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7 DE DEZEMBRO DE 1054 135

correr pêlos caminhos do Mundo -, tem neste tratado a consagração da sua longa vida de semeador de terras virgens, de abridor de caminhos ínvios, de iniciador dos cristãos atrevimentos. E essa consagração radica no reconhecimento de uma herança indesmentível, floresce numa afinidade de cultura e de interesses, projecta-se com relevo acentuado no quadro da vida internacional, como exemplo de capuz entendimento e de amizade subsistente no respeito das soberanias e no amor da verdadeira paz.
A Câmara há-de permitir-me que declare e fundamente, a meu modo, o sentido positivo deste importante instrumento de direito internacional, que insere rasgadamente na esfera do Mundo a comunidade luso-brasileira. Eis a realidade autêntica por testemunho solene e a resultante duma expressão histórica inconfundível. Portugal e Brasil asselaram-na desde a hora que em Porto Seguro fundearam as naus do capitão-mor Pedro Alvares Cabral, e o escrivão da armada, coutando o «achamento da terra nova», dizia estar ali a promissora «pousada para essa navegação de Calecute...».
Assim, na expressão daquela idade, os nossos velhos, cheios de experiência e dotados duma sensibilidade muito aguda, tinham já consciência clara do enlace da sua missão histórica com o destino da terra novamente achada.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Três séculos de vida comum foram o estímulo promitente do Tratado de Amizade e Consulta, mas não esqueço que desde o reconhecimento da independência do Brasil nenhuma causa ou motivo tem havido para que não contemos esse quase século e meio como de fecunda compreensão, inalterável respeito e lealíssima amizade, como é de razão entre pessoas da mesma família.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Quando pensamos nesse facto singular de nenhum brasileiro ou português se sentir estranho neste ou no outro lado do Atlântico, à razão nos acode a causa profunda de tal singularidade. Qual há sido a nação que tenha entregado o dom total de si mesma a quase meio mundo ocupado por outra nação irmã da sua? Quem se arrojou a tamanhos pensamentos, quem contribuiu mais para a civilização do globo, quem com maior desvanecimento dividiu a sua herança espiritual? Que povo, que nação P Quatro séculos e meio de bom sangue que se permeia, e nas raízes novas se opulenta, fala na gente onde quer que a gente fala, e, por isso, nem a terra é dessemelhante, nem a língua diferente, nem a crença diversa, nem a gente estrangeira.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - A Câmara certamente está pensando na significação mais extensa do tratado que foi presente à sua consideração, isto é, como dos princípios contidos nas suas disposições se pode extrair uma consequência de maior amplitude na ordem universal.
É bem sabido como no Mundo actual as nações cujo nascimento e formação se fez à sombra do cristianismo persistem em afirmar os princípios morais que tradicionalmente regiam o convívio dos povos, e formam blocos poderosos para sopesar o poderio material e a força daquelas que ideologicamente abandonaram todas as preocupações morais na sua vida interna e na ordem internacional, para consecução dos seus fins de domínio e sujeição dos povos. Uma das maiores violências dos nossos dias é esta que leva as nações a reforçarem-se na sua carcaça de aço e a experimentarem

Aquelas invenções, feras e novas
De instrumentos mortais

de que falava o Poeta. Foi tempo em que a consciência universal se erguia numa protestação violenta contra aqueles que, acesos em ódio e vingança, adoptavam os métodos de divisão da república cristã, buscavam alianças onde a fé o proibia e as convicções políticas o não determinavam.
O nosso tempo reincidiu gravosamente nessa linha de conduta política e moral, ganhou em força e potência material menos e bem menos do que perdeu em valores espirituais. Já a razão não tem comedimento, a ambição não tem limite, a palavra dada não merece respeito - só a força toma o lugar da espada na balança do que ousam proclamar justiça internacional. Quanto esqueceram os que reinam e os que legislam no concerto internacional! Não é com eles a equidade nem a prudência, e vão corrompendo os caminhos com a sua boca de duas línguas. Pois o espírito que inspirou o Tratado de Amizade e Consulta desconhece essa via tortuosa e má e, desviando-se daí, proclama que laços de sangue, unidade de língua, património espiritual comum, respeitáveis e legítimos interesses económicos são o substrato vinculador duma comunidade destinada a resguardar o amplo sentido da política de solidariedade ocidental, ia a dizer cristã.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Na realidade, esta política de solidariedade ocidental é um dos imperativos dos tempos actuais e uma das poucas razões, se não a única, para acreditar e esperar que não deflagre neste pobre Mundo a causa da sua última ruína e desolação, o que Deus não permita.
Aos desprevenidos e pouco atentos poderá parecer-lhes que este acordo não representa mais do que um acontecimento feliz e altamente expressivo na vida de dois povos irmãos. Mas, se considerarem as realidades da vida internacional, as contingências e a gravidade dos problemas que estão postos no grande palco do Mundo, e principalmente, o que no futuro pode surgir do recesso das chancelarias, hão-de compreender o alcance duma política que dispõe nas duas faces do mar atlântico dos postos e garantias de sua defesa e sobrevivência.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Já no século XVII um rei de Portugal, cuia clarividência e prudente sagacidade deram à sua política atlântica o rumo exacto dos caminhos do Brasil, encontrou ao hábil jogo dos interesses espirituais e materiais de ambas as praias desse mar, tão conhecido nosso, os motivos duma segurança comum e duma perenidade fraterna.
Não desconheceram esses factos os negociadores do presente tratado, nem desaprenderam a lição do passado, tão incisiva, tão pertinente, tão digna de encontrar quem a retomasse com realismo e veracidade Como muito bem se acentua no douto parecer da Câmara Corporativa, o Tratado de Amizade e Consulta entre Portugal e Brasil não é «uma ficção sentimental», é um acto de criação política, uma realidade internacional, cujas consequências muito velho não será quem as possa aperceber «m toda a sua amplidão e magnitude.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Os Ministros Vicente Rao e Paulo Cunha acentuaram isto mesmo, ao dizer que uma polí-