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3 DE FEVEREIRO DE 1955 493

assim. O vinho do Porto bebia-se e bebe-se ali, ao copo, em qualquer taberna, e era, apesar do seu preço, um vinho popular, sem perder a nobreza da sua estirpe.
A razão é outra: a barreira alfandegária erguida contra essa importação.
Antigamente, os vinhos generosos não excedendo 17º pagavam somente 2 xelins e 6 pence por galão.
A divisória da força alcoólica veio agora para 14,5.
Esta mudança prejudica o vinho do Porto, que, por lei, tem 16,5.
É assim ele, que estava anteriormente a pagar de taxa aduaneira 8 xelins por galão, viu-a aumentada para 50 xelins - qualquer coisa como 290 libras, ou mais de 23 contos por pipa.
Isto é fantástico! Admira até como semelhante barreira pôde ainda ser transposta.
É caso para perguntar: o que faz a nossa diplomacia?
Para que é que ela serve?
Não será para defender os nossos mais legítimos e mais vitais interesses? E a defesa dos mercados do vinho do Porto é um deles, como demonstrei.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Tenho a impressão, Sr. Presidente, de que ela, a nossa diplomacia, está antiquada, ainda usa punhos de renda e camisa de bofes, que há muito deveriam ter sido substituídos pela indumentária mais prática dos homens de negócios.
Se queremos exportar o nosso vinho do Porto para a. Grã-Bretanha, s preciso reduzir a justas proporções a gigantesca altura da referida barreira, o que se pode conseguir por duas formas diferentes: ou baixando em 50 por cento a taxa actual, ou elevando de novo a linha divisória da graduação alcoólica dos vinhos para 17º.
Com isto nada perdia o Tesouro inglês, porque o incremento das importações duplicaria, pelo menos, e as receitas cobradas não sofreriam diminuição, antes pelo contrário. Conseguir isto não me parece difícil, por razões políticas, económicas e morais.
E não nos esqueçamos de que Portugal importa de Inglaterra miais do triplo do que para lá exporta.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - E ficamos por aqui.
Será, como já por cá ouvi afirmar, porque o vinho do Porto não seja um óptimo, um riquíssimo vinho de sobremesa e possa com vantagens sei substituído por qualquer outro?
Mas então porque o imitam, porque o falsificam, porque lhe roubam a designação geográfica de origem Port, porque aparecem os Australia Port, os South-África Port, os Califórnia Port, os Oportos argentinos?
E porque será que a volumosa produção destes vinhos de imitação, apesar da sua inferior qualidade, se vende e consome?

Vozes: - Muito bem, muito bem !

O Orador: - Só na América a produção e consumo de California Port anda à roda dos 92 609 galões (1952).
Porque será que estes vinhos de imitação só aproveitam da fama que alcançaram os nossos vinhos da região do Douro, pulo uso indevido da marca Porto (na Argentina, por exemplo, «em que o seu é mau e nem remotamente se assemelha no vinho da região do Douro», para, vendendo os seus, proibirem a importação do autêntico, do genuíno vinho do Porto?
Porque será que mesmo aqui à porta, na vizinha Espanha, nação amiga e irmã, onde, aliás, existem vinhos de alta qualidade e assegurado consumo, como o Geres e outros, os seus «Bandeiras» contrafazem o nosso Porto?
Não, Sr. Presidente, o vinho do Porto foi, é e será o vinho de sobremesa por excelência, digam o que disserem os seus detractores lá de fura e cá de dentro.

Vozes: - Muito bem !

O Orador: - As suas qualidades organolépticas são únicas. São únicas e preciosas as suas cores, de encantamento para a vista; é único o aroma inconfundível que dele se evola, inundando qualquer sala, fortemente, persistentemente; é único na sedução do paladar, no bouquet agradabilíssimo, que faz as delícias de quem sabe o que é vinho.
Por isso o imitam, por isso o falsificam, por isso lhe opõem barreiras altíssimas, por isso lhe interditam fronteiras, ante a quase inércia, a mole actividade dos nossos serviços diplomáticos e consulares, ante a quase indiferença dos serviços públicos nacionais, que têm por dever defendê-lo em tratados e acordos comerciais e por meio de uma propaganda activa, contínua, conduzida com ciência e arte, como nos tempos de hoje é indispensável fazer.
Assegurar e dilatar os mercados tradicionais, trabalhai- pela conquista de mercados novos, eis a política que se impõe, como uma autêntica política, nacional que é.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente: muito abusei da generosa benevolência de V. Ex.ª, do que peço desculpa e apresento mil agradecimentos.
Cansei, em excesso, a bondosa atenção dos nossos ilustres colegas. Peço-lhes perdão, humildemente.
Mas, já agora, não queria acabar sem uma palavra a propósito de propaganda.
Se VV. Ex.as mo permitem, continuarei por mais alguns momentos.
O vinho do Porto, como, aliás, os nossos vinhos em geral, vendem-se e bebem-se no estrangeiro mais pelas virtudes que possuem do que pelo império do reclamo que os apregoe.
Impõem-se por si.
Mas nos dias de hoje o reclamo é tudo e o resto quase nada. Até a virtude verdadeira, sem ele, mal se pode afirmar.
E neste sector, meu Deus, que pobreza franciscana!
Não há um plano elaborado, organicamente construído, solidamente vertebrado, para à risca se cumprir, sem hesitações, sem desfalecimentos, sem anuladoras soluções de continuidade, como é absolutamente necessário. O pouco, o muito pouco que se tem feito, é solto, disperso, descontínuo, praticamente inútil, e mais se deve à iniciativa particular ido que à actividade do Estado e dos seus órgãos. E até alguns estudos feitos lá fora purgam no limbo do esquecimento das repartições oficiais.
Vou demonstrá-lo.
Em Portugal quase se não bebe vinho do Porto.
É de 6,13 por cento somente a média anual do vinho do Porto consumido no País em relação ao total das suas vendas.
E as razões são duas. O baixo nível de vida da nossa população, que nem o vulgar vinho de consumo corrente lhe permite muitas vezes beber, e em consequência, não se criou nela o hábito de beber à sobremesa, porque a grande maioria nem sobremesa tem. Ainda o seu maior consumo talvez seja o dos estrangeiros que por cá passam.