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9 DE DEZEMBRO DE 1954 159

do Brasil a afirmar, num momento de feliz inspiração, que se aquilo que constitui uma nação é um mesmo sangue, uma mesma língua, uma mesma concepção de vida, uma mesma cultura, Portugal é Brasil, embora sejam dois estados independentes, constituem, sem dúvida,, uma só nação.

Vozes: - Muito bem I

O Orador: - Brasileiros e Portugueses têm, na verdade, o mesmo sangue: são ramos da boa cepa lusitana.
Falam a mesma língua: o idioma de Camões e de Vieira.
Têm a mesma religião: a religião d'Aquele cuja Cruz presidiu ao descobrimento e deu à terra descoberta o Seu Santo Nome.
Brasil e Portugal têm também uma história comum; e se aqui ou ali surge qualquer episódio que parece interessar apenas a um deles, constituindo uma página u parte, há que ter em vista que cada folha tem duas páginas, mas não se pode rasgar uma sem que a outra igualmente se rompa e que não há nódoa que caia sobre uma delas, sem macular da mesma forma a outra.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - A fraternal amizade que une os dois povos tornou-os sempre solidários perante o Mundo, e assim é que, na vida internacional, Portugal e Brasil sempre aparecem agindo no mais perfeito entendimento.
Entendimento natural e espontâneo, e não preparado ou concertado sob o influxo das conveniências de momento, e é isso que dá razão a um ilustre professor brasileiro quando afirma que a comunidade luso-brasileira é, entre todas, a mais pacífica, a mais espiritual, a mais humana.
Portugal e Brasil sempre se encontraram juntos nos momentos marcantes da sua vida. Alinharam do mesmo lado nas grandes conflagrações mundiais. E, nas desgraças ou tristezas que atingiram qualquer deles, como nas horas de alegria e felicidade, sempre apareceu o outro a compartilhar fraternalmente da desventura ou do regozijo do povo amigo.
Isto, porém, sucedia naturalmente, espontaneamente, sem convenção alguma que a tal obrigasse.
O tratado em discussão vem enunciar solenemente essa solidariedade, vem consagrar num instrumento diplomático essa feliz e reconfortante realidade, vem proclamá-la ao Mundo inteiro.
Benvindo, pois, seja ele!

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Não se limita, porém, a uma simples e abstracta afirmação, já de si importante e inegavelmente oportuna.
Vai mais longe: estabelece para os estados contratantes a obrigação de se consultarem sobre todos os problemas internacionais de interesse comum.
Não é a vaga enunciação de um desejo, nem a simples proclamação de um propósito: é um compromisso solene que se assume.
Do maior interesse e significado se me afiguram também as cláusulas que respeitam ao tratamento especial que coda um dos estados contratantes passa a conceder aos nacionais do outro.
O Brasileiro deixa de ser estrangeiro em Portugal, como o Português deixa de ser estrangeiro no Brasil.
A equiparação do estatuto jurídico dos residentes do país irmão ao dos nacionais, sendo a prova mais cabal 4o completo entendimento que entre nós existe, constitui um admirável exemplo, que ao Mundo damos, de uma desinteressada e perfeita amizade, que se- traduz em actos e concessões importantes.
E o artigo 5.°, permitindo a livre entrada e estabelecimento de domicílio dos nacionais de um país no outro, contribuirá decerto para o fortalecimento da identidade de sentimentos e aspirações, que é a base da comunidade luso-brasileira, a que o destino reserva um futuro glorioso e nobre.
São mais de 70 milhões de indivíduos, unidos pelo sangue, pela história, pela língua e pela religião, dispondo de territórios- ricos e prometedores, com uma superfície superior a 10 milhões de quilómetros quadrados, constituindo um bloco homogéneo e poderoso, que há-de forçosamente pesar na balança dos destinos do Mundo.
É um factor que se nos afigura, se não decisivo, pelo menos de grande eficiência para ajudar a civilização cristã a vencer a crise em que presentemente se debate, ameaçada de novo pêlos bárbaros do Oriente e enfraquecida pela ingenuidade de alguns, pela hesitação de outros e pela desorientação (passe o paradoxo) de grande parte dos seus mais valiosos elementos.
Dou, pois, com o maior agrado, o meu sincero aplauso ao Tratado de Amizade e Consulta, apenas lamentando que o nosso Regimento nos não permita votá-lo por aclamação, como certamente todos nós desejaríamos.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

Nesta altura voltou a ocupar o seu lugar na Mesa o Sr. Presidente Albino Soares Pinto dos Heis Júnior.

O Sr. Carlos Mantero: - Sr. Presidente: não posso deixar de me recolher com humildade perante a grandeza nacional do acontecimento que hoje aqui se vai passar: a ratificação do Tratado de Amizade e Consulta entre Portugal e o Brasil.
A Assembleia Nacional vai ligar a sua responsabilidade de órgão da soberania ao instrumento diplomático de significado mais transcendente da nossa história contemporânea.
Coube ao Governo presidido pelo Prof. Oliveira Salazar a honra de, por Portugal, dar forma jurídica a comunidade luso-brasileira, numa antevisão genial do mundo futuro.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Nasceu para o Mundo uma grande potência, cujo peso será cada vez maior no concerto das nações, no Conselho dos «Grandes».
Soou a hora do resgate da latinidade, diminuída na pulverização dos estados e na desintegração dos ideais.
A comunidade luso-brasileira veio ocupar na organização do mundo moderno um lugar que estava vago: o lugar de grande potência latina.
E da ratificação do tratado que a cria que à Assembleia Nacional, por direito constitucional, foi chamada a ocupar-se.
A unanimidade de opiniões e sentimentos é tão manifesta no País, quanto à oportunidade do tratado e aos princípios que o informam, que a ratificação tomará, sem dúvida, a forma de uma verdadeira consagração.
A discussão dará, porém, oportunidade à Assembleia para expressar o seu pensamento quanto aos princípios informadores do tratado e quanto ao seu significado como instrumento da política nacional.