282 DIÁRIO DAS SESSÕES N. 65
- limite, justo e de aplicação prática possível (300.000$) - e não se estabeleça o limite de 200.000$ para os acidentes resultantes de casos fortuitos, pois a distinção entre casos fortuitos inerentes e não inerentes ao funcionamento do veículo parece-nos ilógica, injusta o imoral, deixando-se no juiz a apreciação da forma como se deu o acidente e a graduação da indemnização a atribuir.
5. A redacção deste número já dá origem a dúvidas e a interpretações diferentes.
Para uns, o sistema preconizado é idêntico ao estabelecido no diploma anterior, pois refere-se a «proprietários dos veículos... causadores de acidentes». Ora, nos termos gerais do direito, só é causador de um acidente quem for responsável pelo desastre nos termos do Código da Estrada.
Esta interpretação é confirmada pela referência à responsabilidade das sociedades de seguros, que se refere expressamente ao «artigo seguinte» - 57.º - o qual, cita «as pessoas civilmente responsáveis». Isto significa por certo que os encargos hospitalares serão suportados pelo responsável do acidente.
Porém, segundo outros, este número estabelece um princípio novo no que diz respeito ao pagamento das despesas com o tratamento dos sinistrados em resultado dos acidentes de viação, princípio esse segundo o qual os proprietários de veículos ou animais são sempre responsáveis por aquelas despesas, quer tenham ou não efectiva responsabilidade no sinistro, tendo apenas o direito de regresso pelas ditas despesas contra os comprovados causadores do acidente.
Se assim é não podemos deixar de considerar o sistema altamente injusto, pois contraria ate o disposto no artigo 56.º, que admite como excepção à obrigatoriedade de indemnização os casos em que o acidente seja imputável ao terceiro ou resulte de força maior estranha ao funcionamento do veículo.
De facto, não existe qualquer fundamento jurídico ou moral para exigir dos proprietários dos veículos, ou das companhias de seguros, o pagamento efectivo dos encargos médicos e hospitalares sem que se prove, primeiro, que a responsabilidade de tais pagamentos lhes compete, nos termos e segundo os princípios do próprio Código da Estrada.
Os hospitais, os médicos e outras entidades têm sempre a possibilidade de receber dos verdadeiros responsáveis e pelas vias legais competentes as importâncias a que têm direito, mesmo quando os responsáveis sejam as próprias vítimas ou terceiros.
E quando, por insolvência dos responsáveis, seja impossível obter o pagamento não há nenhum princípio jurídico ou moral que possa justificar a exigência do mesmo a quem se reconheceu não ter qualquer responsabilidade no caso. Se o mesmo pagamento é considerado de assistência, parece que é aos hospitais que compete prestá-la, indemnizando-os o Estado das despesas em que incorrerem, visto que a assistência constitui encargo de todos e não somente dos que utilizam veículos e meios de transporte.
Não se compreende porque razão é que um indivíduo que distraidamente vai embater num candeeiro de iluminação pública, e se fere, pode ir aos hospitais receber tratamento sem pagar, se não tem meios para isso, e no caso de distraidamente ir embater num veículo, que podo até estar parado na via pública, já não tem direito a essa assistência gratuita.
Julgamos, por isso, que é de manter o sistema anterior, pois nele há, indiscutivelmente, um princípio de justiça que consiste em, através da possibilidade de contestação do devedor, se procurar determinar quem foi, de facto, o causador do acidente.
6. Concordamos com a inovação emitida neste número mas parece-nos que, para que dela se possam tirar todos os benefícios, seria de exigir, sempre que se possa identificar o presumível responsável pelos pagamentos, que os directores dos hospitais ou estabelecimentos similares, dependentes ou não de organismos do Estado, onde se recolham ou recebam tratamento quaisquer vítimas de acidentes de trânsito, deveriam também comunicar, dentro do mais curto prazo, a esse. presumível responsável pelo acidente a admissão do indivíduo sinistrado.
9. Adoptou-se neste número a recente jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, mas, em nossa opinião sem uma forte razão que a impusesse.
Em matéria de seguros torna-se necessário que as reclamações se apresentem dentro dum período que; permita a sua conveniente apreciação, sem que, contudo se imponha um prazo tão curto que iniba ou afecte o interessado na realização dos seus direitos.
Não pode abstrair-se da necessidade que o segurador sente do conhecimento exacto das responsabilidades que sobre si impendem.
Por outro lado, no aspecto processual, um prazo longo, como o do artigo 353.º do Código Civil, de vinte e de trinta anos, mas praticamente sempre de trinta anos fazendo com que desapareçam os elementos de prova acerca das condições em que se verificou a ocorrência inabilita que sobre ela se julgue, em condições de perfeita equidade.
Estes aspectos é que devem condicionar a regulamentação jurídica do instituto da prescrição no que respeita a indemnização por acidentes de transito.
Assim se reconheceu em França, onde a prescrição no dois anos (artigo 20.º da Lei de 0930)). na Bélgica. Onde a obrigação de indemnizar prescreve ao fim de três anos (artigo 32.º da Lei de 11 de Junho de 1874) e na Convenção de Varsóvia, que encerra princípios de certo paralelismo com o novo Código da Estrada e quino seu artigo 29.º estipula a prescrição de dois anos para a propositura de acções destinadas à efectivação da responsabilidade do transportador ou dos seus seguradores.
Se não se quer adoptar o prazo da Convenção de Varsóvia, julgamos que, pelo menos, nunca tal período de prescrição deve, sem afectar profundamente os direitos dos interessados, exceder cinco unos a contar da data do acidente de viação.
10. O problema de segurança do trânsito é um problema complexo que só podo ser resolvido com a participação e a responsabilidade de todos.
Não basta estabelecer normas de conduta e as respectivas disposições punitivas para os proprietários de veículos ou animais e para os peões. E necessário que também se estabeleça, como se faz na legislação de outros países, a responsabilidade civil e criminal, ainda que baseada no conceito de culpa, de outras entidades exercem actividades que de qualquer modo podem influenciar a segurança do trânsito.
Assim, por exemplo, a Junta Autónoma de Estradas, os empreiteiros de obras públicas e outras entidades oficiais ou particulares que tenham o dever de cuidar das vias públicas ou nas mesmas efectuem trabalhos - e que por negligencia ou culpa, não sinalizem devidamente esses trabalhos e provoquem assim acidentes - devem ser de direito e do farto efectivamente responsáveis.
Julgamos que seria muito útil e justo que. neste número se fizesse uma referência estabelecendo em letra de lei a responsabilidade de tais entidades.