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8 DE JULHO DE 1959 1163

Foi lida. É a seguinte

«Proposta do substituição

Propomos que o artigo 1.º 4o projecto de lei n.º 23 tenha a seguinte redacção:

No princípio da sua lei fundamental a Nação Portuguesa invoca o nome de Deus.

Assembleia Nacional, 7 de Julho de 1959. - Os Deputados: José Guilherme de Melo e Castro - Maria Margarida Craveiro Lopes dos Reis - Duarte do Amaral - João de Brito e Cunha - António Pereira de Lacerda - José Fernando Nunes Barata - Américo da Costa Ramalho - António Carlos dos Santos Fernandes Lima - José Gonçalves de Araújo Novo».

O Sr. Carlos Moreira: - Sr. Presidente e Srs. Deputados, ao tomar parte na discussão na generalidade do projecto de lei que tive a honra de subscrever com outros Srs Deputados tive ocasião de, a respeito da matéria deste artigo, afirmar que se tratava de matéria que não precisava de justificação. Aliás, o assunto foi versado com brilho e com largueza por todos os ilustres Deputados que dele se ocuparam.
Nós, Sr. Presidente, afirmamos Deus, não discutimos Deus.
Vejo, Sr. Presidente, que na Mesa se encontra uma proposta com a mesma ou semelhante intenção, subscrita pelo ilustre Deputado Melo e Castro e outros Srs. Deputados.
Sem embargo de ver suprimida uma pequena parte que, julgo, apontava uma razão forte, a da fidelidade à fé em que nascemos e nos engrandecemos, repito, sem embargo da falta dessa- afirmação, pequena no número de palavras, mas grande na realidade do seu sentido histórico da espiritualidade portuguesa, a nova redacção proposta é aceitável.
Nestas circunstâncias, por mim, e julgando interpretar o sentimento de todos quantos subscreveram comigo o projecto, aceito a proposta de substituição, porque, na essência, é a mesma, só divergindo na forma. E como só a essência nos interessa, sobretudo em matéria desta magnitude, pondo de lado a forma, aceito a proposta de substituição.
Tenho dito.

O Sr Mário de Figueiredo: - Sr. Presidente: é com grande constrangimento que vou discutir a matéria agora posta para exame da Assembleia. Graças a Deus sou católico, na fé de Cristo nasci e na fé de Cristo desejo morrer.
Isto quer dizer que, no plano individual, nada posso objectar ao que no artigo em discussão se contém.
Mas não é no plano individual que a questão tem de ser considerada. E no plano político.
E neste plano, se não posso tomar posições que contrariem a minha consciência, também não devo tomar aquelas que possam magoar a consciência dos outros.
A minha consciência não me obriga a votar que, no pórtico da Constituição, se invoque o nome de Deus, mesmo porque essa invocação não tem, por si, nenhuns reflexos no texto constitucional.
Só poderá tê-los na medida em que apontar para determinada doutrina, para determinada religião.
Significará então que nas instituições e nas leu o Estado deverá não só manter-se fiel ao espírito dessa religião, mas não permitir que seja legalmente possível a prática de netos ou a constituição de estados contrários à mesma religião. Entendida assim, a fórmula proposta conduziria a que a Constituição não é para todos os portugueses, mas só para uma parte deles, embora esta parte seja a grande maioria. Além de que seria uma expressão de violência sobre os consciências. Foi certamente diante da lógica destas consequências que pessoa particularmente qualificada na matéria sugeriu, da tribuna, a modificação da fórmula da proposta em termos de se não apontar para um Deus cujo conhecimento é iluminado pelas luzes da revelação, mas para Aquele a cujo conhecimento pode chegar-se só pela luz da razão.
Nesta orientação está a proposta de substituição agora apresentada.
Assim, o que se invoca é um Deus sem doutrina ou cuja doutrina é a que foi esculpida na própria natureza humana e a integra. A doutrina será a lei natural, sujeita à diversidade de interpretações a que necessariamente conduz o vário nível do conhecimento dos valores religiosos e morais, no espaço e no tempo.
Parece-me evidente que a invocação nestes termos não só não pode conduzir a nada de útil, mas até pode levar a soluções contraditórias na estruturação das instituições e das leis. Não obriga a seguir, nessa estruturação, nem a doutrina cristã, nem a maometana, nem a budista, mas admite que se siga qualquer delas. Admite que o Estado tome uma atitude confessional, mas tanto pode ser cristão, como maometano, etc. E admito que o Estado, guardado o respeito pelo direito natural, conforme a interpretação a que, no estado actual da civilização, se chegou da lei natural, tome uma atitude neutral.
Por mim, sou contra o Estado neutral, além do mais, porque julgo impossível que actue sem uma concepção o homem e da vida. A concepção do homem e da vida procede, segundo creio, da esfera religiosa.
A esfera religiosa abarca o social e o domínio da consciência individual Porque abarca o social, o Estado não pode desinteressar-se dela; porque toca a consciência individual, o Estado não pode impô-la. Só pode propô-la.
Entendo que o Estado Português deve adoptar como fundamento da sua actuação a concepção cristã da vida e do homem; mas não pode impô-la, de modo a violentar as consciências individuais.
Sou, por isso, contra a fórmula do projecto, que, apontando para a concepção cristã da vida, pode agravar, num documento que a todos respeita, a consciência de alguns milhões de portugueses; e sou contra a fórmula sugerida em substituição daquela, porque, além de aceitar como possível uma atitude neutral do Estado, admite como possíveis soluções contraditórias.
Creio que assim não sou contra Deus, mas por Deus; não sou pelo materialismo da foice e do martelo, mas pela civilização cristã; não sou agnóstico, mas crente
Creio mesmo que, procedendo assim, estou a defender os interesses da igreja católica em Portugal.
Não sou contra Deus. Nenhum de nós nesta Casa é contra Deus.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Mas importa, dadas as interpretações que têm sido dadas à atitude atribuída a certos Deputados, que isso fique afirmado por decisão da Assembleia. Como todos somos católicos, ou todos cremos em Deus, ou todos temos um fundo cristão, podemos, individualmente e no conjunto, reconhecer e afirmar Deus, o seu valor como fonte da justiça e da moral, o seu valor como fundamento do poder. Nada nos impede de o fazer. Feito uso, creio que ninguém poderá acoimar-nos ou declarar que nós, porque não votamos que no pórtico