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13 DE JANEIRO DE 1955 285

Começo por felicitar o Sr. Deputado por tão desassombradamente ter apontado o sombrio futuro quo espera a nossa viticultura, provocado pelo aumento de plantio em regiões nas quais nem o problema social o impunha, nem o problema da qualidade dos vinhos o justifica. Por isso, mais uma vez os meus sinceros apoiados pela oportuna intervenção de V. Ex.ª
Só não julgo apropriado ter V. Ex.ª usado o termo «privilégios» para designar alguns dos direitos reconhecidos pela legislação à região demarcada do Douro.
Sr. Presidente: a região demarcada do Douro não quer que lhe concedam privilégios! Pretende unicamente que lhe facultem os meios para poder viver e que lhe reconheçam o seu valor na economia nacional. Não se considera cumulada de privilégios por se lhe ter reconhecido o direito à vida.

Vozes: - Muito bem!

O Orador:-Sr. Presidente: a região demarcada do Douro, onde se produz o inconfundível vinho do Porto, é, pela constituição do solo. clima, etc., uma região característica de vinhos de alta qualidade. Por isso merece, a bem do interesse nacional, ser amparada, para que possa desempenhar o papel que lhe compete na economia nacional. É norma há muito seguida pelos organismos que superintendem na região (Casa do Douro e Instituto do Vinho do Porto) favorecer os vinhos de elevada qualidade em detrimento de outros de menor categoria.
Esta política faz-se principalmente sentir através das concessões de novas plantações, das autorizações do benefício, dos preços fixados, etc.
Pena é que tão sábia política, plenamente de acordo com as directrizes preconizadas pelo Comité International do Vin. não soja seguida por todos os organismos responsáveis da viticultura. Infelizmente, parece-me até que em certas regiões se tem seguido uma política totalmente oposta.
Para exemplificar permito-me citar, com a devida vénia, as seguintes palavras de um dos nossos mais distintos economistas e antigo Deputado, o Sr. Prof. Dr. Diogo Pacheco de Amorim:

É o que se está a dar entre nós com a plantação da vinha, principalmente no Sul, onde há sítios em que o milheiro de videiras, plantadas como quem planta couves, dá doze e mais pipas de vinho.
Quem faz esse plantio está a ganhar, mas com prejuízo das regiões vinhateiras tradicionais.

Sr. Presidente: possuindo o vinho do Porto características inconfundíveis, e sendo ainda largamente conhecido e apreciado nos mercados externos, ele pode vir a ser, como já foi o nosso maior valor de exportação, se, com sábias medidas de propaganda, se fomentar a sua expansão.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente: a colonização da região onde se colhe o vinho do Porto deve-se atribuir exclusivamente à cultura da vinha. Foi ela que permitiu a fixação do homem à terra. Sem ela os montes do Douro reduzir-se-iam a espessos matagais, recobrindo as vertentes dos seus profundos vales. Através de gerações a vinha, cultivada em degraus nos flancos da montanha e em terrenos extremamente ingratos, imprimiu ao homem que a cultiva traços característicos, que são: independência, rudeza de sensibilidade e inquebrantável persistência,
Parece-me vir a propósito repetir as palavras proferidas pelo Sr. Dr. Mário Bernardes Pereira, que ilustram as características apontadas:

O hábito de viver em crises económicas criou no espirito duriense certa capacidade de adaptação, que lhe permite tolerar períodos de amargura sem manifestações de indisciplina social. Teve-as quando, mais do que o perigo da miséria, sentiu a afronta. Revoltou-se em 1915, quando pretenderam vencê-lo. Abriram os cofres, queimaram os documentos das contribuições. Não atacaram ninguém. Na Régua e em Santa Marta viu-se uma multidão famélica juntar todo o dinheiro das repartições e som falta de um vintém entregá-lo totalmente à autoridade.

Ao terminar esta citação, apresento ao seu autor - intemerato defensor dos direitos do Douro - as minhas homenagens de muito apreço e admiração.
Na região demarcada a propriedade encontra-se muito dividida. Cerca do 87 por cento dos viticultores colhem menos de dez pipas o 75 por cento menos de cinco. Pode-se dizer que não existo a grande propriedade. A divisão das terras, encarada unicamente do ponto do vista económico, foi além do que seria de aconselhar.
Não existe um problema social premente, mas sim um gravo problema económico, que não permite ao lavrador e ao trabalhador do Douro auferirem aquele mínimo indispensável que lhes permita viver sem roçar pela miséria. Nenhuma região vinhateira produz vinhos tão caros e nenhuma aufere monos com a cultura da vinha.
O que acabo de apontar por si só justifica o amparo a que esta região tem jus. Se lhe retirarem esse amparo, ela cairá forçosamente na miséria e anarquia social.

Vozes: - Muito bem, muito bem !

O Orador: - Sr. Presidente: apontadas a traços largos algumas facetas dos problemas do Douro, peço novamente ao Governo:

1) Que faculte os meios para se poder fazer, em grande escala, a propaganda do vinho do Porto nos mercados externos;
2) Que se continue, nos tratados e convénios internacionais, a ter em conta a posição do vinho do Porto como um dos nossos maiores valores de exportação;
3) Que em possíveis negociações com o Reino Unido se tenha sempre em vista a conveniência da redução de direitos que incidem sobre o vinho do Porto;
4) Enquanto a exportação não retomar o volume que atingiu no período que antecedeu a última guerra, continuar a dispensar ao Douro o auxílio que lhe é devido.

Sr. Presidente: antes de terminar, quero afirmar em nome da região, e bem alto, não só para que todos os Srs. Deputados aqui presentes me ouçam, mas também para que estas palavras sejam ouvidas em todos os recantos de Portugal, que se não fosse a organização corporativa do Douro há muito ele teria naufragado na miséria e anarquia social.
Por isso está eternamente grato ao Sr. Presidente do Conselho, que, com a organização corporativa, permitiu ao Sr. Eng. Sebastião Ramires criar o edifício em que hoje assenta o comércio e produção do vinho do Porto.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.