20 DE JUNHO DE 1959 1039
Todos VV. Exas. sabem muito bem que o condicionamento é no nosso pais um delicioso regime, que cada um puxa a si como a manta curta, achando-o óptimo quando tapa e péssimo quando destapa, ao mesmo tempo que é um desporto curiosíssimo andar a infringi-lo.
Já cheguei a dizer, não sei se aqui se noutro lugar, que o condicionamento industrial se estava a transformar em atrevimento industrial. Neste modo de ver existem uns hábeis que conseguem arrancar as licenças e outros que fazem as fábricas e pedem depois que lhes não destruam as máquinas.
O Sr. Deputado Carlos Coelho acusou agora o Consórcio Laneiro de Portugal; mas este, por sua vez, há dois ou três anos acusava do mesmo modo os industriais de penteação, muito afins dos outros em defesa dos quais se levantou o Sr. Deputado Carlos Coelho. E, não obstante serem talvez melhores as suas razões, não as viram prevalecer. Ora isto leva-me a concluir aquilo que VV. Exas. já decerto viram, isto é, que se trata de uma disputa de interesses privados.
O Sr. Deputado Carlos Coelho e eu trouxemos aqui aquilo que entendemos que podíamos trazer em defesa daquele interesse que nos parece mais coincidente com o geral. No entanto, entendo que a questão terá de ser apreciada em campo diferente do da Assembleia Nacional e fora do clima emocional que aqui pode criar-se para traduzir na imprensa ou para reagir em qualquer outro lado.
A única coisa que desejo e confiadamente espero é que nesse campo a resolução seja feita acima e à margem de qualquer ideia preconcebida que qualquer pessoa possa tender a levar para lá.
Tenho dito.
Vozes: -Muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Simeão Pinto de Mesquita: - Sr. Presidente: imperativas determinações da minha vida profissional impediram-me de dar advogado por mim em certa acção judicial, e por isso não pude assistir à sessão de ontem desta Assembleia.
Aproveitando o precedente aberto pelo Sr. Deputado Urgel Horta, venho declarar que se aqui estivesse teria votado num sentido diametralmente oposto àquele em que S. Exa. entendeu que deveria ter votado. Esta atitude está de harmonia com as declarações que fiz quando subi à tribuna para discutir na generalidade a proposta de alteração constitucional.
Isso me teria dado na votação satisfação ao gosto que desde as primeiras letras tenho mantido pelo sistema decimal. Mas se esta era a explicação que eu queria dar a V. Exa., por um lado, por outro, desejaria ter podido discutir, apreciar e defender a proposta relativa à alteração da divisão administrativa. que foi por mim apresentada só no sentido de facilitar ao Governo uma acção mais liberta de peias constitucionais.
Dai apenas pude colher uma satisfação moral, uma espécie de prémio de consolação: o verificar-se ainda o argumento de que, desde que se trate do sufrágio e de eleições, o Governo não pode deixar de centralizar.
O Sr. Presidente: -Lembro a V. Exa. que a Assembleia já votou e que, portanto, não se justificam as considerações de V. Exa.
Tem a palavra o Sr. Deputado Franco Falcão.
O Sr. Franco Falcão: - Sr. Presidente: reuniu-se há poucos dias, nesta sempre jovem, formosa e garrida cidade de Lisboa, o n Congresso Luso-Hispano-Ameri-cano-Filipino dos Municípios.
Aqui se concentraram delegados de dezassete países, que puderam deliciar-se com as belezas e a franca hospitalidade da nossa capital, sentir o afecto e a sinceridade das suas gentes e respirar calmamente a atmosfera de trabalho, de ordem e de prosperidade a que uma política fundada na verdade, na moral e na justiça tem sabido conduzir com segurança a Nação Portuguesa.
Mercê de todas estas circunstancias, Lisboa transformou-se nos últimos anos em atraente e sugestivo centro de vida mundana e cosmopolita, ao mesmo tempo que constitui um expressivo e permanente cartaz de colóquios, congressos e exposições, que a tornaram, no campo da divulgação da cultura, do turismo, da ciência e da técnica, uma das capitais de maior projecção internacional.
O Congresso dos Municípios, recentemente reunido no nosso pais, foi mais uma demonstração do carinho que o Governo dispensa a todas as iniciativas que possam de algum modo contribuir para' alargar a cooperação e o intercâmbio com outros povos, com vista não só à manutenção das indispensáveis relações de cortesia e convívio, mas também no interesse de promover estudos e adoptar métodos que possam dar satisfação às exigências sempre crescentes da vida moderna.
Lisboa mais uma vez soube fazer condignamente as honras da casa, com aquela galhardia e distinção que lhe são peculiares, recebendo com nobreza e simpatia os representantes dos municípios de Portugal e do mundo latino, proporcionando-lhes uma estada extremamente agradável, que deixou em cada um dos seus ilustres hóspedes a saudade e a lembrança dos magníficos e felizes momentos vividos na mais sólida camaradagem e vivo espirito de compreensão.
Foram apresentados trabalhos da maior actualidade e discutidas teses do mais palpitante interesse por qualificados congressistas nacionais e estrangeiros.
Todos unidos pelos mesmos saudáveis e nobres sentimentos de defesa dos valores tradicionais, formularam sugestões oportunas e firmaram princípios da mais transcendente importância, tendentes a reintegrar os municípios na pureza das suas realidades históricas e a contribuir para a elevação, dignidade e prestigio da vida municipal.
Verificou-se que todas as conclusões foram unânimes em defender os direitos, as prerrogativas e uma efectiva autonomia dos municípios, aos quais deverão ser facultados os meios para poderem organizar os seus sistemas político - administrativos, em conformidade, é certo, com a concepção orgânica do Estado.
Advogou-se a especialização do funcionalismo e a criação na Universidade de uma cadeira de Direito Municipal, por forma a elevar-se o nível de cultura e de conhecimentos técnicos dos funcionários da administração local.
Não será certamente para nós, Portugueses, este o problema que requer mais pronta e urgente solução.
Antes da especialização, é mister fomentar o estímulo, concedendo aos servidores municipais as remunerações suficientes que lhes garantam um nível de vida compatível com a função e assegurar-lhes as necessárias condições de assistência na doença e na velhice, para que, assim, o interesse de dignificação da pessoa humana sirva de incentivo e constitua factor primordial de zelo, dedicação e estudo no desempenho das respectivas atribuições.
Por outro lado, é necessário que aos municípios seja concedida a tão desejada autonomia política, administrativa e financeira.
O concelho, para poder cumprir a sua missão de progresso local, deve ser considerado como que um pequeno estado, a que não faltam população, território e os adequados órgãos da administração e ao qual não deve