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18 DE JUNHO DE 1959 1003

Deveria a Assembleia reservar, porém, para si a faculdade legislativa e repelir a comparticipação de competência do Governo?
No estado actual das coisas, parece-me difícil encontrar uma solução que seja, por assim dizer, aceitável por todos: pelos teóricos, pelos técnicos, pelos Ministros e pelos Deputados.
Mas a lei tributária nunca foi elaborada numa oficina silenciosa e recôndita, nem sobre ela se exerceu apenas a tecnicidade dos técnicos.
Parece-me dificílimo assim entregar à competência da Assembleia, mesmo através das suas comissões, a elaboração de diplomas complexos, minuciosos e técnicos sobre os tributos; mas outra coisa são os grandes princípios de justiça fiscal.
A tributação obedece a directivas várias, políticas e político-sociais, e não apenas a motivos financeiros. É gizada, organizada e lançada de harmonia com princípios complexivos de economia, de justiça, de política e de administração.
E estabelelecida e regulada tendo em vista os seus efeitos, incidências e repercussões, a longo e a curto prazo.
Estes cuidados e afazeres não se coadunam, porém, com a missão de legislador das assembleias e do Deputado, que são os defensores da capacidade tributária.
Mas não duvido de que, se a questão um dia pudesse ser retomada e analisada de novo - e longe da autorização já conferida em matéria de reforma fiscal-, se poderia encontrar uma solução satisfatória.
Se viéssemos a definir como matéria exclusiva de lei os grandes princípios jurídicos e até as técnicas fundamentais inovadoras da tributação, o problema simplificar-se-ia enormemente e a sua solução adquiriria rigor e significado político bastante.

O Sr. Melo Machado: - Não se esqueça V. Ex.ª, que me dá licença, de que nós só aprovamos bases.

O Orador: - É exactamente isso.
Os princípios são quatro ou cinco - desde o mínimo de sacrifício até à utilidade social.
As técnicas ainda são menos - desde o desconto na base até à declaração pessoal.
Seria precisa a colaboração geral para se chegar a uma solução política, à solução constitucional, vamos!
Não apresentaria dificuldade um projecto de lei de duas ou três bases que, depois de constitucionalmente prescrito, cristalizasse os princípios e técnicas novas, diferentes e inovadoras, aos quais o consentimento dos representantes da Nação emprestaria grande autoridade, traduzida assim expressivamente e na ordem tradicional.

O Sr. Simeão Pinto de Mesquita: - Muito bem!

O Orador: - Seja como for, a porta da discussão não fica fechada, e também pela lei de autorização das receitas e despesas e pela lei especial que condiciona os dinheiros públicos levantados e gastos não faltará ocasião adequada para a Assembleia esclarecer ulteriormente tais assuntos, pois o debate não me parece até agora concludente.
Mas seria vantajoso para todos que o consentimento pudesse revestir forma solene e especial, suplantando o regime continuado das autorizações anuais, que realmente não satisfaz.
Sr. Presidente: ao finalizar esta longa exposição sobre temas capitais de direito, afirmarei apenas, com simplicidade: temos de construir o futuro, mas guardando bem as lições do passado.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Martinho Lopes: - Sr. Presidente e Srs. Deputados: ao subir a esta tribuna para intervir neste debate parlamentar move-me apenas o único objectivo de contribuir com o meu modesto depoimento para que se esclareça tanto quanto possível esta Assembleia, a fim de se pronunciar com inteiro, conhecimento de causa sobre o momentoso problema da reforma constitucional.
Vários pontos foram já discutidos e focados com a amplitude que merecem neste lugar e espera-se que, após o debate na especialidade, possamos brevemente ver coroados de êxito o nosso esforço e o nosso trabalho.
Estamos, pois, Sr. Presidente, em face da lei suprema da Nação, sobre a qual nos vimos debruçando, perfeitamente cônscios da especial gravidade do acto, que irá reflectir-se naturalmente na vida da colectividade, com todas as consequências dele derivantes.
Na certeza, porém, de que vozes mais autorizadas que as minhas em matéria de política constitucional, que já se fizeram ou vão ainda fazer-se ouvir com o brilhantismo que lhes é peculiar e com a autoridade incontestável que possuem na matéria em causa, deter-me-ei apenas sobre três pontos, que, pela sua especial relevância e directa incidência no plano dos interesses de toda a Nação e, portanto, da província de que sou porta-voz nesta Assembleia, me mereceram desde o início particular atenção.
Refiro-me em primeiro lugar, Sr. Presidente, à alteração do artigo 72.º da proposta governamental, no sentido de a designação do supremo magistrado da Nação ser feita daqui em diante por um colégio eleitoral composto de membros das duas Câmaras e de representantes municipais.
O problema, apresentado por vezes, a meu ver, um tanto ou quanto deslocado do seu verdadeiro âmbito, poder-se-ia resumir, ao que parece, nos seguintes termos: em face da situação concreta de jure et de facto da instituição vigente - a República unitária e corporativa -, trata-se simplesmente de apurar entre as formas possíveis a que mais convém na actual conjuntura política do País à eleição do Chefe do Estado.
Posta a questão nestes termos, e só nestes termos, julgo eu, se poderia abordá-la, afigura-se-me não só oportuna como até necessária a proposta governamental.
Efectivamente, Sr. Presidente, se a concepção corporativa, que a nossa Constituição Política consagra no seu artigo 5.º, se deve entender no sentido, da doutrina corrente como a de um corporativismo que, longe de negar o indivíduo, o reconhece e, integrando-o na estrutura da vida da comunidade nacional; efectivamente o defende na organização corporativa; se o corporativismo português só pode ser, na realidade, caracterizado de corporativismo integral na medida em que as forças vivas da Nação corporativamente organizadas participarem na eleição do Chefe do Estado através dos seus genuínos representantes, livremente eleitos pelas respectivas corporações, temos de concordar que, pelo menos, a proposta governamental, sob este aspecto, não obstante as deficiências que possa ter, constitui, em boa verdade, um esforço decidido, um passo em frente na realização do ideal corporativo.
Na verdade, analisando friamente a alteração do artigo 72.º proposta pelo Governo e tendo em vista a amarga experiência das campanhas eleitorais dos últimos anos, parece-nos, tudo ponderado, ser a forma de eleição do Chefe do Estado preconizada no texto governamental a que mais se coaduna com os tempos difíceis que decorrem e com os princípios basilares de um Estado que, por força da Constituição, é corporativo.