134 DIÁRIO HÁS SESSÕES N.º 173
ploma a que V. Ex.ª se refere. Mas as mesmas razões não me impediram de já ler requerido o cancelamento da minha inscrição na nova Ordem dos Engenheiros, não me impedirão de subscrever qualquer exposição que solicite certas alterações ao referido diploma e não me impedem agora de afirmar a V. Ex.ª a minha plena concordância com as opiniões que manifesta.
Não desejo entrar em análise pormenorizada. Apenas, tendo estudado a fundo, há vinte anos, o problema que agora está de novo em causa, e existindo já ao tempo o título, a que V. Ex.ª se referiu, atribuído aos diplomados pelo Instituto Superior de Agronomia, observo que. quando foi instituída a Ordem dos Engenheiros, foi concreta e muito pensadamente resolvido que nela não tinham de ser abrangidos os diplomados por aquele Instituto. E o Governo de então assim decretou. Não se deram agora a conhecer as razões por que o Governo actual decretou o contrário.
Duas disposições do recente diploma feriram profundamente a minha sensibilidade. A primeira é a de ser imposta por decreto a dissolução da Associação dos Engenheiros Civis Portugueses, associação de honrosíssimas tradições, e sem que uma causa irremediável seja apresentada. Essa disposição até sentimentalmente me desgosta. A segunda é aquela onde se determina a extensão da Ordem a quem exerce profissão diferente da dos engenheiros, para que foi criada.
As razões que em 1936 prevaleceram não se alteraram; e também deviam ter prevalecido agora.
Já que V. Ex.ª foi interrompido por discordantes da sua opinião, eu, que com ela sou concordante, não quis deixar de o interromper também.
O Orador: - Muito obrigado a V. Ex.ª
Sendo, pois, a Ordem dos Engenheiros, antes de mais nada, um sindicato profissional, não parece curial que nela se admitam filiados heterogéneos e de interesses diversos. Deixaria de ser organismo corporativo para se tornar numa verdadeira salada de ofícios, só ligados pelo ténue visco de uma designação para os agrónomos e silvicultores legalmente caída em obsolência.
Não colhe, pois, a invocação feita no relatório do decreto-lei do que de idêntico e de comum existe na formação técnica e na cultura geral dos engenheiros e dos agrónomos - seja lá o que for -, pois se trata de um sindicato de homens de ofícios, e não de uma associação apenas cultural. Nem é fácil entender que esta diferença, todavia essencial, não se meta pelos olhos à primeira vista do assunto!
E quanto às finalidades gerais das profissões será preciso ir muito longe, quase até onde todas se confundem, para as encontrar identificadas.
Peço a atenção do Sr. Ministro das Corporações para estes factos, tão singelos como evidentes, e de que estou certo muitos não seriam do seu conhecimento quando admitiu o ingresso de agrónomos e silvicultores na Ordem dos Engenheiros.
Como poderia conceber-se que doutro modo procedesse conforme procedeu?
Sei bem que à clara inteligência do Sr. Dr. Veiga de Macedo, a quem, aqui e em toda a parte, me é grato testemunhar o mais sincero apreço por unia obra já enorme e por propósitos mais altos ainda, de cuja realização o que já fez é penhor bastante, e ao seu idealismo corporativo, que não quererá empanado pela menor pecha, isto bastará para proceder como a razão impõe; mas não me furto a lembrar a S. Ex.ª que alguns dos, seus admiradores o veríamos em pecado de incoerência - um dos mais feios em política - se não procedesse como deste lugar lhe peço.
Com efeito, nem de três meses precedeu o da Ordem dos Engenheiros o novo Estatuto da Ordem dos Médicos. Pois, apesar da identidade, neste caso rigorosa e legal, dos títulos de médico e de médico veterinário, S. Ex.ª não quis proceder de modo que os dois sectores da medicina humana e da medicina veterinária se confundissem sindicalmente. Foi perfeita aqui a sua sensibilidade às distinções profissionais, mostrando saber ver além das formas verbais. Quererá que vejamos essa perdida e nos interroguemos porquê, sem poder atinar com a resposta que preste, no caso dos engenheiros?
O Sr. Presidente: - Previno V. Ex.ª de que já esgotou o tempo regimental. Peço, por isso, o obséquio de abreviar as suas considerações.
O Orador: - Peço a V. Ex.ª, Sr. Presidente, que me conceda mais cinco minutos. Estou a prolongar-me mais do que desejaria, mas não inteiramente por culpa minha.
O Sr. Presidente: - Faz favor de continuar.
O Orador: - Já ouvi - mas parece-me a razão fraca -, já ouvi que o empenho dos agrónomos e silvicultores em ingressarem na Ordem dos Engenheiros procederia de se considerar - como direi? - mais nobre, ou mais decorativo, pertencer a uma ordem do que a um banal sindicato nacional. Se é este o caso, não sei que diga, senão que apenas dois tipos de solução o satisfariam razoavelmente: ou elevar à dignidade de ordens todos os sindicatos nacionais de diplomados com cursos superiores ou reduzir as ordens a duas: a dos doutores e a dos engenheiros, e meter lá tudo a esmo, apenas diferençado pelos títulos, académico ou de cortesia, dos diplomados. Salvo o respeito por melhor opinião, parece que foi afinal o que se fez quanto à Ordem dos Engenheiros.
Disse da dúvida e pedi o seu esclarecimento, expondo-a singelamente e aduzindo sobre ela factos, nada mais do que factos, dispensando-me, para me não alongar de mais, de todas as considerações sobre a importância e melindre do espírito de corpo, no caso dos engenheiros ofendidos, que à inteligência dos que me ouvem acorrerão naturalmente.
Agora resta-me expor a queixa, que sinto amarga.
É, muito simplesmente, a de ter sido extinta pelo mesmo decreto-lei a velha e honrada Associação dos Engenheiros Civis Portugueses, senhora de capital de tradições, de serviços e de prestígio não inferior ao alto valor dos bens materiais que foram mandados incorporar no património da Ordem dos Engenheiros.
Vivia, sem dúvida, a Associação muito ligada à Ordem quando numerosos sócios daquela o eram também desta e nas formações e actividades profissionais não havia diferenças de monta. Mas ficou reconhecido o facto de nem todos os sócios da colectividade mais antiga poderem ingressar na mais moderna, e a circunstância de para esta última entrar população nova, que a Associação dos Engenheiros, no uso de legítimos direitos, sempre se recusou a receber no seu meio, torna mais caracterizada a violência que se lhe fez. A qual violência, sublinharei, ganha peculiar cor se se atentar na elevada valia das propriedades da Associação que se levam a proveito de quem não poderia livremente gozar-se delas e se se tiver em conta que a colectividade extinta já não era organismo sindical.
Alega-se que quase todos os sócios da Associação dos Engenheiros ouvidos se pronunciaram pela rejeição do regresso do organismo à actividade. É certo; posso testemunhá-lo porque fui dos que foram ouvidos e assim responderam.
O Sr. Augusto Cancella de Abreu: - E eu também, Sr. Engenheiro!