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752 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 89

quitectura desta praga, enquanto a harmonia das suas actuais dimensões não for por nós perturbada.
E este articulado de proporções terá de manter, não apenas o relacionamento intrínseco entre as diversas partes dos edifícios, mas ainda entre os seus volumes todos em bloco e as dimensões globais do espaço que em sua frente e sobre toda a praça se prolonga pela amplidão do Tejo e pela infinidade do céu.
À partir do rio, num golpe de vista a envolver a serena arquitectura do terreiro, desenvolve-se o olhar tranquilamente no movimento socegado e contínuo dum voo de gaivota. Dir-se-ia que também este movimento de voo, que vem do largo e paira sobre o largo, definia a amplitude e horizontalidade das linhas de construção, ajudando a realizar a harmonia deste equilíbrio entre a terra e o mar.
Se é assim vista de bordo para terra, também a perspectiva da terra para o rio havia sido já notada por Baptista de Castro, no sen Mapa de Portugal, quando dizia que: «os edifícios da parte da terra com a variedade de muitas embarcações grandes e pequenas no mar vizinho formavam uma bela perspectiva». E ainda hoje a continuidade com a perspectiva do rio nos deixa realizar o prolongamento das linhas das balaustradas a medir-se pela cércea antiga das vergas dos mastros, das velas e cordames de galeões e de faluas, ou pela pontuação moderna de chaminés e antenas de navios e transatlânticos que vêm substituindo aquela palpitante floresta naval do século XVIII. Dela nos falava Luís Mendes de Vasconcelos ao descrever naquele mar «tantos navios postos com as proas em terra e outros ancorados no mar que os mastros e antenas parecem um grande bosque de espessas árvores».

Vozes: - Muito bem!

O Orador:-O actual Terreiro do Paço, forma definitiva a que o sismo de 1750 deu esta imponente unidade, sucedeu às formas arquitectónicas vicejantes e floridas do gótico manuelino e ao classicismo estático e solene já iniciado pelo renascentismo filipino de Terzi; mas as linhas mestras da estrutura dos seus volumes mantiveram-se na harmonia realizada no decorrer de todas as épocas, como se através dos tempos e dos estilos, e até da pluralidade das construções, alguma coisa se impusesse como fundamental à consciência dos construtores: a inviolabilidade do equilíbrio entre a arquitectura dos homens e o meio paisagístico arquitectado por Deus.
Sabemos, pêlos excertos do manuscrito anónimo publicado por Camilo no n.° 8 das Noites de Insónia, que já antes do terramoto havia a ideia de fechar a praça pelo lado nascente com outra galeria igual. Aquela visão arquitectónica de conjunto dum formoso átrio da cidade senhorial por excelência terá de permanecer tal qual é, expressão natural do que se foi delineando até encontrar esta forma definitiva, nobre, serena e intemporal.
Desde meados do século XVIII que ela vem afirmando-se como um dos mais imponentes a harmoniosos conjuntos arquitectónicos do mundo moderno. Escreveu Martin Ilume que ela era ca mais imponente praça pública da Europa, com excepção, talvez, da Praça da Concórdia, em Paris».
Assim deverá permanecer, com toda a força que lhe provém da imponência majestática da sua horizontalidade e da sua sobriedade.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Para esta impressão de serena majestade torna-se indispensável a cota reduzida dos seus edifícios. Ela provém, sobrecu tio, do domínio do comprimento e da largura sobre a altura e resulta ainda da suave continuidade com a visão larga do Tejo.
Para valorizar o domínio destas linhas de força coroaram-se os edifícios com a faixa exacta da balaustrada assente sobre a linha ininterrupta da cornija, cuja continuidade se destina a reforçar a nitidez do recorte.
Nenhum elemento decorativo - urnas, medalhões, trofeus, Incarnas- interrompe ou se sobrepõe aos limites paralelos da balaustrada. Nem mesmo contra os telhados se ergue a teoria animada das mansardas com que em geral se enriquece o estilo pombalino.
Exactamente pelo conhecimento do valor que teve na arquitectura pombalina a Junção a um tempo utilitária e decorativa destes elementos de construção com que Francisco Mansart animou o classicismo arquitectural da época de Luís XIV é que nós sentimos o propósito firme com que Eugênio dos Santos os eliminou definitivamente deste magnífico conjunto.
A sua falta foi certamente como necessidade para a expressão daquele estilo e constitui uma das características da sua própria dignidade.
A palpitação, a leveza e movimento das mansardas viria quebrar a magnífica amplidão desta harmonia, que se desenvolve com a serenidade majestosa de um impressionante largo musical.
Se a arquitectura pôde sor definida por Goethe como música petrificada e as proporções numéricas das suas medidas puderam ser traduzidas como música do espírito pelo grande mestre da Renascença italiana Leo Alborti, constitui na verdade um majestoso largo esta harmonia estabilizada na solene arquitectura do Terreiro do Paço, grande átrio marinho duma cidade que, engrandecida pêlos Descobrimentos, naquela praça se ficou de braços e de coração abertos para o mar.
Na tríplice fachada, tanto do edifício central, enriquecido com o ex voto em pedra do seu arco do triunfo, como nos outros edifícios que flanqueiam o largo, desenvolve-se aquele ritmo ternário que se estabiliza no período mais sumptuoso da arquitectura clássica e se repete, como ura eco repercutido através das idades, nas construções da Renascença italiana e na arquitectura do Luís XIV.
Primeiro, ao rés da terra e, quase poderíamos dizer como numa das antigas descrições da primitiva praça, ao rés do mar, aberta à continuidade da vastidão do terreiro e da mais larga vastidão das águas, a fuga ágil das arcadas de pleno cintro, assentes sobre a teoria robusta dos maciços pilares.
Sobre estas vastas galeria:; o andar nobre, em que se perfilam lado a lado os ressaltos das ombreiras dos grandes vãos regulares das janelas de sacada sobremontadas pelo coroamento tracejado das molduras. Sobre este andar eleva-se o andamento menor da ática ou, antes, do mezzanino que se desenha ao longo duma série de aberturas quadrangulares, e cuja medida se limita pela linha rectilínea da cornija sobre que assenta a faixa da balaustrada.
Para que esta composição harmónica avulte em todo o seu valor, sem interferências capazes de perturbar a nobre extensão da sua grandeza, excluíram-se não só as mansardas, mas ainda todos os pormenores ornamentais da fachada.
Pobreza, como tantos pensam? Precipitação do acabamento na azáfama reconstrutiva, como tantos outros precipitadamente aventam? Nem uma coisa nem outra. De resto, nem sequer houve a pretendida precipitação na faina construtiva do terrero. O que houve foi a realização reflectida dum plano artístico erguido num sentimento de pureza estilística e de cultura arquitectónica, a beleza das artes construtivas concebida para além do agrado epidérmicamente sensória! e realizada dentro da