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132 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º57

téria de política internacional. Está em perigo a liberdade dos povos e a própria sobrevivência das nações. E, mais do que isso, esta ameaçada a civilização ocidental e cristã e o conjunto dos seus valores espirituais. Ë natural que, perante perigos que ameaçam a existência e a estrutura de princípios e instituições comuns, Portugal e o Brasil procurem, cada vez mais, consultar-se e entender-se. A atitude brasileira perante a injustificada agressão à nossa soberania da índia -e que tão grata foi ao espírito e ao coração de todos os portugueses - é bem uni índice da íntima e profunda solidariedade que hoje une as duas pátrias e que se procura precisamente consagrar através do instrumento diplomático em discussão.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Considero como a disposição de maior projecção do tratado aquela pela qual, e salvo as limitações constitucionais, Portugal e o Brasil se obrigam a conceder aos nacionais da outra parte o mesmo tratamento que dão aos seus próprios nacionais, quer na ordem jurídica, quer nas esferas económica e cultural. Não podendo, uma vez o tratado em vigor, conforme afirmou o Prof. Doutor Paulo Cunha, actual Ministro dos Negócios Estrangeiros, a quem daqui presto as minhas homenagens pêlos altos serviços que vem prestando ao País,...

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - ... ser considerados estrangeiros os Portugueses no Brasil e os Brasileiros em Portugal, adopta-se uma fórmula que se aproxima da dupla nacionalidade.
Este problema da dupla nacionalidade tem sido objecto de larga discussão, em face das leis e da doutrina, e oferece aspectos especiais no tratado presente à aprovação da Assembleia Nacional.
Já se definiu a nacionalidade como a relação de direito que une um indivíduo a uma colectividade humana chamada estado, relação que impõe a ambas as partes um certo número de obrigações, nomeadamente ao indivíduo a da fidelidade e ao estado a da protecção.
Os deveres do súbdito, nacional ou cidadão de um país, para com o estado são definidos na constituição ou na lei e comportam, em regra, o serviço militar, o pagamento de impostos, a abstenção da prática de certos actos e, numa palavra, uma atitude fiel e leal para com a pátria.
Em compensação, como diz Dufour, o estado concede aos seus nacionais uma determinada protecção no seu território e, na medida do possível, fora dele.
Em regra, cada pessoa só tem uma nacionalidade, mas, no mundo actual, são numerosos e frequentes os casos de indivíduos que têm duas e, por vezes, múltiplas nacionalidades.
De uma maneira geral são circunstâncias independentes da vontade do indivíduo que o vinculam a dois estados. Estes são soberanos e, quando duas soberanias se encontram em presença, não ha razão para que uma ceda à outra. E daí, em grande parte, as duplas nacionalidades.
Na Europa, geralmente, a nacionalidade transmite-se por hereditariedade de pai para filho. Na América, ao contrário, o lugar de nascimento prefere à paternidade.
O problema que se põe mesta matéria é o de saber se, ao lado da dupla nacionalidade, de natureza individual e consequência de um conflito de leis internas, há a possibilidade de uma dupla nacionalidade de carácter colectivo e resultante, não de um antagonismo de legislações, mas, pelo contrário, de um acordo de estados.
A corrente tradicional da doutrina que considera a soberania do estado como um poder total e exclusivo sobre o cidadão manifestava-se absolutamente pela negativa.
Cícero havia já dito: «pelo nosso direito a ninguém é permitido ter duas cidadanias»; e Proudhon, muitos séculos mais tarde, mas fiel à mesma ideia, havia de afirmar que, se nada podia ter uma dupla maternidade, ninguém podia também ter duas nacionalidades.
Apesar desta intransigência doutrinal, a história oferece exemplos de comunidades, mais ou menos extensas, em que os nacionais ou cidadãos de determinadas nações ou cidades gozam, embora, por vezes, com restrições, de duplos direitos de cidadania ou nacionalidade.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - O exemplo mais antigo desta espécie de comunidade é nos dado pelas cidades da antiga Grécia. Como já se escreveu, nada existe no mundo moderno que possa comparar-se ao hermetismo e à coesão das antigas cidades gregas, baseados em vínculos religiosos e numa concepção superindividual da cidade. Havia o culto dos deuses e o amor das armas, e cada cidade, como já se escreveu também, era defendida por muralhas jurídicas e políticas mais difíceis de transpor que as muralhas de pedra que as protegiam. Apesar disso, as cidades gregas conferiam, por vezes, o direito de cidadania aos membros de outras cidades, em consequência de negociações recíprocas ou por virtude de alianças políticas. Mas é incontestável que, admitindo a co-existência de cidadanias, efectivavam, sob certo aspecto, o princípio da dupla nacionalidade.
Tem-se apontado o direito romano como adverso à teoria da dupla nacionalidade, mas há quem afirme que, a partir de uma certa altura, parece indiscutível que os estrangeiros que adquiriam a cidadania romana conservavam a sua cidadania primitiva, de modo que, entre as melhores famílias gregas das cidades e os maiores proprietários de terras, poucos eram os que não possuíam, além da própria, a cidadania romana.
A Idade Média teve as suas características próprias. Pode dizer-se que este período da história foi dominado por uma outra espécie de comunidade: a comunidade de religião e de cultura de que faziam parte todas as nações cristãs.
Os países muçulmanos oferecem também um exemplo de comunidade, baseado em vínculos religiosos. Cada muçulmano é súbdito de determinado soberano, mas, simultaneamente, é membro da comunidade islâmica.
Nos tempos modernos o caso mais típico de dupla nacionalidade é o que oferece o Império Britânico. Já em 1911, na Conferência Imperial Britânica, se declarou que a nacionalidade imperial devia ser geral e uniforme, embora cada colónia ficasse livre para conferir uma nacionalidade de carácter puramente local. Esta ideia evoluiu depois e, actualmente, um súbdito britânico, quer da Austrália, do Canadá ou da Nova Zelândia, pode ter duas nacionalidades diferentes, cada uma com o seu conjunto de direitos e deveres e cada uma se adquirindo e perdendo de maneira diversa.
Estas exemplificações demonstram que, através da história dos povos, têm existido comunidades de raça e de cultura mais extensas que os estados. Apesar disso, continuam a existir correntes doutrinárias que negam ou contrariam, quando não podem negar, a dupla nacionalidade e outras que a defendem e demonstram até