19 DE MARÇO DE 1959 343
mal do dia 11 do corrente cumpre-me informar o seguinte:
Conforme consta da determinação relativa ú dispensa de pessoal da Fábrica Portuense, resulta esta medida e a fornia como ela será efectivada de princípios expressos na legislação que criou e regulamentou o actual regime dos tabacos no continente e na orientação que sobre n matéria esta administração recebeu do Governo.
Quando a esta orientação, consiste ela em levar a efeito a referida dispensa por forma gradual, mima cadência tanto quanto possível uniforme, ao longo dós cinco anos - 1958-1962 - concedidos para n edificação da nova fábrica que a empresa tem, por lei, obrigação de construir, isto com o objectivo de evitar licenciamentos em massa, que tornariam muito mais difícil a reabsorção do pessoal dispensado. De resto, ao fixar a diferença ad valorem, de 0,5 por cento a favor desta empresa durante cinco anos teve o Governo expressamente em conta tal diminuição sucessiva dos encargos de mão-de-obra na Fábrica Portuense.
Mesmo assim, embora sofrendo com isso prejuízo, acedeu a 'Companhia ao desejo expresso pelo Governo de só dar início à referida dispensa de pessoal no ano corrente, quando, dentro da mencionada orientação, a deveria ter já principiado em 1958. Por outro lado, propõe-se conceder a cada uma das operárias que for licenciando, para além dos direitos que por lei lhes pertencem, um subsídio correspondente a dois meses de vencimento - encargo que, aliás, foi considerado pelo Governo ao autorizar a recente actualização dos preços de venda dos tabacos manipulados por esta Companhia.
Para terminar, afirmo a V. Ex.ª que este conselho de administração sente, e muito, o ter de dispensar os serviços de empregados antigos que têm servido a Companhia com dedicação; sente, também, ter de encerrar uma unidade fabril que há muitos anos labora no Porto. Mas tem-se por certo que não faltará o apoio das entidades oficiais para que aquele pessoal venha a encontrar trabalho noutras indústrias, à medida que for sendo dispensado no nosso serviço.
Apresento a V. Ex. os meus melhores cumprimentos.
Lisboa, 13 de Março de 1959. - O Presidente do Conselho de Administração riu Companhia Portuguesa de Tabacos, Companhia dos Tabacos de Portugal, representada por (assinatura ilegível) ».
Sr. Presidente: o que acaba de ouvir-se é uma verdade que não admite dúvidas, mas custa a acreditar que seja aquele o espírito do Governo. A Companhia está no uso do seu pleno direito, defendendo os seus interesses. E pergunto, perante o que se passa: quem defende os interesses dos operários, os interesses de uma, cidade, os interesses ligados a diversos sectores de actividade do Porto?
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - Esta carta ó um notável documento, que dignifica a minha intervenção em favor de uma causa que se apresenta como inteiramente justa e profundamente humana, defendendo com sinceridade e energia, liberta de qualquer paixão ou de qualquer interesse pessoal, o que muito me enobrece, a manutenção de uma unidade industrial cuja falta se vai fazer sentir penosamente no meio comercial e industrial da grande cidade capital da zona norte.
A Companhia Portuguesa de Tabacos, baseada no contrato de arrendamento realizado com o Estado em Novembro de 1957, diz-nos, sentindo muito o facto que é obrigada a realizar, que a sua determinação de 31 de Janeiro de 1959 vai ser cumprida, como o Governo pretende, iniciando-se o licenciamento do pessoal, por escalões, no princípio do próximo mês de Abril, não se realizando mais cedo por motivos que são do nosso conhecimento, mas que me dispenso de citar.
E é pena, Sr. Presidente, e eu dolorosamente lamento que assim seja, pois considero o acto da extinção da fábrica como erro de funestas consequências, seja qual for o prisma por que se encare o desaparecimento dessa unidade, de tanta importância e de tanta projecção.
Não tenho mais que repetir, confirmando o que aqui disse há poucos dias, pondo nas minhas palavras toda a sinceridade e toda a verdade, bem impregnadas de amargo sentimento, considerando a questão em debate sob o seu verdadeiro aspecto, social, moral e político.
Não se compreende nem se justifica, nu época que vivemos, época de realizações, fontes de energia e de trabalho; no momento que atravessamos, em que tanto se defendem os princípios de defesa familiar, a elevação dos níveis de vida, u celebração de contratos colectivos de trabalho e tantas outras medidas, que se faça a adopção de providencias altamente contrariantes dos postulados que defendemos, o que irá negar trabalho a mais de quatrocentos indivíduos especializados na manipulação tabaqueira, chefes de famílias numerosas, que há largos anos empregam toda a sua actividade nessa indústria e não poderão, por múltiplas e bem compreensíveis circunstâncias, ser transferidos para outra após o seu despedimento.
E o remédio para evitar tão grande mal, situação tão delicada, seria bem simples, e a própria .Companhia o poderia defender e perfilhar. O benefício de 0,5 por cento referente no imposto ad valorem poderia elevar-se para .1 por cento, e isso era bastante para resolver dificuldades que parecem querer tomar um aspecto de insuperáveis.
Mas se assim não acontecer, ouso perguntar: que necessidade imediata houve em adoptar legislação da qual resulta o encerramento de uma grande unidade industrial, esquecendo os direitos dos trabalhadores, os direitos do uma cidade e de uma população, e, na hora presente, o encarecimento do produto, o tabaco, de que resultará para a Companhia um imperavit sobre os lucros, em relação ao exercício anterior, da ordem de 25 OOÜ contos, como o demonstra um relatório que acaba de me ser enviado?
Nada vale ou representa esse aumento de receitas, à face de problema tão preocupante, fonte de desemprego, motivo de agitação e de desequilíbrio social?
Tenho na minha frente um mapa elucidativo, eloquente na sua expressão numérica, da verdade em que as minhas palavras se fundamentam. Mas, fazendo justiça à administração da Companhia, que dentro do seu papel cumpre, zelando vigorosamente os interesses dos seus associados e obrigacionistas, dirijo novo apelo ao Governo, chamando a sua esclarecida atenção para problema de tão alta repercussão e gravidade, como é aquele de que estou tratando.
Mais do que nunca, compreendo a situação delicada que na hora presente atravessamos; mas, mais do que nunca, é indispensável a promulgação de medidas que satisfaçam, justas aspirações do povo.
Já o disse e repito: comete-se grave falta, verdadeiro atentado, consentindo no desaparecimento da Fábrica Portuense de Tabacos, para concentrar na capital mais uma indústria, como forte motivo de desfalque na economia do Norte.
Vozes: - Muito bem, muito bom!