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8 DE JULHO DE 1959 1169

Quanto à questão de fundo da moção, ou seja a parte que chamei afirmativa, se a votamos como representantes da Nação, ferimos as mesmas susceptibilidades, repito, que feriremos votando o preâmbulo.
Não há, pois, razão para não atacar o assunto de frente e dar sentido claro às nossas posições.
Mas porque voto eu o preâmbulo, na forma da proposta de alteração apresentada?
No decorrer da discussão na generalidade e, agora mesmo, na especialidade, foram aduzidas várias razões. Se não as trago de novo, limito-me a enumerar algumas das que pessoalmente me decidiram, depois de repensado o assunto, a assumir uma posição em defesa da invocação, no texto constitucional, do Santo Nome de Deus.
1.º «Se Deus existe -como se escrevia no parecer subsidiário da secção de Interesses espirituais da Câmara Corporativa, por altura da revisão constitucional de 1951 -, há que confessá-lo, reconhecer o seu domínio supremo e prestar-lhe q devido culto. E esta obrigação impende tanto sobre os indivíduos singularmente considerados como sobre o. próprio Estado, que os representa».
Tenho a estranhar que em 1959 a secção de Interesses espirituais não tivesse dado o seu parecer sobre esta matéria da invocação. Acontece mesmo que todos os pareceres da .Câmara Corporativa relacionados com a presente revisão constitucional foram sómente e sempre subscritos pelo mesmo grupo de muito Dignos Procuradores. Ora, talvez tivesse sido de interesse que outros Procuradores tivessem sido agregados. Exemplifico com representantes da imprensa relativamente ao projecto do Deputado Carlos Moreira que se refere a tal matéria.
Não creio, porém, que de 1951 para cá se tivessem alterado as condições que levaram a secção de Interesses espirituais de então a advogar a proclamação do nome de Deus. Antes pelo contrário.
Mas andamos nós a esgrimir com moinhos de vento ou a brincar às Constituições? Creio que a invocação do Santo Nome de Deus é feita nas Constituições de muitos países.
Umas vezes a invocação faz-se de uma forma simples. Por exemplo: «Em nome de Deus Todo Poderoso».
É o caso das Constituições do Chile de 1925, da Suíça de 1874 e dos cantões da Confederação Helvética de Friburgo (1857), Unterwald le hant (1902), Uri (1888) e Valais (1907).
Outras vezes a invocação completa-se na referência a certos atributos da Divindade.
Ë o caso das Constituições da Áustria de 1934, da Colômbia de 1886, do Paraguai de 1870 e do Irão de 1906. A própria Etiópia invocava o Santo Nome de Deus na Constituição em vigor antes 4a anexação à Itália.
Verifica-se assim que países de todos os continentes e nas mais variadas épocas dos tempos modernos invocam o nome. de Deus nos seus diplomas constitucionais.
Mas a enumeração não foi exaustiva.
As Constituições dê grande número de estados da União Americana também invocam o nome de Deus (Alabama -1901; Arizona, 1912; Arcansas, 1874; Califórnia, 1879; Colorado, 1876; Connecticut, 1818; Delaware, 1897; Florida, 1885; Geórgia, 1887; Idaho, 1890; Ilinóis, 1870; Indiana, 1851; Iowa, 1857; Cansas, 1859; Kentucky, 1891; Luisiana, 1913; Maine, 1819; Marilândia, 1867; Massachusetts, 1780; Michi-gão, 1908; Minesota, 1875; Mississipi, 1890; Missuri, 1875; Montana, 1889; Nebrasca, 1875; Nova Jérsia, 1844; Novo México, 1912; Nova Iorque, 1894; Dacota do Norte, 1889; Carolina do Norte, 1876; Oaio, 1912; Oklahoma, 1907; Pensilvânia, 1873; Rhode Island, 1842; Carolina do Sul, 1895; Dacota do Sul, 1889; Texas, 1876; Utá, 1895; Virgínia, 1902; Washington, 1889; Wisconsin, 1848, e Wyoming, 1889), exprimindo nesse preâmbulo sentimentos de gratidão para com a Divindade pelas liberdades de que gozam esses mesmos estados.
Esta prática tem, aliás, fundamentos bem longínquos. A Magna Carta inglesa, que data de 1225, formulava já em seu preâmbulo uma prece, exprimindo um acto de confiança em Deus (cf. a obra de Valérien Meys-ztowicz, La Religion dans les Constitutions des Etats Modernes, Roma, 1938).
2.º O texto das concordatas celebradas entre a Santa Sé e os Estados começa sempre por invocar a Santíssima Trindade (cf., por exemplo, as obras Raccolta di Concordati, de Angelo Mercati (Roma, 1919) e Concordata regnante sanctissimo domino Pio XI (Roma, 1934).
Esta prática verifica-se, aliás, nas concordatas celebradas entre a Santa Sé e Portugal, de que é exemplo mais recente a de 1940, já do tempo do Estado Novo (cf. por exemplo, a compilação em Libânio Borges, Concordatas e Concórdias Portuguesas) e que foi tão dignamente negociada pelo Sr. Prof. Mário de Figueiredo.
Ora as concordatas são instrumentos de direito internacional, o que, em dada medida, dá especial importância à invocação preambular contida nas mesmas.
3.º Também o nosso ilustre colega Dr. Agostinho Gomes demonstrou, na discussão na generalidade, e com que brilhantismo!, que as leis do Vaticano de 7 de Junho de 1929 não poderiam servir o argumento que a Câmara Corporativa pretendia tirar das mesmas.
Subsiste assim a ideia de quê a importância da inserção de um preâmbulo é revelada, quanto ao Estado do Vaticano, nas concordatas que celebra.
4.º E que dizer da prática tradicional portuguesa?
A. primeira Constituição escrita portuguesa dos tempos modernos, a de 1822, invocava a Santíssima Trindade.
Cai assim o argumento da Câmara Corporativa de que não há tradição.
Poderíamos, de resto, anotar aqui o seguinte: a Constituição de 1822 é a mais liberal de todas as Constituições portuguesas. Pois a mais liberal, ainda assim, invoca Deus.
Para a atitude tomada em 1822 podemos encontrar duas explicações:
1.ª Os que consagraram a invocação fizeram-no compenetrados da excelência de tal atitude. Sendo assim, temos de os louvar.
2.ª A invocação fez-se de má vontade mas fez-se.
E isto porquê? E que o legislador, não obstante o espírito contrário à nossa tradição que seguiu nas outras disposições, sentiu que o peso da presença de Deus era tamanho na tradição portuguesa e a invocação se impunha tão forçosamente que não conseguiu fugir a tal exigência da consciência nacional.
Mas aqui poderia até surgir outra dúvida: não ouvimos nós proclamar que um século de liberalismo em Portugal cortou com as tradições seculares da Nação? Não se diz que o Estado Novo reconduziu Portugal à linha das suas tradições? A que propósito, pois, a Câmara Corporativa invoca a tradição de um período que se considera em oposição às nossas tradições?
5.ª Também não me convenceu a falta de unidade religiosa da Nação Portuguesa, no argumento da Cá-