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360 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 69

Com os Decretos-Leis n.(tm) 39 842, 39 843 e 39 844. de 7 de Outubro último, mostrou o Governo quão vivamente anda nos seus cuidados e preocupações a situação dos servidores do Estado. Ë grata satisfação aos nossos anseios a melhoria decretada?
Se o afirmássemos não diríamos toda a verdade. O próprio Sr. Ministro das Finanças, a cujo alto espírito me é grato render as melhores homenagens (apoiados), no relatório que precede o Decreto-Lei n.º 39 842 afirma com louvável seriedade e lealdade:

Não se visa propriamente com esta medida uma reforma para elevação de vencimentos, embora dela resulte alguma melhoria, mas a regularização do seu regime.
De facto, é tão modesto o aumento trazido aos vencimentos então em vigor que se torna insignificante a melhoria produzida e quase não vale a pena anotá-la.

Vozes : - Muito bem !

O Orador : - De resto, Sr. Presidente, não é o aumento de vencimentos que, só por si, resolve o grave problema. O custo da vida continua em desequilíbrio cruciante; e, enquanto se mantiver este desequilíbrio, a vida continuará a decorrer entre dificuldades atrozes para quantos vivem exclusivamente dos seus vencimentos ou salários ou da pequena e média lavoura.
Permito-me, Sr. Presidente, renovar a pergunta aqui feita há já tempo:
Será realmente justo que as rendas de casas, os artigos manufacturados e tantas outras coisas necessárias à vida persistam em manter-se a um preço inteiramente fora das possibilidades da maioria dos portugueses?

Vozes : - Muito bem !

O Orador: - Não hesito em afirmar aqui mais uma vez que o grave problema, que tanto cuidado nos dá, não pode ter senão uma de duas soluções: ou o custo das coisas necessárias à vida desce até ao nível dos vencimentos e salários ou estes têm de subir até ao nível do preço das coisas.
Impossível realizar este nivelamento que imperiosamente se impõe?
Mas, se outras nações o conseguiram, porque não o poderemos conseguir também nós?
Difícil? Decerto. Mas não há dificuldades invencíveis quando se tem uma vontade forte e um sério empenho de vencer.
Além de justo, é absolutamente urgente e salutar este nivelamento.
A ânsia de lucros que em certas actividades nacionais se verifica é um facto grave, que não pode escapar a observação de quem tem olhos para ver e ante o qual não podem manter-se indiferentes aqueles sobre cujos ombros pesa a tremenda responsabilidade de bem ordenar e orientar as coisas da vida nacional. E tão exagerados são. por vezes, esses lucros que somos levados i) duvidar seriamente da sua legitimidade. E, se ilegítimos, esses lucros tornam-se nas mãos d* tantos uma tentação e um perigo gravíssimo.

Vozes : - Muito bem, muito bem !

O Orador: - Quem o não sabe? Quem o não sente? Já o nosso épico, com justa severidade, cantou:

Veja agora o juízo curioso
Quanto no rico assei como no pobre,
Pode o vil interesse e sede imiga
Do dinheiro, que a tudo nos obriga.
Este rende munidas fortalezas,
Faz traidores e falsos amigos;
Este a mais nobres faz fazer; vilezas
E enbrega capitães aos inimigos;
Este corrompe virginais purezas.

Sem temer de hora ou fama alguns perigos
Este deprava as vezes as ciências,
Os juízos cegando e as consciências.

Perdoe-se-me, Sr. Presidente, a citação, que. sob certos aspectos, me pareceu notavelmente oportuna.

Vozes : - Muito bem !

O Orador: - Não vamos, no entanto, concluir que a riqueza é um mal social. Antes, ela é um necessário o apreciável bem ao serviço da colectividade.
Ao serviço da colectividade, note-se.
De facto, não há que temer a riqueza quando ela. consciente da sua grave função social, serve decididamente o bem comum e, consequentemente, o interesse das classes menos favorecidas.
Há, porém, que temer e condenar irremissivelmente toda a riqueza, qualquer que seja o seu volume, que desprezando os seus graves e naturais deveres, serve apenas os interesses e as paixões dos que a possuem e gozam.

Vozes : - Muito bem, muito bem !

O Orador: - Na verdade, a muita riqueza em mãos de quem não conhece ou não quer conhecer a sua verdadeira e legítima função é fonte copiosa de incalculáveis ruínas morais e físicas.
A história não cessa de fornecer-nos exemplos irrecusáveis e impressionantes de como a superabundância de ouro pode levar, e tanta.- vezes leva, ao mais degradante lodaçal, onde tristemente se afundam consciências e vidas.

Vozes : - Muito bem !

O Orador : - E este perigo - afirmo-o mais uma vez - não pode escapar a vigilância do Estado, que tem de o enfrentar decidida e energicamente.
A riqueza um mal? Muito ao contrário, ela é um elemento absolutamente necessário ao contínuo desenvolvimento da vida. Servindo a colectividade, a riqueza torna-se valioso instrumento das mais belas realizações, preciosa garantia de todas as iniciativas e empreendimentos.

Vozes : - Muito bem !

O Orador: - Numa palavra: a riqueza ao serviço da vida é fonte magnífica de apreciáreis bens. E importa que o seja cada vez mais e cada vez melhor. Desta forma a pobreza deixará de ser miséria e todos terão o indispensável para que a vida decorra em condições conformes à categoria e função de cada classe.

Vozes : - Muito bem !

O Orador: - De outro modo se não for vencida a louca ambição de lucros que, infelizmente, toma muitos sectores da vida portuguesa, as dificuldades agravar-se-ão desastrosamente e as condições de viver não se modificarão para quantos apenas têm o recurso dos seus modestos vencimentos ou salários.
Repito, Sr. Presidente: o aumento de vencimentos não logrará resolver o problema se com ele não vier o preconizado ajustamento do preço das coisas.