12 DE DEZEMBRO DE 1959 171
E porquê? E natural que as maiores habilitações apoiem um legítimo desejo de melhoria da condição social. Mas não terá um ensino planificado, desconhecedor das realidades e necessidades regionais, reforçado a tendência para o urbanismo?
O problema agravar-se-ia, de resto, com a extensão da escolaridade obrigatória se porventura se mantivesse a mesma orientação em métodos e planos de estudo.
Outro exemplo.
O aumento de indivíduos com o curso dos liceus projectar-se-á na populacho universitária E natural, porém, que as Universidades apenas admitam uma certa percentagem dos novos candidatos Poderão as profissões não manuais absorver todos os diplomados com o curso dos liceus que não entraram nos cursos superiores? Estarão estes diplomados dispostos a voltar às oficinas ou às explorações agrícolas?
A consciência da missão civilizadora de Portugal e as dia a dia mais importantes necessidades do ultramar português impõem, aliás, que o ensino se processe tendo em conta a satisfação destas exigências. Formar portugueses alia-se assim à ideia de preparação de técnicos paia as tarefas de fomento do ultramar Será grave omissão desconhecer estes imperativos
Sr Presidente- a quebra no isolamento dos povos reflectiu-se favoravelmente nas Universidades As permutas entre professores ou entre estudantes, as reuniões internacionais, etc , são realidades do intercâmbio universitário úteis à valorização destas instituições.
É costume reduzir a quatro os conceitos de Universidade corporativo, humanístico, estatista e técnico.
No conceito técnico revela-se o profissional, servo da sua especialidade Este é, infelizmente, o conceito dominante entre nós, embora não beneficiemos grandemente da sua principal virtude - a investigação científica.
Mas a Universidade não pode viver exclusivamente ligada à preocupação utilitária
Tem-se repetido que nas nossas escolas superiores a informação pôs de parte a formação Um ensino teórico s divorciado da vida dá aos escoltares uma visão unilateral dos problemas, roubando-lhes desejável capacidade crítica. A grande ambição resume-se à passagem nos exames, o que se obtém correspondendo às exigências de uma sebenta que muitas vezes, infelizmente, é também produto de um labor cristalizado
Importa reformar a Universidade portuguesa. Este é o anseio legítimo dos seus mestres ilustres
Convencido da importância de tal problema, e por homenagem a tantos professores que ao assunto têm dado a sua dedicação, passarei a socorrer-me de depoimentos que bem merecem larga expansão entre nós.
A Idade Média resumiu no modelo de Bolonha, escola essencialmente jurídica, e no modelo de Paris, escola predominantemente teológica, os dois tipos de Universidade então dominantes. D Dinis, ao criar a Universidade portuguesa, inspirou-se principalmente no modelo bolonhês. A instituição ganhou um marcado cunho estudantil, que perduraria através dos tempos
A Universidade - como anota o Prof Galvão Teles- era uma corporação porque, além de carácter institucional, gozava de completa independência governativa, administrativa s judicial Fazia os seus estatutos, escolhia os seus órgãos, designava os seus professores, traçava as directrizes superiores da sua vida.
Presentemente a Universidade portuguesa possui ainda vestígios dessa autonomia No fundo, porém, não possa de um serviço público personalizado.
E o citado professor acrescenta-
A Universidade vai perdendo a sua alma A consciência universitária vai-se diluindo, e . com ela a capacidade de determinação, o sentimento de responsabilidade, a diligente coragem de encarar e resolvei os próprios problemas, sem cómoda devolução a uma instância superior.
Órgãos universitários vão mirrando, na esterilidade que traz a falta de exercício da função, muitas vezes inferior de longe ao que pomposamente consta de papel da lei, mas que se não pratica
Tive oportunidade, no Verão findo, de fazer parte da representação portuguesa ao XI Congresso Internacional de Ciências Administrativas, em Wiesbaden. Um dos temas do Congresso reportava-se à devolução de podei es às instituições universitárias Constatei, com pesar, que países bem longe da concepção corporativa do Estado guardavam um conceito institucional da Universidade que nos faria inveja
Na reunião plenária da Câmara Corporativa de 25 de Novembro findo disse o seu ilustre presidente que se pode afirmar encontrar-se completada a organização corporativa das actividades económicas
Há anos, numa entrevista célebre a Christine Garnier, declarou o Si. Presidente do Conselho que a economia não pode ser a tarefa n º l de um governo; há outros valores, os valores espirituais, que estão num nível mais alto do que a economia.
Creio assim ser oportuno e urgente encarar em Portugal a criação das corporações das actividades espirituais. Ora, como acentuou o Prof Braga da Cruz, se há instituição que seja fácil de reconduzir ao sistema corporativo, essa é, mais do que nenhuma outra, a Universidade
A Universidade não pode esquecer o aluno, que deverá ser uma peça essencial da sua estrutura, o objectivo n.º l da sua actuação
Mesmo para lá da sua integração institucional, Lá todo um conjunto de problemas que urge encarar. Exemplifico na ordem imediata com. a alimentação, o alojamento, a educação física, a saúde e assistência. Por outro lado, as organizações circum-escolares exercerão uma função supletiva naquelas matérias de cultura geral que não podem brotar directamente dos bancos da escola
Seria grave injustiça fazer tábua rasa do que se tem realizado nestes sectores Em notável parecer da Câmara Corporativa, elaborado em 1957, o Prof Braga da Cruz fez um elucidativo inventário do que existe, ao mesmo tempo que discutiu soluções futuras
Deter-me-ei em três questões, de importância especial a gratuitidade do ensino, a escolha da carreira e o problema do encargo.
Ouve-se habitualmente afirmar que o ensino deve ser facilitado aos mais dotados, independentemente da sua condição social Este princípio, que o senso comum aplaude, é contrariado pelas disponibilidades económicas de possíveis candidatos às escolas superiores. Assim, para lá dos meios indirectos da melhoria de situação das classes débeis, importa alargar o actual sistema de benefícios escolares - aumento e actualização de bolsas de estudo, de isenções e de reduções de propinas e melhor estruturação de obras de camaradagem.
A fazer fé na minha experiência ou no conhecimento que tive nos anos de convivência escolar, há muito de emocional, ou até de irracional, na escolha da carreira Ainda aqui o Português se furta ao apoio que organismos especializados poderiam dar a decisões que determinam um destino