O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

606 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 144

da obra salazariana, do viverem farisaicamente para os seus próprios interesses, numa ambição mal dissimulada de lucros imediatos, fazendo dos escaninhos da desvalorização monetária um trampolim para a sua cobiça, envilecendo élites o enfraquecendo a classe média, abrindo assim as portas ao comunismo.
20, 39, 52, não são números que marginem apenas os anos desta era, são subépocas económicas da nossa história contemporânea, parecem-nos curtos espaços de tempo, mas constituem como que um mundo de coisas em que se modificou profundamente o conjunto económico lusitano. Salazar não é um homem público para fazer uma programatização banal de «instantâneos», mas ninguém como ele pode compreender que o que se legisla para uma obra em 1929 pode não servir em 1942 e muito menos em 1952.
O equilíbrio e a estrutura financeira que Salazar deixou em boas mãos aos seus sucessores estão perfeitamente intactos, mas tudo mudou de 1928 e 1939 para cá, sofreram profunda alteração as condições económicas, pletorizaram-se as atribuições do Estado, mas invariavelmente a nossa orçamentalogia, qual tabu, manteve fixamente as suas linhas gerais, continuou-se a orçamentar classicamente em volta de um critério de ordinaridade e de extraordinaridade que fez o seu tempo, que perdeu tecnicamente todo o seu significado real e acabou por se tornar essencialmente confusionista.
Um bom equilíbrio orgânico, mesmo quantitativo, tem de se estruturar em volta de um critério tripartido: administração geral, investimentos e extraordinário. À primeira devem corresponder as revelhas atribuições do Estado, antes da sua fase intervencionista; a segunda para nos dar a posição global de um orçamento económico, e a terceira reservando a extraordinaridade para o que é autenticamente extraordinário e um pouco imprevisto, fora da habituação das actuais necessidades intervencionistas e dirigistas. Em intervenções anteriores, que a Assembleia conhece, já esclareci e desenvolvi este meu critério, o que me dispensa agora, num aviso prévio tão longo, de voltar detalhadamente ao assunto.
Naturalmente procurou-se primeiro o equilíbrio quantitativo do orçamento português, num País habituado aos deficits crónicos, mas, afastados estes para sempre, há que alvejar, sem demora, o equilíbrio qualitativo ou orgânico do orçamento lusitano. O orçamento vive, entre nós, centrado sobre uma hierarquia de despesas muito à escala de valores anteriores à segunda guerra, muito para longe de um intervencionismo estadual.
A criação do fundos autónomos, libertos das peias contabilísticas, tem mitigado o anacronismo duma escala de despesas orçamentais, mas também tem ocultado o envelhecimento do orçamento nacional. Há que orçamentar sobre a previsível realidade de 1953 há que construir uma escala de valores conjecturáveis para esse ano, há também que não viver apegado, numa época de profundas mutações, à média quantitativa do cada rubrica, escravizado ao próprio condicionamento dessas rubricas.
Um altíssimo espírito como Salazar nunca supôs eterna o intangível a sua reorganização financeira; pensar o contrário é ofender mortalmente o talento de Salazar, o seu apurado sonso político. Um esboço de programatização anual, permite, com o maior esforço útil, a reierarquização da orgânica do orçamento português, triplicemente cingida a um critério político, económico o social.
O Sr. Ministro das Finanças, pela sua velha dedicação por Salazar e pelas suas extraordinárias qualidades de estadista, que não me canso de admirar, está em condições, como ninguém, de compreender o que há de permanente na obra contabilística de Salazar e de reactnalizar as reformas orçamentais posteriores a 1928, que não devem nem podem considerar-se como um tabu.
Toda essa obra financeira é viva demais para se deixar enclausurar e imutabilizar em conceitos tão pouco dinâmicos.
No desenvolvimento do meu aviso prévio vou agora encarar assuntos que têm estado pertinentes à jurisdição do Sr. Ministro da Presidência. Render-lhe homenagem é o mesmo que prestar culto às suas invulgares qualidades de talento, de trabalho e abnegação, à luta intensa que fere constantemente, na dura faina de congraçar os legítimos interesses particulares com a posição nacional. Não vou com um critério bolorento de tratados, de velhas terminologias, sincopadas, depois de terem vivido muito tempo em sinonimidade: inflação, desvalorização, proporção das reservas em relação à responsabilidade dos emissores.
Quanto, de 1919 para cá, evolucionaram a sintomatologia e patologia monetárias! Como se apetrechou a terapêutica da inflação desvalorizante!
Por toda a parto o desequilíbrio orçamental é fonte generalizada de inflação depreciadora, mas para Portugal não. Porque é que se desvalorizou então a moeda em Portugal?
Será a inflação portuguesa um fenómeno monetário?
Essas interrogações já foram postas duma forma brilhante, na anterior legislatura, por alguns ilustres parlamentares que ainda nos honram como colegas. Está ainda esse debate na memória de todos. Até agora, está por definir o que é a inflação, de tal forma ela é cambiante e polifonne, é ondulante no tempo e no espaço. A inflação é vista por uns nos seus sintomas,- por alguns nas suas causas, por outros nas suas consequências próximas e remotas.
Uns autores, perseguindo a quimera de uma doutrina, procuram construir uma realidade que se adopta a ela e lazer experiências inflacionistas que criem o ambiente económico com que sonham; outros, vêem o fenómeno como ele se passa no seu respectivo conjunto económico e, por estarem demasiadamente perto do objectivo da sua observação, defendem pontos de vista demasiadamente unilaterais, esmagados pela proximidade e contemporaneidade dessa manifestação social.
É bem conhecida hoje a palavra inflação: é uma locução quase popular, definindo um fenómeno complexo, que demanda uma explicação tão prolixa que só poderia ser ajeitada, dando-lhe um sentido prático, numa discussão de ordem puramente académica.
Um termo em uso corrente e popular de. linguagem que vivo algemado à associação de ideias que provoca, se espraia na luz indirecta e no clima que criou em seu redor.
Procedamos com método, deixemos para longe os desenvolvimentos teóricos e lixemos a nossa atenção no problema nacional de inflação, não nos deixando dominar pela atracção que o vocábulo tomou no uso corrente lusitano, que o deforma perante a realidade económica portuguesa.
É de necessidade examinar as causas de inflação em Portugal: o surto exportador foi em primeira plana o expoente máximo de motivação inflacionista. Foi reavivada, por deficiência de fiscalização, por um jogo de arbitragem o especulação dos invisíveis que se mascaravam e se infiltravam na corrente exportadora.
Em posição mais ou menos secundária, uma escassez de géneros, com alta de preços que reclamava meios mais abundantes de pagamentos. Uma velocidade de moeda diminuída pela estagnação o engorgitamento de capitais nos bancos.
Na microeconomia, um crédito abundantizado por vendas a crédito e descontos bancários que não drenavam o pântano monetário e antes o miasmavam pela corrupção dos pequenos e grandes açambarcamentos.