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216 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 62

O Sr. Amaral Neto: - Sr. Presidente: pedi a palavra para tratar de um assunto que, a quantos tenham da evolução das circunstâncias apenas uma noção superficial, do que se fala e do ouvir dizer, pode parecer apresentado impertinentemente, senão quanto ao objecto, pelo menos quanto a oportunidade; no entanto, Sr. Presidente, abordo-o com a plena consciência, que é assunto bem digno de ser tratado neste período de antes da ordem do dia, com o objectivo regimental de chamar a atenção do Governo para matéria de interesse público.
Quero referir-me à necessidade de se estabelecer, em bases amplas e efectivas, um sistema de medidas de fomento da subericultura, quero dizer, da protecção da cultura do sobreiro como elemento produtor da cortiça.
Quem apenas partilhe das noções mais comuns sobre a valorização desta matéria, e assim saiba somente que os seus preços, em poucos anos, subiram da estagnação mal explicável e aviltante de um demasiado longo marasmo para a actualização dos antigos valores e para já excederem esta, pode perguntar se o tema é oportuno, se as meras cotações actuais não são já de si factores bastantes de incitamento e fomento da cultura do sobreiro; a esses poderá parecer ocioso que se fale em fomento da produção duma matéria-prima que no interesse comercial parece encontrar todos os incitamentos.
A história, todavia, das flutuações dos valores da cortiça nos últimos três ou quatro decénios, por vezes tão incompreensivelmente afectadas por condições de guerra como por condições de paz, explica que poucas sejam as pessoas dotadas de coragem, não digo já da previsão necessária, para pensar em investir capitais e esforços, a largo prazo, no aumento da produção suberícola.
Mas, Sr. Presidente, todos sabemos que a cortiça é hoje o segundo esteio da balança económica e que, se amanhã esse esteio derruir, ninguém neste pais deixará de sentir o peso da sua queda, da sua desvalorização, porque, desde o aço ao açúcar, das máquinas aos medicamentos, do pão ao petróleo, tudo se poderá tornar mais difícil de adquirir no estrangeiro se quebrar o valor da cortiça que temos para lá vender.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: Ora, Sr. Presidente, é notório, para quantos se debruçam sobre este assunto, que o grande incremento da produção corticeira deste pais, porventura filha dos desbravamentos das charnecas alentejanas nos fins do século passado e princípios deste, e ultimamente fruto, quiçá o mais proveitoso, do desenvolvimento da campanha do trigo nas regiões do Alto Alentejo, mostra sinais de parar e, possivelmente, de mudar de sentido. Em muitas regiões é já pouca a renovação dos montados e sensível o definhamento das árvores adultas.
Vem isso de muitas circunstâncias; algumas delas resultantes dos próprios modos de exploração dos solos, que fazem surgir motivos de fortes divergências de graves dúvidas entre os cientistas e os práticos da cultura suberícola.
Afirmam os mais atentos observadores do problema, os mais dedicados estudiosos da vida dos sobreiros, que contribui para o seu aniquilamento ou quebra das boas condições de vida a destruição do mato, da manta vegetal que conserva a humidade no terreno, defende as raízes dos ardores do sol e mantém coeso o próprio chão. Pensam, todavia, os práticos da exploração, pelo que se lhes patenteia aos olhos, que a lavoura regrada, seja das encostas, seja das chãs, proporciona às árvores um revigoramento e engrossa-lhes a cortiça, em termos de plenamente defenderem a sua prática.
Só a experimentação conduzida ao longo de anos e com cuidado poderá permitir verificar qual dos dois sectores tem razão, mas isso ainda não se começou, e eis um dos aspectos da necessária assistência técnica & agricultura portuguesa.
No entanto, da solução das dúvidas que se levantam em torno da questão depende em muito o futuro da cortiça, que representa hoje 27 por cento do valor da exportação portuguesa!
Digam-me VV. Exas. se é ou não este um problema de interesse nacional !

Vozes: - Muito bem !

O Orador:-Dum outro lado vemos indústrias que, apesar de terem conseguido a reserva para si do máximo da produção nacional, não encontram, todavia, quantidades suficientes para fazer trabalhar as suas máquinas a pleno rendimento e atenderem todos os seus clientes. Ora, se a exploração do sobreiro em regime de talharia, com vista à produção de cortiça virgem, há tanto tempo já proposta e preconizada como forma rendosa de aproveitamento de muitos terrenos, tivesse sido experimentada mais a tempo de se generalizarem e aproveitarem já hoje as conclusões da sua experiência, poderíamos dar agora a alguns milhares de portugueses melhores garantias sobre o futuro do seu trabalho e o destino das suas empresas.
Estes dois apontamentos, quase ao acaso, para destacar como a adequada experimentação, com vista ao esclarecimento de graves problemas do momento ou de sempre, é tão urgente e importante neste campo como, aliás, em muitos outros do espaço económico nacional.
Temos, por outro lado, de considerar que não apenas nas zonas latifundiárias do Sul do Tejo se encontra o sobreiro.
Na verdade, quase uma quarta parte da produção nacional de cortiça é colhida no Centro e no Norte do País, onde, como por todo ele, os sobreiros encontram habitat favorável.
São aí árvores dispersas ou em pequenos grupos, exploradas até à ruína, árvores que é necessário proteger, ensinando aos donos das terras a melhor maneira de promover a sua exploração com bom resultado; e árvores cujo número importa multiplicar, seja por diligência do Estado nas áreas do sen repovoamento florestal, seja por diligência dos particulares incitados e instruídos pelo exemplo e ensinamento do Estado.
Porque a exigência não é só a de conservar os sobreiros existentes, acarinhando-os e defendendo-os para vida mais longa e produtiva; é, acima de tudo, a de aumentar a produção.
O próprio apetite demonstrado pela continuada valorização - em que seria injusto não reconhecer o efeito de esforços inteligentes e bem orientados da Junta Nacional da Cortiça e a boa visão de quem lhe tem presidido às actividades -, esse mesmo apetite nunca satisfeito, apesar da alta dos preços, antes constantemente exarcebado por novas encomendas, demonstra que a cortiça triunfa sobre todos os concorrentes, continua a revelar-se superior a todos os centenares de sucedâneos que mais ou menos passageiramente lhe opõem e é matéria-prima indispensável à vida económica moderna.

Vozes: - Muito bem !

O Orador: -E se no seu futuro pesam as duas incógnitas das funções dos preços e das funções do abastecimento, é necessário que nunca seja por defeito deste que algum dia possamos ter de queixar-nos da perda de tamanha riqueza.
Pois se os países de máximo potencial económico não desdenham de se esforçar por criarem sobreiros nos