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3 DE ABRIL DE 1948 425

Mais adiante diz, referindo-se à frequência do ensino de vários graus, que:

A maior parte dos diplomados por escolas superiores de carácter profissional, incluindo Medicina e Direito, mas especialmente Agronomia e Engenharia, tenta ingressar nos quadros do Estado.

Em relação ao Instituto Superior de Agronomia, direi desde já que esta última afirmação não é verdadeira, pois uma grande parte dos diplomados desta escola não vai para empregados do Estado; pelo contrário, ficam nas lavouras, sendo muitos deles filhos de agricultores de várias regiões do País, indo assim exercer missão valiosa no fomento da técnica agrícola.
Por outro lado, o distinto relator das contas públicas por várias vezes afirma neste trabalho que a agricultura portuguesa está muito atrasada em relação a muitos países estrangeiros.
É exactamente com o objectivo de analisar mais profundamente os aspectos focados pelo engenheiro Araújo Correia especialmente no que se refere à acção desenvolvida pelos serviços agrícolas oficiais que eu me encontro neste lugar.
Desejo render as maiores homenagens ao relator do parecer, não só pelo valor intrínseco do seu notável trabalho, como pelo espírito de continuidade que ele nos revela. As críticas que são feitas aos vários sectores da administração só o valorizam, representando subsídios de altíssimo valor para a análise de alguns importantes problemas da economia nacional.
Contudo, para podermos ajuizar com maior rigor diversos aspectos focados - e o engenheiro Araújo Correia também o diz - é necessário fazer investigação mais cuidada. Neste sentido vou procurar dar o meu tributo para o esclarecimento destes problemas.
Serão, na realidade, fundamentadas estas afirmações? Terá sido, até hoje, pouco proveitosa a acção de fomento do Estado neste sector? E será, na realidade, ainda inconveniente que se verifique, quanto ao número, o predomínio dos técnicos orientadores no momento actual, em que se estudam ainda os problemas fundamentais da economia agrícola nacional, metropolitana e ultramarina?
Vamos procurar responder a estas perguntas e, respondendo a elas, também o fazemos às observações feitas pelo Sr. Deputado Araújo Correia.
A análise, embora rápida, deste assunto, em relação ao caso português, exige, porém, que o integremos no quadro europeu.
Nos fins do século passado, quando se iniciou a era industrial, com o aparecimento da máquina a vapor, aproveitamento, em larga escala, dos carvões fósseis e de diversos minérios, a Europa começou a diferenciar-se nos campos económico e social, e, passado pouco tempo, distinguiam-se, no continente europeu, duas fracções absolutamente distintas, com características bem definidas na economia, na vida social e no modo de ser político.
Essas duas zonas foram designadas pelo economista francês Delaisi, respectivamente; por Europa do cavalo-vapor e Europa agrária.
Na Europa do cavalo-vapor a actividade era febril. Floresciam todos os dias novas unidades industrias. A actividade circulatória dos homens e das mercadorias era intensa. A vida social tendia- a nivelar-se. As élites intelectuais eram numerosas e o analfabetismo quase inexistente. Neste clima económico-social tornava-se fácil a governação dos povos.
Foi assim que na Europa do cavalo-vapor floresceram e frutificaram as democracias do tipo inglês, escandinávico, etc.
Na Europa agrária, pelo contrário, situada a leste, sudeste e sul do velho continente, as condições eram totalmente diferentes.
Nesses vastos territórios os povos mal tinham acordado ainda do sono medieval. Aqui e acolá laivos de feudalismo constituíam traços nítidos do passado. As populações passavam uma existência difícil. As unidades industriais surgiam esporadicamente. Havia uma grande diferenciação de classes sociais e uma grande separação entre a cidade e o campo. As élites intelectuais eram reduzidas. A governação dos povos só se podia fazer nestes países agrícolas, em condições satisfatórias, sob o domínio de uma forte autoridade. Assim se antepunha, em numerosos aspectos, a Europa agrária ao feliz território do cavalo-vapor.
A distribuição das populações na Europa tornava ainda mais nítida esta diferenciação.
Na Europa do Leste, do Sudeste e do Sul manifestava-se, e manifesta-se hoje de forma mais nítida, intensa sobre pressão demográfica. Na Europa industrial, pelo contrário, nota-se uma situação estacionária, sem tendência pára acréscimo rápido das populações.
Reunindo os povos europeus em três grupos - o latino, o germânico e o eslavo -, o professor Reilhinger chegou à seguinte conclusão:
O grupo latino, que em 1800 tinha começado com 64 milhões, deverá atingir em 1930 133 milhões.
O grupo germânico, compreendendo 57 milhões em 1800, deverá ter 160 milhões em 1960, e o grupo eslavo, com 66 milhões em 1800, atingirá em 1960, segundo os cálculos do referido economista alemão, 503 milhões.
Estes números, denunciando a grande vitalidade dos povos eslavos, põem bem em foco as causas de uma possível luta pelo predomínio na Europa entre o eslavo oriental e os povos demogràficamente debilitados do Ocidente europeu.
Na Europa do cavalo-vapor nota-se ainda uma densidade de população agrária absolutamente saudável, entre 50 o 60 habitantes por quilómetro quadrado, ao passo que na Europa agrícola as densidades agrárias revestem hoje aspecto nitidamente patológico.
Se considerarmos, por outro lado, a distribuição dos solos e dos climas na velha Europa, verifica-se outra coincidência, que é interessante realçar: o clima mais favorável para a intensificação cultural e os solos podeólicos, que definem acção marcada e intensa das chuvas na formação da terra, dominam na Europa do cavalo vá por.
Pelo contrário, a Europa agrária é caracterizada pelo elevado índice de aridez, sendo a cultura intensiva apenas possível onde as águas, subterrâneas ou superficiais, possam ser económicamente aproveitadas.
Portugal encontra-se localizado na Europa agrária. Por isso não podemos deixar de considerar erradas todas as comparações que se façam com países da Europa industrial. Muitos tratadistas, e o próprio relatório das contas públicas, cometem este erro, fazendo a comparação das médias portuguesas com as de países como a Dinamarca e a Holanda, que são nações de condições ambientais mais propícias para a intensificação cultural.
A Dinamarca, por exemplo, apresenta grande uniformidade de clima e de solo em todo o seu território. Por isso, uma escola ou uma estação agrária numa determinada região deste país poderá ser em tudo semelhante a todos os outros estabelecimentos do mesmo género localizados noutras regiões do país.
Portugal, pelo contrário, é um país de contrastes. Ao norte aproxima-se, na mesologia, das características dos países húmidos. No setentrional, sul e interior do país extensas regiões aproximam-se, quanto às condições climáticas, da aridez norte-africana.
Não é possível, por isso, ter em Portugal estabelecimentos moldados num único figurino. É um erro pretender que assim aconteça.