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9 DE DEZEMBRO DE 1954 163

vorecida», reivindicando assim liberdade de movimentos nas eventuais negociações a realizar com o Brasil. Deste passo, o Governo de Salazar consignava o Brasil como uma constante da sua política externa e trabalhava pacientemente para criar as condições que lhe permitissem realizar com o Brasil um acordo original, diferente das modalidades tradicionalmente seguidas, e por meio dele assegurar, com reciprocidade, o direito de os portugueses que vivem e trabalham no Brasil poderem continuar ligados à Pátria-Mãe, sem que para tal tivessem de sofrer quaisquer prejuízos morais ou materiais, nem que se vissem compelidos a abandonar a sua verdadeira nacionalidade.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - O Tratado de Amizade e Consulta Luso-Brasileiro, que estamos apreciando, resolve, no seu artigo 2.°, completamente a dificuldade, dá inteira satisfação às legítimas aspirações da nobre e grande colónia de portugueses no Brasil e acautela, assegura e defende os reais interesses da grande nação irmã.
Com efeito, a redacção deste artigo é a seguinte:

O tratamento especial consignado neste tratado abrangerá, não só os portugueses que tenham o seu domicílio no território brasileiro e os brasileiros que o tiverem em território português, mas também os que neles permaneçam transitòriamente.

Não são apenas os portugueses que vivem no Brasil que ficam com novas regalias. Elas são extensivas aos portugueses ou brasileiros que transitoriamente permaneçam em qualquer dos dois países, e ainda se foi mais longe, estipulando no artigo 6.° que os benefícios que porventura venham a ser concedidos no futuro a qualquer estrangeiro «consideram-se ipso facto extensivos nos nacionais do outro».

Não estamos, por consequência, em presença de uma aplicação de cláusula de nação mais favorecida, mas na criação de uma nova figura internacional: a do estatuto anais favorável.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Fosse o novo tratado apenas o reconhecimento de uma situação particularíssima entre Portugueses e Brasileiros, ou a expressão simbólica de um passado comum, e já teria um alto significado.
Trata-se, porém, de uma construção inédita entre as fórmulas tradicionais que regulam o bom entendimento entre os povos, e tanto bastaria para que a Assembleia lhe desse o seu inteiro e entusiástico apoio.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Mas, Sr. Presidente, o tratado é muito mais, e são de excepcional transcendência política os seus objectivos.
Duas nações soberanas, com vida independente mas interesses afins, unidas por uma história comum, por interesses espirituais, morais, étnicos e linguísticos, reconhecem que têm a defender esse património comum e dispõem-se a formar uma grande comunidade: a comunidade luso-brasileira - com territórios espalhados pelo Mundo que excedem 10 milhões de quilómetros quadrados e cerca de 70 milhões de almas e cujo «progresso, harmonia e prestígio cabe a ambas as nações defender e tornar cada vez maior, como sagrado dever de ética comum e como imperativo dos seus interesses recíprocos», na lúcida interpretação do Prof. Dr. Paulo Cunha, nosso ilustre Ministro dos Negócios Estrangeiros.
Assim, o tratado, como o interpretamos, não é apenas e somente a expressão de uma amizade fraterna entre dois povos: é também mais uma nova construção jurídica de direito internacional, que, na confusa conjuntura em que presentemente o Mundo se debate, abre novas clareiras ao caminho ocidental dos dois povos, que, fisicamente separados pelo Atlântico, é no Atlântico que precisamente encontram o imperativo da sua mais íntima aproximação e de melhor entendimento.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - No seguimento de uma perfeita amizade que existe entre Portugal è o Brasil, as duas nações «concordam em que, de futuro, se consultarão sempre sobre os problemas internacionais do seu manifesto interesse comum» (artigo 1.º do tratado).
Sr. Presidente: perante o desenvolvimento das forças de divisão que agitam a época perturbada em que vivemos e põem permanentemente em risco a paz entre os povos, sente-se a necessidade da formação de grandes blocos internacionais.
As afinidades de cultura e de civilização, a mesma religião e a mesma concordância de interesses fomentam-se naturalmente dentro das soberanias nacionais; mas, para além delas, há que criar novas fórmulas de entendimento, que sejam também de maior resistência aos perigos que se avizinham.
Por isso, uma maior aproximação, uma mais perfeita compreensão de interesses afins e um melhor entendimento entre Portugal e o Brasil, criando juridicamente uma comunidade luso-brasileira, não é apenas o reconhecimento de um passado comum, mós, e sobretudo, uma nova realidade política que mergulha as raízes na tradição e numa mesma civilização e procura, através da solidariedade da mesma raça, ligar indissoluvelmente Portugueses e Brasileiros, para maior prestígio de uma e outra nação no Mundo.
Na definição do ilustre Chanceler do Brasil, o eminente Prof. Vicente Rao, que assinou o tratado em nome do Brasil, e a quem, julgando bem interpretar os sentimentos da Assembleia, dirijo as nossas mais afectuosas e gratas homenagens...

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - ... o «Brasil ultrapassou a fase do seu continentalismo e toma posições na política mundial de mãos dadas com a gloriosa nação portuguesa». Ou, na clarividente afirmação do Sr. Presidente do Conselho: «Fazendo da comunidade luso-brasileira um instrumento de política internacional de Portugal e Brasil».
Na esperança de que as realidades corresponderão com fidelidade às intenções que presidiram à elaboração do natural tratado, volvo o meu pensamento para a grande, nobre e próspera nação brasileira, a que sempre nos ligaram os mais fortes laços de amizade, cimentados pelo sangue, por uma idêntica concepção de vida, por uma só religião e por uma civilização comum - e também vive no nosso coração essa generosa e devotadamente patriota colónia dos portugueses do Brasil, que, pelo seu trabalho, pêlos seus sacrifícios, quantas vezes heróicos, pela nobreza das suas atitudes e pelas suas multiformes benemerêmcias, sempre soube devotar-se ao Brasil, nunca esquecendo Portugal, e conquistou a consideração, o respeito e a amizade dos Brasileiros, possibilitando que se materializasse em documento jurídico de excepcional transcendência uma das suas mais antigas, mais justas e mais legítimas aspirações.

Vozes: - Muito bem, muito bem!