610 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 167
Nova Deli, alheio ao sentimento do ridículo, caberia essa hipótese delirante de o minúsculo território de Goa, com meio milhão de habitantes, constituir uma ameaça para a segurança do subcontinente indostânico!
Também não se podaria invocar a dógica da exigência de uma continuidade nacional geográfica, que nem tinha tradições na história nem correspondia às realidades actuais, bem evidentes na própria Índia.
E muito menos uma unidade cultural, pois o Primeiro-Ministro Nehru prometia, quando fizesse a tal incorporação de Goa, preservar a sua cultura portuguesa, cultura bem diferente de todas as outras imensas microcultura que pululam na União.
Quero crer que muitos dos seus homens de bom senso, que felizmente lá vivem, desaprovariam esses processos; que a grande massa dos habitantes daquele imenso país nada tinha que ver com este caso, mais ocupada com os seus males e as suas misérias - males e misérias que a nós próprios confrangem ; que a maioria das populações fronteiriças, de há séculos habituada a tratar familiarmente connosco e até ligada aos territórios portugueses por interesses de vária ordem, haveria de desaprovar as hostilidades de que também sofria as consequências. Mas, ao mesmo tempo, também sabemos de personalidades responsáveis, algumas em situação de especial melindre, que levianamente se empenharam nessa campanha, que, afinal, só prejuízos lhes poderia acarretar.
Não é agora ocasião de desenvolver mais este ponto. Mas basta dizer que todos aqueles que, ocupando postos de chefia na expansão da moral e da cultura ocidentais, actuaram de modo a apoiar o movimento contra a libertação de Goa - Goa, que é o mais alto farol da civilização cristã e ocidental no Oriento - contribuíram dessa forma para a própria destruição. Assim o devem ter compreendido algumas figuras destacadas, mesmo no meio católico da União Indian-a. Assim o compreendesse também o próprio Governo da União Indiana, que tão ligeiramente se embrenhou no terreno, que parecia fácil, dos apetites anexionistas, sem se lembrar que dessa forma perderia a força moral para resistir a arremetidas semelhantes dos seus poderosos vizinhos.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - Todavia, hoje, mais bem esclarecidos, ou qualquer que seja a sua posição perante os acontecimentos, a que não podem é deixar de reconhecer os resultados negativos que alcançaram.
Do nosso lado, e felizmente pelo contrário, foram evidentes os benefícios.
Em primeiro lugar, desde o primeiro dia da primeira ameaça, um movimento unânime de protesto se levantou um toda a Nação Portuguesa, de Trás-os-Montes a Timor, todos igualmente ciosos dos direitos da Nação, todos igualmente dispostos a tudo sacrificar para defesa da liberdade dos seus irmãos da índia Portuguesa. Nesse sentimento patriótico não se distinguiram classes nem confissões políticas ou religiosas, nem origens raciais ou geográficas. Foi esse, afinal, um bom serviço prestado à unidade nacional, que dessa forma deu a marca estridente e entusiástica da sua existência efectiva, como sempre que se trata dos grandes problemas da Nação.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - Tudo se fez para defender a Índia. Além da maravilhosa actuação diplomática que esclareceu o Mundo e o notável esforço no campo da defesa militar, para o que têm sido suportados pesados encargos, sobretudo pelo orçamento do Governo Central, houve que promover a mais variada actividade em todos os sectores, de modo a manter sem desfalecimentos a normalidade da vida à nossa gente da Índia, frustrando imediatamente todas as manobras lesivas da sua existência. Combate de dia a dia, hora a hora, sem tréguas, mas sempre confiante e sempre eficaz.
Privados de ligações com os territórios vizinhos, tivemos de construir aeroportos em Goa, Damão e Diu; adquirir aviões e organizar carreiras; hoje, os aviões da Índia Portuguesa fazem não só as ligações regulares entre Goa, Damão e Diu, como estendem as suas linhas a Karachi e a Lisboa.
Organizou-se uma linha de navegação marítima regular entre Lisboa, Índia e Extremo Oriente, além das que também se estabeleceram da Índia com Moçambique e entre Goa, Damão e Diu. Desenvolvidas as pesquisas e exploração de minérios de manganês e de ferro - este último, de 50 000 t anuais, passou agora para mais de 3 milhões, e encaram-se já os 6 milhões -, houve que melhorar as condições do porto de Mormugão, cuja administração, bem como a do caminho de ferro, passou a ser feita por nós. Novos cais, moderno equipamento, mais batelões e um carregador de minérios, que em 24 horas carrega um navio - em contraste com as semanas, e até meses, que chegaram a ter de esperar. Mecanizaram-se as minas, fez-se um estaleiro naval. Mormugão é hoje o terceiro porto português quanto a tráfego, e prepara-se mesmo para ocupar o segundo lugar. Decorre neste momento o resgate do caminho de ferro e porto da companhia inglesa que os construiu e detinha na directa dependência.
Algumas indústrias, embora incipientes, se robusteceram as outras foram introduzidas. Por seu lado, a agricultura foi modernizada e sobretudo, intensificada. As obras de rega de Parodá e Caiideapar entraram um funcionamento. Uma missão de agrónomos deslocou-se a Goa e promoveu estudos de aperfeiçoamento agrícola. As actividades da pesca, prejudicadas pela União Indiana em Damão e Diu. foram remodeladas e reforçadas com novas unidades enviadas do Lisboa, e que desenvolvem a sua acção em Goa, onde também foi instalada uma fábrica. Missões de biologia marítima e de hidrografia completam o estudo e conhecimento do litoral da Índia. Grandes empreendimentos para o abastecimento de água a Goa, Pondá, Margão, Vasco da Gania e Mormugão já tiveram completa realização. Novas correntes comerciais, diferentes do curso normal da União Indiana, foram estabelecidas, por necessidade imperiosa, mas que afinal resultaram de muito maior utilidade para a economia da nossa índia. A emigração, que só orientava tradicionalmente para a União Indiana, onde era justamente apreciada como elemento de progresso procurou novos destinos e encaminhou-se mais para as províncias portuguesas de África, que lhos abriram os seus braços. Novas escolas técnicas, remodelação do ensino, medidas de toda a ordem, contribuíram para aperfeiçoar as notáveis capacidades da nossa gente da Índia.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Construções hospitalares e hoteleiras, obras públicas várias, restauro de monumentos, tudo concorria para por toda a parte dar trabalho, promover o bem-estar e a prosperidade de todos os habitantes, em contraste flagrante com o que se passa na União; o desemprego em Goa não existe. Uma mais intensa vida de relações se estabeleceu entre os portugueses do