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1030 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 124

Por outro lado, como não são eleitos exclusivamente para eleger o Chefe do Estado, não há que pôr-se, a propósito da sua eleição, a campanha política que naturalmente teria de pôr-se se eles fossem exclusivamente eleitos para eleger o Chefe do Estado.
A pequena inflexão a esta ideia relativa aos delegados dos municípios ao colégio eleitoral é realmente uma pequena inflexão. Na verdade, se os delegados ao colégio são eleitos só para esse fim, os seus eleitores -as vereações- foram-no para desempenhar as suas funções gerais como vereações, entre as quais estará ou não a de escolherem os delegados ao colégio.
Estas, de modo geral, as razões concretas - sem procurar agora entrar no domínio da teorização- que determinaram o Governo a ir para a solução que está proposta à consideração da Assembleia.
Suponho que, realmente, foi encontrada uma fórmula que conduz a que é a gente particularmente qualificada que vai intervir na eleição do Chefe do Estado- e que tem qualidade para exprimir o pensamento mais autenticamente nacional.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem!

O Sr. Paulo Cancella de Abreu: - Sr. Presidente: a apreciação e votação do artigo 72.º põe em foco a atitude de alguns Deputados revelada durante a discussão da generalidade, que, incompreensivelmente,, causou certos engulhas, não se atribuindo a esta expressão qualquer sentido pejorativo que. porventura, pudesse ser-lhe atribuído; reacção esta a que não houve oportunidade de oferecer réplica, u não ser numa breve resposta a um aparte que me foi' dirigido. São, portanto, necessárias, e agora oportunas, mais algumas palavras para que de vez cessem erradas interpretações e juízos temerários.
Intervim no debute da generalidade da proposta e dos projectos de lei tão-somente com estas finalidades:
1.º Marcar a minha posição em. referência aos artigos que se ocupam da eleição do Chefe- do Estado; posição bem evidente de recusa;
2.º Demonstrar que esta posição era especial e única em confronto com a de todos os outros Deputados, sem exclusão dos que são monárquicos inscritos ou filiados; e isto porque,
3.º Como nenhum outro, vivi mais, tempo ou mais intensamente o passado longínquo do regime que ainda vigora, conheci a inépcia da sua administração, os seus erros, os seus crimes e os seus escândalos, e comparticipei intensamente e com inquebrantável tenacidade e intransigência, nesta Camará e lá fofa, pela palavra e pela escrita, na dura campanha em que nos envolvemos e empenhámos, assumindo assim atitudes, compromissos e responsabilidades que seria indigno enjeitar ou esquecer;
4.º Desviando-me do campo exclusivamente pessoal, justificar mais uma vez a posição dos monárquicos na Assembleia Nacional e acentuar que, ao sermos propostos, não nos foram impostas condições ou qualquer filiação, nem tão-pouco temos deixado de gozar de liberdade de critica e de voto;

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador:-5.º Declarar-me disposto a colaborar nas alterações da Constituição, desde que não dissessem respeito à chefia do Estado;
6.º Concordar que não estava posta a questão do regime,, porque nenhum projecto de alteração foi apresentado a tal respeito, a começar pelo artigo 5.º, onde se determina que ò Estado Português é uma República, e, acrescento agora, podíamos, mas, em contrário do que lá fora muitos imaginam, não devíamos fazê-lo, pois tal procedimento constituía deslealdade para quem propôs a nossa candidatura e para com os republicanos nacionalistas, que, confiando em nós, nos deram o seu voto;

ocorre mesmo ao meu espirito o qualificativo de «traição».

Vozes: - Muito bem, muito bem,!

O Orador:- Por último, entendi que guardar mistério do meu voto podia importar falta de cortesia e de grata camaradagem, de que os meus prezados colegas se me tornaram credores.
Fui sincero e esforcei-me por ser claro e preciso, mas, infelizmente, por complexo meu, não o terei conseguido, pois nem todos reconheceram a delicadeza e os propósitos que me animaram e visavam especialmente à justificação de um natural e possível voto isolado, se, porventura, outros Deputados não pretendessem proceder do mesmo modo.
Quase no final das minhas breves palavras tive a honra de ser interrompido pelo Sr. Doutor Mário de Figueiredo, em termos muito delicados e penhorantes. S. Ex.ª disse, em síntese, que eu, rejeitando o novo artigo 72.º da Constituição, aprovava, implicitamente, o antigo, que também rejeitara em 1951, isto é, votando contra, votava por ...
Ora, salvo o devido respeito, Seguindo por eliminatórias a cadeia de tal raciocínio, também em 1951, votando, como votei, contra o novo artigo 72.º, votava pelo da Constituição de 1933, e votando no plebiscito desta também contra o mesmo artigo 72.º votava pelo correspondente da Constituição de 1911, e, se fosse Deputado às Constituintes deste ano, votando contra o artigo da Constituição de 1911, votava pelo correspondente da Carta Constitucional!
E, é claro, se a maioria dos Deputados votassem no mesmo sentido, teríamos, praticamente, restaurada a Monarquia!
O que, em boa verdade, seria fácil, pois a República, cega pelo delírio fugaz do entusiasmo, esqueceu-se de revogar a Corta Constitucional e alegou que ela o fora pela revolução quando, mais tarde, meu saudoso pai e outros magistrados igualmente Íntegros, aplicaram disposições, dela aliás estranhas a forma política do Governo, por entenderem que as leis não se revogam a tiros de canhão. Do que resultou a sua transferência, como degredados, para as Relações de Goa e Luanda, num manifesto atentado contra a independência do poder judicial.
Mas prossigamos.
Faço ao meu ilustre interpelante a justiça de acreditar que não foi aquele o seu pensamento, assim como S. Ex.ª me fará a de não acreditar que o meu espirito não se poderia deixar arrastar por deduções tão desconcertantes, mas resultantes lógica do seu raciocínio.
Certamente o Sr. Doutor Mário de Figueiredo quis referir-se á consequência directa e objectiva que adviria se a minha atitude fosse adoptada pela maioria dos Deputados, ou seja a prevalência de um artigo mau que se pretendia substituir por outro melhor.
Entrou assim o ilustre. Deputado no domínio da fantasia, e a ela pretendeu sacrificar ideias, princípios e coerência a que uns tantos não estivessem dispostos a renunciar.
E isto depois de, tornando-se mais compreensivo -ia a dizer mais «realista» -, confessar que compreendia a minha posição, fazendo-me, assim, justiça, a que lhe sou grato.
Eis a razão por que guardo para mim a mágoa de, apesar disso, me suporem capaz de vergar a consciência perante o inverosímil ou ao peso de conjecturas mais