23 DE MARÇO DE 1944 295
cargo que pesa sôbre a propriedade em virtude da sua função social.
Este mesmo principio é de aplicar ao capital, porquanto no artigo 11.° do Estatuto do Trabalho Nacional se diz que a propriedade, o capital e o trabalho desempenham uma função social, em regime de cooperação económica e solidariedade.
Eu propus, pois, a eliminação desta base justamente para deixar margem ao Governo para estudar e legislar acerca do assunto, por me parecer mais aconselhável adoptar-se o critério de lançamento de impostos de ordem geral, embora de aplicação local.
Tenho dito.
O Sr. Antunes Guimarãis: - Ao apreciar esta base XXV, que permite às câmaras municipais o lançamento de derramas para ocorrer às necessidades de assistência do concelho, imediatamente aflorou no meu espírito a idea de propor a sua eliminação total.
É que a orientação de se concentrarem, com prejuízo da Nação, os réditos do Tesouro principalmente em obras na capital e respectivos subúrbios, numa política de larga urbanização, muito discutível, e que vem sendo contraindicada, não só pelos trágicos efeitos da guerra, mas por conveniências bem patentes de ordem económica e demográfica, é que, vinha dizendo, aquela tam desequilibrada concentração, que cerca de sete milhões de portugueses desaprovam, encontra imitadores pelo País fora, sendo frequente assistir-se à concentração das receitas concelhias, para as quais concorrem com largo contributo as freguesias rurais, em obras (não digo melhoramentos, porque geralmente não merecem tal designação) nas sedes dos concelhos, as quais, se uma ou outra vez são necessárias, quási sempre ficam muito aquém, no que diz respeito a urgência, a tantas outras que as populações rurais vêm, com razão, reclamando, mas... no deserto.
Mas sôbre a circunstância de na base XXV se dizer que o lançamento de tais derramas carece de autorização, eu confio em que, além do voto dos conselhos municipais (que acabarão por reconhecer que muitas distribuições injustas dos réditos municipais são devidas a insuficiente fiscalização dos vogais que naqueles conselhos representam os interesses das freguesias e de certas actividades que ali se exercem), o Govêrno não deixara, ao dar a precisa autorização, de prevenir as iniqüidades que venho de apontar.
Por isso apenas propus a eliminação do segundo período da base XXV, que diz:
«No lançamento destas derramas as percentagens dos proprietários residentes normalmente no concelho poderão ser elevadas ao dobro e ser delas isentos os pequenos contribuintes».
Em primeiro lugar, isto de residência no concelho e de ausência normal são circunstâncias de muito difícil averiguação e, assim, fonte de injustiças e consequentes trabalhos para a defesa dos que se julgarem indevidamente colectados no dôbro.
Em segundo lugar, tenho verificado que, mercê do aperfeiçoamento das comunicações e rapidez dos transportes, o problema do absentismo, que os autores da proposta de lei parece assim querer combater, já não se reveste dos inconvenientes de outros tempos, sendo até notório que proprietários que não residem nas respectivas propriedades nem por isso deixam de enfileirar entre os que aos melhoramentos e progresso local, e, também, no sector da assistência, mais relevantes serviços prestam.
E há ainda que ter em conta o caso, aliás frequentíssimo, de proprietários em vários concelhos.
Sôbre a isenção dos pequenos contribuintes, à primeira vista muito simpática, devo dizer que em muitas regiões, tais como Entre-Douro e Minho, Beiras Alta e Litoral, Algarve e ainda outras, onde a pequena propriedade muito felizmente abunda, se fossem isentos da projectada derrama, seriam poucos a suportá-la, e, dai, ou rendimentos escassos, que a não justificariam, ou taxas exageradas, que a propriedade, já fortemente onerada, não comportaria.
Mas há mais, Sr. Presidente.
Sendo justamente de entre os pequenos contribuintes que a obra da assistência social há-de recrutar a grande massa dos seus infelizes recrutados, porque excluí-los da obrigação de, quando for absolutamente preciso, contribuírem, embora em proporções modestíssimas, para o respectivo cofre?
O Sr. Presidente: - Acaba de chegar à Mesa uma proposta que dá satisfação ao pensamento de V. Ex.ª
Diz o seguinte:
«Propomos a substituição da base XXV pela seguinte:
Poderão as câmaras municipais ser autorizadas a lançar extraordinariamente derramas com fim exclusivo de ocorrer às necessidades de assistência do concelho. A derrama incidirá sobre todas as contribuições directas cobradas nos concelhos e devem ser delas isentas os pequenos contribuintes.
Os Deputados: Alexandre de Quental Calheiros Veloso - Artur Rodrigues Marques de Carvalho - João Xavier Camarote de Campos - Querubim do Vale Guimarãis - Albano Pereira Dias de Magalhãis - Artur Proença Duarte.
O Orador: - Sr. Presidente: entendo que a proposta a que V. Ex.ª acaba de fazer o favor de referir-se não atende todos os casos que eu, com a eliminação por mim proposta, pretendo evitar.
Prosseguindo nas considerações que estava fazendo sôbre isenção dos pequenos contribuintes, pregunto:
Não pagam os operários para o «Desemprêgo» e para as suas caixas?
Além dos sócios contribuintes, não cumpre também aos sócios efectivos, isto é, os que vivem do seu trabalho, ou pouco possuem, contribuir para as Casas do Povo?
Conviria, sim, evitar esta multiplicidade de taxas e cotas para a assistência, previdência e fins equivalentes.
Mas, por agora, e a manter-se o princípio das derramas constante da base XXV, entendo que não deve estabelecer-se isenção para os pequenos contribuintes no que respeita ao dever que sobre todos impende de concorrer para a assistência.
Contudo, repito, continuo a confiar na iniciativa e generosidade dos particulares como factores fundamentais da assistência social. Caso é que o Estado, longe de os embaraçar em tam simpática missão, saiba estimulá-los.
Disse.
O Sr. Melo Machado: - Sr. Presidente: devo dizer a V. Ex.ª que estou absolutamente de acôrdo com a base proposta e especialmente com a emenda que acaba de ser apresentada. E direi a V. Ex.ª porquê:
Nas províncias do País onde a religião tem uma acção mais profunda nós temos assistido a esse espectáculo verdadeiramente admirável que são os cortejos das oferendas. Mas não sucede isso em todo o País, infelizmente.
Quero referir alguns números, e por isso direi a V. Ex.ªs que, por exemplo, conheço um concelho que tem oito mil contribuintes e onde apenas pouco mais de um cento faz parte da Misericórdia local.
Sucede, pois, que nos concelhos que estão nestas circunstâncias são sempre as mesmas pessoas a dar, e, porque hoje se pede muito, se pede sempre e se pede para