20 DE JANEIRO DE 1960 263
singulares perspectivas e contrastes, os seus valores artísticos e folclóricos, constituem, em potência, um rico património para o fomento turístico.
Dizia em editorial de há dias o Século, sempre atento aos grandes temas de interesse nacional, que não chegava ao Algarve «exultar as belezas, os encantos, os atractivos da Praia da Rocha, de Lagos, de Sagres, de S. Vicente, de Monchique, de Loulé, de S. Brás, de Albufeira, de Faro e de Olhão».
O Algarve reúne, realmente, condições excepcionais para um turismo em larga escala, mas não pude atingi-lo enquanto não surgirem iniciativas públicas e privadas, empreendimentos capazes de alterar a sua fisionomia actual em matéria de equipamento hoteleiro, de transportes, de comunicações.
A província do Algarve, para ser considerada no plano do fomento turístico, precisa, em primeiro lugar, tornar-se mais acessível, mais «próxima» dos grandes entroncamentos migratórios. Entalada entre o Alentejo e o mar, com serranias nuas e daninhas de permeio, os Algarvios sentem-se dominados pelo seu condicionalismo geográfico.
O seu magnífico portuguesismo, tão exuberantemente demonstrado ainda há bem pouco tempo quando da visita que o Chefe do Estado fez ao Algarve por ocasião da inauguração da barragem do Alvor, resiste à adversidade geográfica e espera e confia em dias melhores.
Chega a enternecer o amor e desvelo que o Algarvio mostra pela sua terra.
Exalta sistematicamente as virtudes dos seus filhos, proclama a beleza dos seus recantos como quem se ergue para alcançar uma evidência, uma irradiação e uma notoriedade que lhe traga mais ampla presença nacional e internacional.
O Algarvio está ciente e consciente de que detém um precioso património de turismo.
Os semanários regionais algarvios tocam sistematicamente, com uma perseverança digna de registo, o problema do turismo algarvio. Põem-no à frente das suas reivindicações como a expressão porventura mais viva da sua problemática regional.
Mas ao pôr o problema turístico estão, e bem, a assinalar implicitamente a necessidade de uma gama de soluções que constitui, a bem dizer, a sua infra-estrutura regional, elemento básico de toda uma economia.
O povoamento florestal, para a defesa do seu clima e da sua terra arável, que tão estreita e insuficiente se vai tornando para o agricultor, a conclusão do plano de irrigação hidroagrícola, o ordenamento da sua produção e comercialização frutícola, a defesa da sua actividade piscatória e conserveira, o alargamento da sua rede de esgotos e de electrificação, a maior frequência dos transportes ferroviários que ligam a província ao Norte, a construção de um aeroporto, de um porto acostável por barcos de grande calado, o instante pedido de construção de hotéis, são um conjunto de solicitações que denuncia um estado de coisas e de espírito a requerer desvelada atenção de quem possa impulsionar, em movimento ordenado e coordenado, a concepção e rápida execução de um plano de reordena mento da estrutura e infra-estrutura regional do Algarve.
Poder-se-á dizer, porventura com verdade, que hoje tudo se pretende resolver através de uma política de planeamento, mas o certo é que, quando se verifica a conjugação de factores como aqueles que concorrem no caso algarvio, a traduzir uma comunidade humana peculiar, caracterizadamente coesa na sua tradição de vida activa, há que olhar coordenadamente o quadro político regional como um todo interligado por estreito encadeamento de interesses, actividades e ocupações.
Quando se encontra, como no Algarve, uma comunidade humana tão definida e diferenciada, em que todos e cada um tom os olhos postos e a atenção presa às vicissitudes da sua unidade económico-social, pode encontrar-se, através da ordem política, um interlocutor qualificado e receptivo para cooperar, numa acção conjugada e objectiva, em ordem ao desenvolvimento harmónico regional.
Todo o algarvio sente no seu espírito e na sua fazenda, como se fora coisa de cada um deles, independentemente da actividade a que se dedica, o problema da pesca, o das conservas, o da fruticultura, o do turismo.
É possível e é indispensável, por isso, trazer as camadas responsáveis do Algarve, que tão generosa e meritòriamente contribuem em tantos sectores para o engrandecimento da Pátria, ao campo de uma mais íntima convivência com o sector público no sentido de estabelecer um planeamento regional ordenado e unitário.
Este é um dos pontos que se considera fundamental no quadro político-económico do Algarve como forma de ali fazer incidir um movimento mais eficaz do que aquele que avulsamente se suscita, tantas vezes ao sabor de factores de circunstância que não chegam a atingir o fulcro, o cerne da sua complexa problemática regional.
Sr. Presidente: propus-me tratar do problema hoteleiro do Algarve e deixei-me enlear pela problemática genérica da região. Fi-lo, porém, de caso pensado, na medida em que reconheço não ser possível nos dias de hoje confinar as nossas reflexões políticas e perspectivas imediatas.
Todos os exames de problemas económicos que envolvam dimensão à escala nacional devem articular-se na sistemática consideração dos factores regionais, na detida interpretação do meio humano onde se processa uma vida de relação intensiva, pela interdependência de interesses que lhe estão subjacentes. Aí estão os elementos básicos para polarizar e estimular a vontade e o comportamento activo dos particulares que se dispõem a suportar o risco dos empreendimentos de interesse nacional.
A presente, situação em matéria de hotéis e pensões na província do Algarve é verdadeiramente lamentável. Apenas 1 hotel de 1.ª classe, com 29 quartos, 18 dos quais com casa de banho privativa, e 2 hotéis de 2.ª classe, com um total de 81 quartos, dos quais sòmente 15 com casa de banho privativa.
Para além disto, apenas 28 pensões, sendo 2 de 1.ª classe, com um total de 50 quartos, dos quais com casa de banho privativa, 7 de 2.ª classe, com um total de 106 quartos, dos quais 5 com casa de banho, e 19 de 3.ª classe, com 208 quartos. A acrescer a este restrito e modesto elenco de unidades de alojamento apenas mais 1 estalagem, com 11 quartos e somente 1 casa de banho privativa.
Se, ao lado disto, observarmos o total de saídas e entradas de turistas estrangeiros que se verificou, por exemplo, no ano de 1957 pelo posto fronteiriço de Vila Real de Santo António, atingiremos um número da ordem dos 52 000.
Quantos por falta de alojamentos não permaneceram no Algarve?
O quadro é, na verdade, viva expressão de uma dolorosa insuficiência, que só um esforço gigantesco pode modificar.
É certo que estão em curso algumas iniciativas de incontroverso interesse para modificar o actual estado de coisas. Já se lhe chamou mesmo, com certa propriedade, «a operação Algarve».