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28 DE FEVEREIRO DE 1953 743

De facto, não existe no Regimento nenhuma disposição que limite a natureza e amplitude das alterações a introduzir, e à prova é que a doutrina é constantemente posta em jogo durante a, discussão na especialidade pelo voto da Assembleia, que pode negar a sua aprovação a qualquer artigo ou base. Portanto, na discussão ma especialidade pode a doutrina sofrer profunda remodelação e até ser totalmente rejeitada.
Na verdade, as discordâncias manifestadas pelos Srs. Deputados durante o debate foram tão amplas que se alargaram da doutrina e oportunidade às simples discordâncias de forma. A rejeição pura e simples traduziu, e a unanimidade da ratificação com emendas confirmou, este estado de ânimo. Ninguém na Assembleia aprovou a lei tal como ela havia sido concebida, e esta discordância unânime apenas variou de medida de Deputado para Deputado.
Por mim, ao votar a ratificação com emendas, não voltava atrás em nenhuma das afirmações aqui publicamente feitas.
Discordei e discordo do decreto como acto político, pelas repercussões contrárias ao fomento e povoamento do ultramar, e portanto ao desenvolvimento harmónico da expansão portuguesa dentro do conceito da unidade nacional; discordei e discordo do conceito de sobre-valorização conforme ele vem definido no Decreto-Lei n.º 38 704, porque não tem substância económica e assenta numa manifesta confusão entre a noção de preço e a noção de lucro; discordei e discordo do método de verificação estabelecido; discordei e discordo da formação de um capital de fomento e «povoamento da natureza do proposto. Concordei com a criação de um fundo de fomento e povoamento com os objectivos previstos, no decreto e concordo ainda com a doutrina que preconiza que o Estado possa aproveitar «uma pequena parte» dos superlucros das empresas (quando eles se puderem verificar com sentido económico e tributar com equidade fiscal) para «realizar obras de fomento» que estimulem e promovam o povoamento, portanto na medida em que os lucros, depois, de referidos aos capitais investidos (incluindo reservas) e ao poder de compra da moeda, e considerados os rendimentos perdidos nos períodos em que o capital não teve remuneração ou a teve insuficiente, tenham, mesmo assim, crescido desproporcionalmente com relação aos níveis gerais de preços e ao custo de vida. Este apuro não deve, porém, fazer-se apenas sobre os preços de alguns dos produtos vendidos (por cada contribuinte, mas sim sobre os resultados líquidos finais de cada exploração, incluindo todos os produtos e todas as actividades de uma mesma empresa.
Só assim, considerando os negócios bons e os maus e as circunstâncias peculiares das empresas, se poderá conhecer com justiça o lucro verdadeiro de cada contribuinte, o resultado final de cada exploração.
Porque assim penso e creio ser a única forma da realizar justiça fiscal sem graves inconvenientes económicos, discordei e discordo dos artigos 1.º, 2.º e 3.º, da alínea a) do artigo -5.º e do artigo 7.º e concordo em substância com os artigos 4.º, 5.º [excepto a alínea a)], 6.º e 8.º do decreto-lei.
À realização de lucros excepcionais os «ganhos inesperados» de que nos fala, talvez com pouca propriedade, o decreto-lei é inteiramente de carácter individual ; não resultam forçosamente da alta dos preços expressos em moeda fiduciária, porque não dependem de um único factor - o preço -, mas do conjunto dos factores que informam cada exploração das circunstâncias .próprias de cada unidade produtora.
Assim, pode muito bem suceder, para citar apenas um exemplo frequente, entre .muitos, que um produtor ou um comerciante exportador, tendo vendido a prazo
mu determinado produto por preço inferior à base, quando chegar a data da entrega ou da exportação os preços já tenham subido consideràvelmente para além daquela base e estejam, por isso, sujeitos ao pagamento do imposto de sobrevalorização. Neste caso o exportador é tributado por um suposto sobrelucro, um «ganho inesperado», no dizer da lei (doce ironia!), de que não só não beneficiou, como veio afinal a sofrer um prejuízo, que poderá exceder a própria capacidade financeira, arruinando a empresa.
De uma maneira geral um imposto desta natureza elimina os mercados a prazo, porque ninguém se aventura, ante as incertezas que cria, a vender mercadorias para entregas futuras. Ninguém pode antecipadamente saber o imposto que virá a pagar.
Tal interferência, com o funcionamento normal dos mercados, dificulta consideràvelmente a colocação dos produtos do ultramar, sobretudo no estrangeiro, seu principal comprador. A situação assim criada não deixará de causar grandes prejuízos ao País, traduzindo-se em piores preços e, por consequência, menor e anais tardia entrada de divisas, e, provocando a acumulação das ofertas no mercado disponível, sobretudo durante os períodos de safra, acabará por afectar desfavoravelmente a balança de pagamentos e o seu normal funcionamento. Os últimos nove ou dez meses foram férteis em exemplos desta, natureza, fáceis de verificar.
O que sucedeu, com o sisal ,é exemplo saliente dos malefícios que pode causar a interferência política no funcionamento normal dos mercados. A associação do Decreto-Lei n.º 38 659, que proibiu a exportação do sisal para os países da U. E. P., seus principais compradores, com o decreto-lei da sobrevalorização criou um estado tal de incertezas com relação ao futuro que os produtores de sisal se viram forçados a efectuar vendas maciças a contado no mercado americano, excedendo a capacidade do consumo daquele mercado, o que determinou o colapso dos preços. A cotação, que era de £ 230 em Fevereiro de 1952, quando foi publicado o primeiro decreto, caiu abruptamente para £ 143 em Maio e £ 95 em Agosto.
A desdita do sisal foi tão cruel que hoje arrasta uma vida lazarenta, com preços inferiores aos custos de produção. As últimas cotações de que tive conhecimento mal atingem £ 95 por tonelada - menos de metade do seu valor na altura da publicação dos decretos-leis.
Com ,o café, que mantém o seu valor internacional, as coisas passaram-se diferentemente. Aqui o Estado, na verdade, cobrou o seu imposto, mas a exportação baixou consideràvelmente.
Nos primeiros dez meses dos anos de 1948 a 1951 a exportação foi, em média, de 38 570 t; em 1951 foi de 49 070t e em 1952 de 37 8501. É que as reacções de Ioda, a ordem, provocadas pela política de sobrevalorização, parecem não ter limites. Não me alongarei, porém, - a citar mais factos.

O Sr. Mário de Figueiredo: - O que eu desejava é que V. Ex.ª fizesse o favor de esclarecer isto: se apreendi bem, das considerações de V. Ex.ª resulta que a exportação baixou e que os preços baixaram por efeito do decreto. Entendi bem?

O Orador: - Em meu entender, existe uma relação entre o novo imposto e a redução da exportação do café.

O Sr. Mário de Figueiredo: - Que os preços no mercado internacional baixaram, não há dúvida alguma. Mas o que desejam é que V. Ex.ª esclarecesse isto: se supõe que haja unia relação de causa para efeito entre o decreto que organizou o sistema de tributação, a baixa de preços no mercado internacional e a baixa de exportação.