18 DE FEVEREIRO DE 1972 1207
50 m e compreendidos nas bacias hidrográficas do Minho, Lima, Cavado, Douro, Tonga, Lis, Lisandro, Tejo, Sado, Mira e Guadiana (52).
Salienta-se ai que representando a vinicultura um dos mais consideráveis valores agrícolas e um dos mais importantes factores da nossa receita económica, persistentemente se vai arrastando entre as angustias de constantes dificuldades e incertezas e porventura caminha para a sua inevitável ruína. E concretiza-se:
Tendo havido em 1902 um ano de colheita escassíssima em que por completo, ou quase por completo, se estancaram as quantidades de vinho em depósito nas adegas dos produtores, basta a relativa abundância da colheita imediata para que logo os pregos baixem por uma forma extraordinária e os viticultores fundadamente se queixem de não encontrarem a quem vender os seus produtos, mesmo pelo aviltado preço a que no mercado se contavam. A ruim colheita do ano actual, deparando com um largo stock de aguardente e com as adegas pejadas de colheitas anteriores, foi ainda assim um providencial alivio que deu em grande partes vazão ao vinho acumulado em poder dos viticultores; mas já começa de acentuar-se um decrescimento nos pregos da aguardente pelo fatal destino de alguns vinhos para a caldeira sem que possa contar-se com uma elevação no preço do vinho para consumo, porque é manifesta a indecisão nas compras. Os riscos de bruscas alterações na produção embargam a formação de depósitos e não é duvidoso que o comercio receia a mesma imprevista e inqualificável baixa que em 1903 perturbou singularmente as operações de grande número de casas comerciais da especialidade. Não há duvida de que para aquela queda concorreram largamente as falsificações que são o mais danoso e temível inimigo da viticultura, que importa perseguir com rigor, estabelecendo-se um apertado conjunto de medidas que permita uma repressão eficaz e decisiva.
0 panorama assim aflorado no relatório do decreto de João Franco repetir-se-ia, de resto, até aos nossos dias. 0 Decreto n.°21086, de 13 de Abril de 1932, viria reiniciar um processo de intervenção que em 1907 não teve continuidade (53).
52 Diário do Governo, n.° 275, de 5 de Dezembro de 1907.
A Lei de 18 de Setembro de 1908 (Diário do Governo, n.° 215, de 24 de Setembro) relevou o Governo da responsabilidade em que incorreu pela promulgação dos decretos relativos a suspensão por três anos da faculdade do plantio da vinha. Por sua vez, o Decreto de 22 de Outubro de 1808 (Diário do Governo, n.° 241, de 24 de Outubro) nomeou as vogais da comissão que deveria proceder a um inquérito em todas as regiões vinhateiras do Pais, nos termos das disposições legais relativas a suspensão da faculdade de plantar vinhas.
53 No preambulo deste Decreto de 2 de Dezembro de 1907 formula-se nos seguintes termos a filosofia politica do Governo em matéria de intervenção económica:
Vulgar é o repetir-se que não são possíveis de remédio artificial as crises económicas e que das providencias coercitivas, por mais miraculosas que se afigurem, não logram alcançar-se senão paliativos insuficientes e transitórios, concluindo assim que melhor é deixar ao jogo espontâneo das reacções naturais o termo de lutas e contendas daquela espécie, que buscar intervir nelas e graduar-lhes a intensidade por meio de disposições audazes e decisivas. Outra deve a nosso juízo ser a função do Governo, que previdentemente tem de acautelar todos os interesses legítimos, acudir com protecção aos que dela carecem, encaminhar o trabalho nas veredas de mais intenso aproveitamento e
As causas da crise eram então comentadas nestes termos:
Sucessivamente, e em todo o mundo vinícola, a crise de escassez subsequente as invasões filoxéricas veio a originar uma transformação quase radical da cultura da vinha e uma crise de consumo, menos devida k maior extensão de terreno ocupado pelos vinhedos que ao plantio de novas regiões, deslocação das cepas para os terrenos férteis, a maior produção de enxertias em castas americanas, à substituição das castas indígenas de finas qualidades pelas grandes produções das castas novas. Os vinhos incaracterísticos, susceptíveis de mais rápida alteração, obtidos pelos modernos processos de intensificação de cultura, com preços inferiores de produção, tomam o lugar, nos grandes depósitos de exportação e nos grandes centros de consumo, aos velhos vinhos que a doença quase destruíra e combatem depois os tipos definidos gramas aos processos enológicos, as substancias químicas e as lotações, usurpando-lhes o antigo e acreditado nome, que em todos os países cobria produtos da mais diversa procedência. Todos verificam que os vinhedos emigram, vão lentamente escorregando das encostas onde a limitadas e trabalhosas produções correspondiam vinhos de qualidades superiores, de tipos acreditados por uma longa tradição, e imoderadamente se vão alastrando pelos terrenos baixos, húmidos, fecundos, onde a vinha produz as grandes quantidades e onde a cultura pode fazer-se intensa e economicamente. Províncias, regiões, terrenos, onde a cultura da vinha era quase ignorada transformaram-se de súbito em férteis áreas vinhateiras, enquanto as encostas, onde os vinhedos eram por vezes o único e possível proveito, ficam desoladas e estéreis, pendurando muitas vezes pelas suas escarpas
enfezadas e precárias tentativas de culturas quase improdutivas, inteiramente desconformes com as aptidões do solo para onde as desterraram.
No entender do legislador de 1907, dispondo-se ainda de grandes mercados consumidores, os esforços para os defender e assegurar deveriam essencialmente dirigir-se a qualidade, pois esta era, «por mercê da constituição do nosso solo e da sua favorável exposição e ainda pela especialidade das castas cultivadas», a única que nos garantiria vantagens e superioridade. 0 futuro da nossa exportação dependeria da «prosperidade das regiões onde se produzem os vinhos nobres e afamados que não tem em competências e aos quais devemos o crédito universal dos produtos dessa natureza».
Isto não significa que os vinhos baratos não tivessem então «para os nossos mercados de exportação urna insubstituível função comercial, que seria pouco avisado impedir definitiva e completamente». 0 que importava indispensavelmente que se mantivesse adentro dos limites tais que não sufocasse a dos vinhos afamados, «por serem estes a principal garantia dos mercadas e o único veículo para vigiar por que as forças de produção se não desorientem inebriadas pela esperança de lucros transitórios, que precedem e anunciam muitas vezes irreparáveis desgraças.
E um pouco mais adiante acrescenta-se:
0 Governo deve intervir activamente sempre que vê em risco a economia nacional e deve seguir com atenta vigilância dos vários episódios destas contendas para adoptar com decisão aquelas providencias que sejam proveitosas e adequadas a importância dos interesses que lhe incumbe defender e vigiar.