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1232 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 160

A construção jurídica do Estado requer alta dignidade.
A construção jurídica do Estado põe em jogo o movimento dos seus órgãos superiores e afecta, aquilo que poderei chamar uma competência normal, e não uma competência específica ou excepcional.
Pode ser objecto dum programa geral de vida pública ou constitucional, mas só secundariamente será objecto também do trabalho de órgãos de outra ordem.
Quanto ao rumo que nos é apontado pelos escritores mais atentos às paternais proposições encíclicas, devo observar quo esta proposta de lei tem em vista difundir, propagandear, derramar entusiasmo, criar prosélitos nas camadas numerosas, desencadear nova vaga mística, enfim, dar impulso anímico criador e entusiasta que aqueles escritores asseveram faltar agora; quanto a esse segundo rumo- esta proposta de lei parece-me acudir-lhe nas faltas e deficiências e popularizar a doutrina, de molde a obter a adesão completa das massas e o seu melhor entusiasmo.
Quanto à terceira orientação -que é necessário construir com rigor o com lógica mais singela, mas mais nitidamente- hei-de adiante referir-me com maior espaço de tempo e detalhe.
Fazendo o tour d'horison da doutrina, sem qualquer prevenção crítica, direi apenas: pela força dos acontecimentos, pela importância das nossas, grandes realizações legais e corporativas, a literatura da especialidade mostra-se mais explicativa do que construtora, mais de vulgarização do que aquilo que os Latinos chamam de elegância teorética.
Nestas condições, por força da natural aceitação dos meios cultos, caminhou-se até aqui para a compreensibilidade, a abundância e o eclectismo, mas falta insistir no rigor da arquitectura doutrinal, para depois exigir dos factos e acontecimentos a plenitude esperada de verificação e confirmação.
Nesta terceira hipótese construtiva a cátedra tem também de dar a expressão do rigor ao pensamento riquíssimo do seu original construtor e incumbe-lhe ainda criar e preparar o escol de juristas, administradores e construtores capazes de transmitirem à vida as altas injunções recebidas na Universidade.
O esforço doa ilustres Profs. Marcelo Caetano, Teixeira Ribeiro e Fernando Seabra e dos Drs. Mota Veiga e Pires Cardoso e doutros especialistas destacados tem de continuar.
A Universidade não tem repouso, como adiante veremos.
Temos ouvido muitas vezes levantar o problema da consciência corporativa, em psicologia social, como referido a um estado de alma da colectividade deficiente, por falta de preparação e edificação.
Não há o estado geral de espírito que facilite o advento das medidas finais do corporativismo; não resultaram esta e aquela previdências porque não há no povo português unia consciência geral corporativa; não se alcançaram mais brilhantes resultados porque a alma colectiva não sente e não foi ainda vivificada pela consciência corporativa - tal é a argumentação.
Ora o problema não é de consciência corporativa geral e de povo corporativo, mas do homem corporativo.
Foi o Prof. Gino Árias, em tempos, que pretendeu substituir ao cálculo individual económico a consciência corporativa.
Vejamos como.
A economia liberal fez do homem um calculista metódico, que balançava cómodos e satisfações para nelas aplicar o seu mínimo custo.
Depois do homem medievo, o burguês, primorosamente retratado por Sombart, dominou a economia e a sociedade, como o terceiro estado conquistou as assembleias políticas.
Era a época em que todos recomendavam: e Ide e enriquecei»; e aquele pai famoso catequizava ao filho: «Vai ganhar dinheiro honestamente, em qualquer canto do Mundo, mas vai ganhar dinheiro» ...
O homem tornou-se um grande egoísta e a sua consciência mandava-lhe trabalhar só ao serviço dos seus próprios interesses e lucros.
A este homem calculista e ganancioso contrapuseram os escritores o homem que, além dos lucros, se apercebe e considera os meios e fins sociais de benefício para todos.
Assim, o homem corporativo, de consciência corporativa, seria um cooperador sociável, um colaborador nato, com iniciativas que não chocam o interesse geral, antes se ajustam ao bem comum, dotado de uma consciência aperfeiçoada, que lhe permitiria distinguir o sentido corporativo e o interesse geral.
A economia passaria a ter um carácter normativo e moral e este estado de espírito não podia deixar de influir na própria marcha política.
A consciência corporativa levava a escolher, a calcular por forma não egoísta, a trabalhar e a colaborar socialmente - com a affectío societatis.
Destas consciências corporativas resultaria convivência, melhoria geral, mais perfeita compreensão.
E, logicamente, nos preços, nos lucros, nos custos, na usura e nos réditos resultariam proporções e aspectos que se afastavam dos quadros tradicionais de pensamento.
A teorização de Gino Árias foi impugnada por alguns e abraçada calorosamente por outros.
Ela conserva o seu esplêndido significado.
A edificação do Estado corporativo tem de começar pelo homem, fazer dele menos egoísta e menos ansioso de lucratividade. Embora o homem se possa dizer o mesmo e não variar excessivamente a sua psicologia de quadra para quadra, a verdade é que ele regista e escolhe os fins dispõe dos meios, promove as aplicações.
A civilização torna os homens mais materialmente apegados à vida, menos isentos, mais distantes do sacrifício, mas uma economia humana e espiritual, uma economia corporativa atenta por igual ao desenvolvimento da personalidade e à realização do bem comum, conduzirá a um sistema de pensar e viver diferente do enriquecimento tradicional.

Lembremo-nos de que o homem das fragas do Douro, com a sua medíocre lavoura, recolhe três ou quatro sementes que não pagam o seu esforço, e, a despeito disso, o trabalho não pára. Se defendermos o enriquecimento livre e sem peias, nem compreenderemos traços como estos de economia humana e menos ainda se darão os passos para a formação do homem corporativo - uma consciência !
Toda a teoria do corporativismo deve ser depurada, melhorada e reconstruída. O pensamento de S. Ex.a o Sr. Presidente do Conselho tem de ser convenientemente desenvolvido e interpretado.
Na equação pessoa humana- corporação- Estado Novo não cabe tudo, mas também não deve faltar o essencial.
Não podemos desprezar ou permanecer surdos aos ensinamentos dos mestres europeus. Temos de estar atentos às suas críticas. A hora das múltiplas florescências e das sistemáticas apologéticas passou.
Há ainda que estudar, rever e construir, mas no sentido da nitidez e da simplicidade, por ser essa a linguagem dos políticos que querem que os entendam e a das multidões, que hão-de ser dirigidas com princípios claros.
Tem-se misturado corporativismo com neomarginalismo.