750 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 210
Direitas de exportação, fixos ou progressivos, impostos de rendimento ou outros desta natureza suo compreensíveis e nunca encontraram por parte daquelas populações a reacção que a nova modalidade tributária provocou.
Falo à vontade neste assunto porque não tenho em jogo, interesses materiais a defender. Não sou exportador de géneros coloniais nem tão-pouco estou interessado na produção de produtos abrangidas pelo decreto. Sou um velho colono e um bem intencionado, e como tal não só procurei dar o meu honesto contributo na apreciação do decreto quando foi discutido nesta Assembleia, como segui depois atentamente a sua aplicação prática no período experimental que de então até ao presente tem decorrido.
Pude, assim, verificar que aqueles receios que dominavam o meu espírito vieram, infelizmente, a traduzir-se em realidades. Com efeito, vimos concretizar-se a queda das cotações nos mercados externos, de que resultou não ter sido por ele abrangida a maioria dos produtos que foram sujeitos ao seu regime; presenciámos um desfalecimento geral das iniciativas particulares, que, em grande parte, contribuiu para agravar o estado de crise que se mostra latente em Moçambique e de que é índice claro a quase paralisação das transacções comerciais.
No que respeita a esta província apenas um produto foi praticamente abrangido no período da. experiência: a castanha de caju. Produto, na sua quase totalidade, de cultura dos indígenas, exportado para a índia.
Como eu já aqui havia previsto, foram os indígenas que no final pagaram os poucos milhares de contos, talvez uns 5 000, até agora arrecadados pelo Governo.
As cotações do sisal baixaram para cifras que mal compensam, se é que Compensam, os custos de produção. A sua cotação, que antes da desvalorização da libra (1 de Setembro de 1949) era de 9.600$ C. I. F. e antes da guerra da Coreia (Junho de 1950) era dei 10.400$ C. I. F., subiu durante o ano de 1951 para 20.000$, tendo, porém, atingido, no fim de Dezembro de L952, o preço ruinoso de 7.500$!
O chá atravessa também uma grave crise, que não se sabe até onde poderá arrastar esta cultura.
A copra, sujeita às mais bruscas oscilações, impossíveis de prever e controlar, teve um ano de 1952 nitidamente desfavorável, pois a sua cotação chegou a cair para 4.600$ C. I. F., preço este insuportável para a produção.
Agora, felizmente, as cotações tiveram apreciável melhoria, mas nestes últimos dois meses os produtores já têm tido os seus lucros de venda cerceados com a aplicação do Decreto-Lei n.º 38704.
Assim, se para aqueles dois produtos (sisal e chá) a expectativa da incidência do decreto, quando um dia melhorarem as cotações, os desencoraja e desanima, quanto à copra, que já está a pagar as taxas sobre uma suposta sobrevalorização, vive-se a situação iníqua de os seus produtores não poderem beneficiar integralmente, como seria legítimo, dos preços actuais para com eles se ressarcirem das «menos valias» que suportaram e para as quais não receberam qualquer compensação.
É no meio deste panorama, Sr. Presidente, que as actividades económicas de Moçambique vivem e sentem os princípios do decreto em discussão. E, porque tal decreto, na sua concepção e na sua forma, ignora as épocas difíceis, para só considerar as de prosperidade, esquecendo ainda que foi com os lucros obtidos nas épocas de prosperidade que se levou a cabo a obra de que todos nos orgulhamos, não posso deixar de mais uma vez manifestar o meu desânimo perante a confirmação desta inovadora medida.
A Câmara Corporativa, no seu parecer, deixa perceber que compreendeu e que quis acautelar muitas das dúvidas e sugestões que foram levantadas durante o debate travado quando da discussão do Decreto n.º 38 704. Compreendeu e acautelou efectivamente algumas dessas dúvidas, pois não só aconselha a banir o capital de fomento e povoamento, como aconselha a abolir também a distinção entre produtores-exportadores e comerciantes-exportadores.
Subsiste, porém, a ideia da sobrevalorização - ideia que, como já referi, não se coaduna com a maneira de sentir da gente da actividade privada do ultramar, exactamente porque não assenta em razões concretas e reais. Tributar sobre lucros de exploração efectivamente apurados é coisa que todos compreendem, mas tributar sobre hipotéticos excessos de lucro é coisa que só forçadamente pode ser compreendida e de boa vontade aceite.
O produtor, o comerciante, o industrial só no fim de cada ano podem saber qual foi o lucro obtido na sua exploração; a nova forma de tributar parece esquecer que só é lucro o que se obtém no apuramento final das contas do exercício, e não aquele que, periodicamente, pode ser alcançado em certas e determinadas transacções comerciais. Há ainda a notar que são poucos os produtores do ultramar que se dedicam à monocultura.
Aqui também a nova modalidade de imposto pode conduzir a graves riscos para o contribuinte, pois pode muito bem suceder que aquele que obteve em certo momento um preço favorável para um produto da sua exploração verifique na mesma ocasião uma quebra na cotação de outro. É caso corrente em Moçambique as empresas serem simultaneamente produtoras de sisal e copra. Enquanto que um dos produtos dá presentemente prejuízo na exploração, o outro serve, sem dúvida, para compensar.
Mas com o novo imposto este aspecto do problema não é considerado assim, como também não o é para os comerciantes que adquiriram certo produto a determinado preço, em certa ocasião, com vista à execução de um negócio a prazo. Este negócio, o mais corrente no ultramar, terá de desaparecer, uma vez que o comerciante não pode correr além do risco próprio da transacção ainda aquele que lhe poderá advir se na altura da exportação a cotação tiver subido.
Poderia citar muitos exemplos demonstrativos dos inconvenientes desta forma de tributar. Não vale a pena insistir em detalhes, já que basta a linha geral para mostrar o panorama e a impraticabilidade do disposto no artigo 1.º do decreto em discussão.
Mas, além do aspecto económico, há que olhar para o político. Quanto a este. Sr. Presidente, não me alongo em considerações, exactamente porque sou de opinião que um tal sistema de tributação leva, inevitavelmente, ao desânimo todos aqueles que vinham fazendo investimentos em África, isto porque o sistema não oferece garantias de estabilidade nem deixa à iniciativa privada aquele mínimo de liberdade que tanto serviu para se fazer tudo quanto se tem feito.
Pelo exposto, Sr. Presidente, não dou o meu voto ao artigo 1.º do decreto.
Quanto ao § único, Sr. Presidente, apenas desejo esclarecer a Assembleia que os preços a que se refere são preços de favor, inferiores não só às cotações dos produtos, mas até, em alguns casos, ao seu próprio custo de produção.
Quero, agora, apenas frisar que um produto de Moçambique, a copra, tem no momento presente a cotação mundial de 6.800$ C. I. F... e, no entanto, foi-lhe fixado oficialmente, para a venda na metrópole, o preço de 4.000$ C. I. F. Mal iria se ainda tivesse de pagar taxa de sobrevalorização.