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DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 131 1164

da Constituição fique uma determinada invocação, somos contra Deus.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Não Nós somos por Deus O que entendemos é que não podemos, num documento que se dirige a todos os portugueses, impor a invocação de um certo Deus mesmo àqueles que o não sigam ou fazer a invocação inútil e, como demonstrei, perturbadora de um Deus sem doutrina, que admite que o Estado se oriente na sua actividade por qualquer doutrina e até que tome uma atitude neutral Estas as razões por que, Sr Presidente, peço licença para mandar para a Mesa a seguinte moção, em que peremptoriamente se afirma o reconhecimento de Deus como fonte de poder, da justiça e da moral, de uma justiça e de uma moral transcendentes, heteronomas, não de uma justiça ou de uma moral imanentes
Envio, pois, para a Mesa a seguinte.

Moção

«A Assembleia Nacional
Considerando que não está a elaborar uma Constituição Política nova e tão-somente a rever o texto da Constituição vigente;
Considerando que a revisão em curso, como consta da proposta e dos projectos apresentados, não toca nos princípios de ordem política, social, económica e espiritual que informam o actual estatuto constitucional:
Afirma nesta moção o seu profundo respeito por tudo quanto Deus representa como fonte e origem do poder, fundamento da moral e da justiça nas relações humanas, e presta homenagem às intenções dos signatários do projecto de preâmbulo

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 7 de Julho de 1959. - O Deputado, Mário de Figueiredo».

O Sr Simeão Pinto de Mesquita: - Sr. Presidente pedi a palavra, em primeiro lugar, para uma questão prévia resultante do próprio Regimento desta Assembleia e que me parece estar nos termos precisos do mesmo Regimento, que prevê, realmente, a apresentação de moções como termo da discussão de avisos prévios.
É o § 2 º do artigo 49.º, quando trata de avisos prévios, e que diz o seguinte.
Leu.
De maneira que a apresentação de moções está prevista especificamente para o caso dos avisos prévios.
Quando se trata de uma proposta de lei ou de um projecto, não me parece que se preveja a apresentação de moções, e, nestas condições, eu ponho a questão prévia, independentemente de a moção apresentada ser admitida ou não. No caso de o ser, pergunto o seguinte, se a moção apresentada tender ao objectivo de prejudicar o projecto de lei, podei á atingir essa finalidade? É isto que desejo saber, paia depois me pronunciar sobre as palavras do Sr Deputado Mário de Figueiredo.

O Sr. Presidente: -O § 2.º do artigo 49º do Regimento prevê para os avisos prévios a possibilidade de terminarem por uma moção, mas nem ali nem noutra disposição se proíbe a apresentação de moções noutro terreno, como o da discussão das propostas ou projectos de lei Aquela possibilidade contemplada para os avisos prévios não importa a proibição das moções durante a discussão das leis. E a tradição repetida nesta Assembleia é precisamente esta jurisprudência que consagra Está assim respondida a primeira interrogação de V. Ex.ª.
Quanto à segunda interrogação, a admissão da moção não prejudica a votação do preâmbulo com a proposta de substituição que foi apresentada Ás moções são afirmações de princípios, de aspirações, muitas vezes necessárias nas assembleias políticas, mas não podem substituir as deliberações sobre textos de lei submetidos à sua apreciação Fica assim esclarecida a segunda interrogação de V. Ex.ª
Continuam em discussão o artigo l º, a proposta de substituição e a moção do Sr Deputado Mário de Figueiredo.

O Sr Simeão Pinto de Mesquita: - Muito obrigado a V. Ex.ª, Sr Presidente
Em primeiro lugar, cumpre-me respeitar as explicações do Sr. Deputado Mário de Figueiredo, como cristão e como defensor de Deus Em todo o caso, as suas razões de que o nome de Deus no texto constitucional não pode conduzir a coisa nenhuma na prática, de positivo, de benéfico, inclusivamente para a Igreja e mesmo para outras religiões que assentam na existência de um Ser Supremo, criador s senhor do Mundo, não me parece que convençam, visto que essa inclusão teria uma repercussão reconfortante, ampla, receptível, na consciência nacional, na de todo o mundo português.
Sobre esta matéria já falaram pessoas idóneas e categorizadas, como os venerandos sacerdotes que se pronuncia iam sobre ela, de maneira que não quero alargar a discussão senão para apreciar uma interpretação, que não me parece, de maneira nenhuma, consequente.
Compreendo perfeitamente que em 1933, quando da plebiscitação da Constituição, a matéria não fosse introduzida nela, em virtude de não ter sido lembrada, por premente ou por razões políticas determinadas por factos e circunstâncias ainda muito próximos Mas o Mundo tomou, de então paia cá, aspectos gravíssimos, no sentido de se formar um movimento de ateísmo militante, que não existia nessa altura, pelo menos com a força actual, como bem resulta das informações dadas pelo Sr Presidente do Conselho e, nesta Câmara, pelo Sr Deputado André Navarro.
De maneira que há uma razão particularmente actuante, impulsionadora; no sentido de uma afirmação de Deus, que não havia em 1933 é exactamente essa agressão militante do ateísmo Em foce dela, nós vemos que na Constituição se marcou bem a orientação tradicional cristã e católica do espírito português, e isso representa grande triunfo sobre o que vinha de trás! Está bem marcada, mas, em todo o caso, é uma coisa que se respeita e anima, mas que se passa um pouco como que por fora, objectivamente, e não interiormente vivida. Pelo contrário, esta afirmação preambular, positiva, da invocação de Deus, não se limita a significação que parece atribuir-lhe q Sr. Dr. Mário de Figueiredo, de uma espécie de Deus vazio, que não significa coisa nenhuma- o Deus doa teístas do século XVIII; ora as coisas hoje não suo assim
E paia o demonstrar vou, ao gosto da sua dialéctica, exemplificar com um caso
Suponhamos que estávamos não em 1959, mas em 1822, a discutir a correspondente Constituição. Suponhamos, por hipótese, que nessa altura, quando se discutia o sabido preâmbulo da Santíssima Trindade, aliás aplaudido pelos livres-pensadores iniciadores do movimento, aparecia um Deputado que, na lógica da sua ideologia, reclamava que não deveria evocar-se a Santíssima Trindade, mas simplesmente Deus. Em tais circunstâncias essa invocação de Deus teria o puro aspecto teísta, próprio da filosofia dá época e que se