Governo não importa nenhuma quebra no regime constitucional estabelecido e nas instituições ideadas, vão decorridos quase quarenta anos, e à sombra dos quais o País tem vivido em paz social, em ordem, e tem percorrido os caminhos do seu desenvolvimento, preservando os valores considerados fundamentais da civilização cristã ocidental. A esse regime a proposta mantém-no. Há continuidade. Os tempos e as circunstâncias requerem entretanto adaptações e aperfeiçoamentos, em ordem a que esses valores fundamentais, designadamente os da pessoa humana e da sua dignidade, sejam defendidos e realizados tão completamente quanto possível. É o objectivo da proposta de lei. Há renovação. Renovação na continuidade.

11. Pouco tempo antes do termo da sua carreira política, Oliveira Salazar, o homem cujo pensamento se inscreveu desde início na Constituição, disse que as presentes instituições políticas asseguraram a paz e a esta-