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12 DE FEVEREIRO DE 1955 621

Em Novembro de 1886 a penúria de vinho era Portugal era tão grande que, para incitar a plantar e replantar terrenos de vinha, se inseriu num decreto dessa data um artigo isentando de contribuição predial por dez anos os terrenos em que plantasse ou implantasse vinho; esse artigo vinha num diploma que procurava incentivar o ataque a filoxera, que tinha devastado os nossos vinhedos.
Mas vinte anos depois, em 1906, verificava-se a primeira enchente de vinho; e, como o vinho do Porto era o mais afumado, todo o vinho que se produzisse no País queria ser vinho do Podo; aviltámos por essa forma a qualidade ao afamado vinho do Porto que concorria aos mercados externos. Foi preciso intervir e ordenar-se um inquérito para se saber quais os vinhos que eram produzidos na região do Douro. Esse inquérito foi instituído pelo Decreto de 3 de Novembro de 1906.
No ano seguinte, em Março ou Abril de 1907, abriu-se nesta mesma sala um debate sobre n crise vinícola, debate em que tanto se azedaram os interesses e tanto se avinagraram as opiniões que foi preciso fechar o Parlamento para o Governo poder publicar o Derreio de 10 de Maio de 1907 - o primeiro que enfrentou a defesa dos interesses do vinho do Douro. Quem consultar a legislação desse tempo encontrará com a mesma data dois decretos: o n.º 1 e o n.º 2. Ocupava-se o primeiro do problema dos vinhos e o segundo de dissolver a Câmara dos Srs. Deputados da Nação.
E, caso curioso, o relatório do decreto dos vinhos ocupava-se sobretudo de justificar a política do Decreto n. 2, expondo as razões que obrigavam o Governo a pedir o encerramento do Parlamento, para poder fazer administração perfeita o honesta.
Meses depois, em 2 de Dezembro de 1907, publicava então o Governo uma larga e completa exposição sobre a crise vinícola, precedendo o decreto que suspendia a plantação das vinhas abaixo da cota 50. Nesta exposição, a meu ver, tudo está vivo e actual. Desde a importância da viticultura na economia do País à obrigação que impende sobre os Poderes Públicos de defenderem os seus interessas vitais contra os interesses transitórios, que ameaçavam indisciplinar a produção e o comercio dos vinhos.
Nessa exposição era o problema encarado sob três aspectos: o enológico, o económico e o social. Quanto ao primeiro, assentava na qualidade contra a quantidade. Econònomicamente, reconhecia a necessidade de obter o equilíbrio entre a produção e o possível consumo, interno e externo. Finalmente, sob o aspecto social, reconhecia que o granjeio da vinha no nosso país constituia uma cultura complementar de outros trabalhos e produtos, agrícolas. Produz-se normalmente em pequenas explorações para gastos de casa e o que sobra para equilibrar os orçamentos das pequenas economias domésticas ou familiares.
Impunha-se por isso a necessidade e a conveniência social de defender essas pequenas explorações, de preferência à cultura intensiva ou industrializada. Entendia-se já nesse tempo o preceito, que hoje figura na nossa Constituição, de que não é a mais-valia mas ao rendimento socialmente útil que deve atender-se de preferência.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Mas a defesa de todos estes três aspectos assentava fundamentalmente na defesa do primeiro - da qualidade -, porque só a defesa desta permitia atingir o equilíbrio entre a produção e o consumo e no mesmo tempo realizar a defesa social.
Para alcançar vinho de qualidade era preciso cultivar a vinha nas encostas; estas produzem pouco mas bom, o que facilita o equilíbrio. É aproveitando as encostas que a viticultura se mantém na sua feição complementar de defesa do pequenos patrimónios agrícolas.
Tal era o sentido geral da exposição de 3 de Dezembro de 1907.
A política definida nessa exposição era de pouco e bom, embora de custo de produção elevado, contra a tentadora política do muito ruim, embora mais barato.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - São estas duas políticas que, em meu entender, lutam entre si há meio século. E devemos reconhecer que, teòrircamente, tem prevalecido e se tem defendido sempre a política do pouco e bom, mas, praticamente, quantas vezes tem prevalecido a do muito e ruim!

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - É certo que os interesses transitórios, com a ânsia de lucro imediato, não têm a coragem de defender abertamente a política do muito e ruim, mas têm-na praticado de facto, fraudando todas as leis e toda a disciplina corporativa, que, debalde, sucessivos decretos têm pretendido impor. De modo que o problema, encarado sob o aspecto político, não consiste, meu ver, em fazer leis novas, porque as leis de 1907,1933 e 1935 contêm a disciplina jurídica e económica suficiente para resolver a crise de excesso de vinho ruim, quer proveniente de qualidades inferiores, quer de falsificações propositadas que, encharcam o mercado.
As providências que constam- das leis são óptimas; a questão é que nunca se cumpriram, porque os interesses transitórios procuram que a crise se resolva, mas sem que a eles seja imposto qualquer sacrifício!

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Este mesmo problema se encontra previsto na exposição de 2 de Dezembro de 1907 e com tal precisão e clareza, que me permito recordar à Assembleia umas pequenas passagens.
Com respeito à qualidade dizia-se nessa exposição:

Uma coisa importa assentar, que não carece de larga demonstração por ser um facto indiscutivelmente averiguado. O nosso país não pode lutar com os baixos preços dos vinhos de outras nações produtoras, mas excede-as na superior qualidade das massas, ou tomem o carácter de vinhos generosos ou de vinhos de pasto e consumo.
Dispondo ainda de grandes mercados consumidores, os nossos esforços para os defender e assegurar devem, essencialmente dirigir-se à qualidade, pois esta é, por mercê da constituição do nosso solo o da sua favorável exposição e ainda pela especialidade das castas cultivadas, a única que garante vantagens e superioridades. E sendo assim, como é, ninguém duvidará de que o futuro da nossa exportação depende da prosperidade das regiões onde se produzam vinhos nobres e afamados, que não têm competências e aos quais devemos o crédito universal dos produtos desta natureza.

Já então se afirmava a luta entre produtores de várzea e produtores de encosta. Dizia-se na referida exposição:

Enquanto os vinhedos que alcançam uma determinada produção por hectare lutarão vantajosamente com o abaixamento dos preços e tirarão da sua cultura proveitos apreciáveis, enquanto a plantação mais e mais se alargará, atraída pelo lucro, em toda a parte em que as grandes quantidades