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622 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 83

asseguram as despesas de laboração, desaparecerá necessariamente a cultura, nas regiões mais reputadas, pois que já hoje os vinhos ali não conseguem, em anos de produção regular, preço proporcional aos encargos e labores que determinam.
Os vinhos que pelas suas características nos asseguram reputação nos mercados externos e aí encontram razoável colocação pouco a pouco se irão diluindo, até que por completo desapareçam na massa anónima e indiscriminável dos vinhos baratos, dos vinhos de lote. que nos mercados estrangeiros não poderão, por si sós, aguentar-se contra a alheia concorrência.

E insistia-se:

As sucessivas plantações cada dia mais agravam o estado actual, e a seguir-se este caminho a brevíssimo trecho teremos por nossas próprias mãos inutilizado um dos mais valiosos ramos da produção nacional e irremediavelmente comprometido, pelo desaparecimento dos produtos de nomeada, dos vinhos do tipo mais acentuado e firme, a única garantia que ainda nos mercados nos assegura e defende a, nossa invejável situação.

Queixamo-nos hoje de falsificações. Também já nesse tempo as havia.
É interessante ver como o assunto era já analisado na exposição de 1907:

Não há dúvida de que para a crise concorrem largamente as falsificações, que são o mais danoso e temível inimigo da viticultura, que imporia perseguir com rigor, estabelecendo-se um apertado conjunto de medidas que permita uma repressão eficaz e decisiva.
Não há, porém, quem desconheça quanto é difícil exercer uma absoluta vigilância sobre o numeroso exército dos fraudistas de vinhos e como os laboratórios não encontram por vexes, nas sofistificações vinárias mais averiguadas e perceptíveis à degustação, falta de um só dos elementos componentes do produto natural.
O desdobramento com água, dentro de certos limites, impossíveis de averiguar pelos notáveis desvios que o produto natural acusa segundo as condições da produção, as adições de produtos químicos corantes, de álcool, de extractos, que hoje (em 1907!) constituem um variadíssimo comércio e rendosa ocupação de tantos laboratórios, tudo se ajusta tão científica e gradualmente aos elementos naturais que um vinho deve possuir que repetidas vezes a análise não pode enjeitar a mercadoria examinada, nem descobrir onde existe a falsificação.

O remédio proposto era, além do exame laboratorial, a organização da lavoura, para se saber quem, onde e quanto produzia.
Lê-se na exposição de 1907:

A única maneara de defender os interesses legítimos dos produtores é regularizar e organizar a produção.
Quanto a briga se deixa entregue às violências da paixão pelo lucro, das necessidades de viver ainda por algum tempo, das urgências de vender por todo o preço, desorganizam-se absolutamente as condições de funcionamento normal, atrofiam-se por completo os órgãos produtores, e o que fora elemento de prosperidade e fortuna transforma-se em amontoado pavoroso de destroços, que só a acção de dilatados tempos pode mais tarde reconstituir, quando de todo se não estancam as fontes da antiga riqueza.

E, já agora, uma última passagem, que é bem o comentário antecipado do meio século ao abuso que se fez do Decreto n.º 38 525 de 1951:

Se deixarmos a viticultura entregue aos interesses dos que ainda julgam ter vantagem em alargar as suas plantações, dos que, arrastados pelos lucros da cultura intensiva - e só esses são -, vêem que para si ainda existe lugar, embora calcando interesses alheios e do próprio País, condenamos à ruína as melhores regiões dos nossos vinhos, de entre as terras fundas e fortes muitas, sem dúvida, soçobrarão e ficarão apenas as terras das grandes produções e das piores qualidades, com vinhos e preços insignificantes, que, apesar disso, serão batidos em todos os mercados pela relativa superioridade dos produtos alheios, que com eles poderão vantajosamente compelir em preços. Será a ruína completa da parle mais importante do nosso comércio de exportação!

Contra esta política defensiva da qualidade, do equilíbrio entre o consumo e, a produção e de defesa social ergueu-se sempre uma política de quantidade, embora incaracterística, com esta diferença: até há pouco fazia-se e praticava-se, mas não havia a coragem de a defender abertamente, ao passo que agora essa política está a fazer-se às claras, declarando erradas ou desactualizadas as bases da política de 1907, renovadas em 1933.
O ilustre Deputado Sr. Dr. Proença Duarte citou nesta tribuna a opinião dum grémio de exportadores que afirmou em 1953 que a qualidade não estava em causa, para daí concluir que a lei da moderna economia era produzir muito e barato.
Ora, se a qualidade não interessa, a consequência lógica é que o privilégio que pela natureza foi concedido às encostas deve voltar-se a favor das várzeas, que produzem mais e mais barato! E em face deste critério, de que não há que atender à qualidade, mas sim à produtividade, é fácil acusar de autieconómica toda a defesa dos terrenos menos favorecidos. Se a qualidade não interessa, então as terras devem ser colocadas em igualdade perante a lei.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Tudo é vinho, e os preços não podem fazer diferenças, embora se saiba que para uns são de ruína e para outros usurários, permitindo fazer fortunas em poucos anos.
A isto objecta-se que a várzea nunca se opôs a que se fixassem preços remuneradores para todos! Mas bem sabem que quanto mais altos forem os preços mais lucram e que, se os preços baixarem, sempre tirarão lucro, e os outros, se não puderem viver, que morram! É a dura lei económica!

O Sr. Melo Machado: - Eu quero apenas dizer a V. Ex.ª que estou convencido de que, quando o Sr. Deputado Proença Duarte. Diz-se que a qualidade não estava em causa, não quis significar que a qualidade não interessava, moa simplesmente que os vinhos, apesar de bons, encontravam dificuldade na sua exportação.

O Orador: - Eu não quero fazer injustiça ao Sr. Dr. Proença Duarte. Também suponho que não quereria ir tão longe, embora do Diário das sessões, a p. 549, col. 2.ª, conste que S. Ex.ª pôde concluir, do que disse o grémio dos exportadores, que a orientação económica do nosso tempo é produzir mais e pelo menor custo de produção».