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1 DE MARÇO DE 1944 167

riamente: «Em face da sua atitude e desrespeito, vejo-me obrigado a sair e levar o meu cartão de identidade».
Acto contínuo, tirou-o de cima da mesa. Agarrado imediatamente por outro guarda fiscal, o sargento vibrou-lhe de uma maneira abrupta, que deixou surpreendidos todos os presentes, uma fortíssima pancada na cabeça com uma cadeira que tinha junto à mesa e que se partiu.
Esta arremetida heróica do sargento, perante uma pessoa inteiramente indefesa, impossibilitou o participante, a sangrar por várias feridas e de gravidade, de continuar a defender a sua posição de Deputado e deixou-se ficar preso no pôsto, guardado pelo heróico sargento e por guardas fiscais, na presença, dos referidos Srs. comandante de lança Alfredo Oscar de Magalhãis e arrais Manuel Barbosa.
Continuando a sangrar com uma profunda ferida junto do lábio inferior, limitava-se o participante a solicitar que o deixasse sair para que lhe fizessem tratamento exigido pela natureza dos ferimentos. Mostrou-lhe o perigo de uma infecção, a necessidade urgente de um curativo feito por um médico, o desejo até que êsse médico fôsse da guarda fiscal, o dever mesmo que êle teria de facilitar o tratamento a qualquer pessoa, quanto mais a um Deputado, que não podia estar preso.
O sargento, que a nada se movia, respondeu que o participante não estava preso, mas sim detido, até chegar o seu comandante de secção, que tinha mandado chamar.
Passada meia hora, novamente lhe fez sentir a extraordinária situação que tinha criado a um Deputado: ali preso e sem se poder tratar de graves ferimentos recebidos.
Em tom superior, respondeu: «Nem que fôsse o Presidente da República. Quem manda aqui sou eu».
Em face desta renitente atitude, o Sr. Alfredo Oscar de Magalhãis foi esclarecer pele telefone, cujo número não lhe foi indicado no pôsto, o oficial comandante da secção dos factos que se passavam.
Entretanto o sargento, certamente já com um lampejo de consciência, mandou chamar um farmacêutico, que compareceu poucos minutos antes do Sr. oficial comandante da secção, e que não chegou a prestar os seus serviços por êste Sr. oficial facilitar a saída imediata do participante para fazer o tratamento. Passavam 45 minutos depois dos ferimentos recebidos.
Após o curativo feito no Hospital da Misericórdia compareceu o participante no comando do batalhão para prestar os esclarecimentos que lhe fôssem solicitados.
Ignoram-se até à data as providências tomadas sôbre a atitude do sargento.
Estes factos têm uma natureza de tal gravidade que se entendeu dever participá-los a V. Ex.ª para os efeitos que julgar convenientes.

A bem da Nação. - Pôrto, 27 de Fevereiro de 1944. - O Deputado Albano Camilo de Almeida Pereira Dias Magalhãis.

O Sr. Presidente: - Como V. Ex.ªs acabam de ver, estamos em presença de factos graves.
Em primeiro lugar, houve um atentado contra as imunidades parlamentares; o Deputado Albano de Magalhãis foi preso ou detido, apesar de ter declinado a sua qualidade de Deputado e exibido o seu cartão de identidade: infracção manifesta do artigo 89.º da Constituição; em segando lugar, o Deputado Albano de Magalhãis foi vítima de uma violência e de uma agressão brutal por parte de um sargento da guarda fiscal no momento em que se encontrava agarrado por outro guarda fiscal; e, finalmente, depois de agredido e de ter recebido lesões que provocaram o derramamento de sangue, esteve retido durante 40 minutos sem assistência médica, apegar de a solicitar com insistência.
Parece-me que em face destas ocorrências a Assemblea não pode deixar de lamentar profundamente o acontecimento, manifestar ao Sr. Dr. Albano de Magalhãis a sua estima e consideração, exprimir a sua repulsa pelo desacato e pela agressão de que foi vítima e significar o seu veemente desejo de que justiça seja feita, inteira e completa.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Sr. Carlos Borges: - Peço a palavra!

O Sr. Presidente: - Antes de dar a palavra a V. Ex.ª vou mandar ler um telegrama, que acaba de ser recebido na Mesa, referente a êste incidente.

Foi lido na Mesa. É o seguinte:

Impossibilitados comparecer Assemblea transmitimos Vossa Excelência protestos veementes desrespeito, imunidades parlamentares nosso colega Albano Magalhãis ocorrido posto fiscal esta cidade Antunes Guimarãis Marques de Carvalho José Nosolini Luiz Pina José Sá Carneiro.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Borges.

O Sr. Carlos Borges: - Sr. Presidente: é realmente muito grave o facto que V. Ex.ª acaba de comunicar à Assemblea. Todos o lamentamos profundamente: por parte do agredido, porque, sendo um nobilíssimo representante da Nação, desempenhando digna e nobremente o seu mandato, tendo afirmado em várias ocasiões as altas qualidades do seu espírito e carácter, a todos merece a maior estima e consideração.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Também pela pessoa distinta, aprumada, elegante, sóbria nas suas atitudes, incapaz duma violência, duma grosseria, dum desacato, dum esquecimento daquilo que lhe é devido e do que aos outros deve.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Nós, Sr. Presidente, nós, os Deputados da Assemblea Nacional, não estamos rodeados de grandes imunidades.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - De todas as constituições que conheço, aquela que menos garantias dá aos Deputados é a Constituição sob a qual estamos vivendo.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Não o digo como censura, por desapontamento, não o afirmo porque não julgue que as imunidades que temos são suficientes. Penso, Sr. Presidente, que as imunidades que temos bastam, e bastam porque nós não precisamos delas, porque a correcção das nossas atitudes, a dignidade do nosso procedimento, o respeito das leis e o cumprimento dos deveres podem prescindir dessas garantias.

Vozes: - Muito bem, muito bem!