804 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 174
através da instalação de unia rede de destilaria cooperativas.
Era este o panorama do problema até u publicação da Portaria n.º 17 624, de 16 do corrente, em que se municia a criação de uma comissão destinada a procurar outras matérias-primas para o fabrico de álcool.
Não está no nosso espírito a discordância com o Ministério da Economia, no sentido de que se procure obter álcool mais barato. Na nossa linha de preocupações encontram-se os problemas de concorrência que a adesão a Associação Europeia do Comércio Livre vem criar à economia nacional. Devemos ainda observar que, mesmo sem essa razão presente, entendemos que o objectivo da nossa produção deve ser orientado na obtenção dos melhores preços para os produtos fabricados, quer seja o álcool, adubos, combustíveis, etc. Louvemos o Sr. Ministro da Economia pela intenção revelada e não lhe neguemos o nosso apoio.
No entanto, isso não impede que chamemos a atenção, embora esclarecida, de S. Ex.ª para a situação em que fica a economia de uma região, que somada à de outras fará a economia nacional, e a quem Deus não deu benefício de dotar de terrenos capazes de diferentes culturas agrícolas de rendimento sofrível. O lavrador regional não insista em que o figo seja destinado a álcool; só deseja do Governo, que em 1957 considerava acção útil a constituição de uma rede adequada de destilarias cooperativas (das quais duas estão em laboração e com pleno êxito) e que lhe deve garantias de continuidade para a sua exploração agrícola, o aconselhe e o oriente na busca de soluções para colocação do produto que as suas canseiras e o seu trabalho vem extraindo da terra.
O Sr. Virgílio Cruz: - Muito bem!
O Orador: - O agricultor que, por política sugerida pela Administração, aderiu à solução cooperativa, pelas débeis condições de exploração das suas pequenas empresas agrícolas, fica surpreendido e preocupado pela suspensão de construção de uma destilaria que já fora dada de empreitada e a quem facilmente convenceram do benefício, pelo exemplo das duas que já funcionavam.
Parece-lhe que, se houve necessidade de uma comissão para buscar novas matérias-primas para fabrico do álcool, também não era menor a necessidade de criar unia outra comissão para lhe indicar o destino que deve dar ao seu figo, por forma que as conclusões que fossem adoptadas entrassem simultaneamente em execução.
Sr. Presidente: nós também não ignoramos que o consumo do álcool subiu extraordinariamente nos últimos anos.
A crise de excesso verificada em 1954, com reservas de 5 000 000 l de álcool, passámos à crise de carência dos nossos dias. O consumo de álcool, que nas campanhas de 1953-1954, 1954-1955 e 1955-1956 oscilava à volta de 6 500 000 l atinge em 1956-1957 o volume de 7 400 000 l, em 1957-1958 o de 8 500 000 l e em 1958-1959 o máximo de 9 053 648 l.
Por desconhecimento do problema, recusamo-nos a tirar conclusões, mas não podemos deixar de acentuar a coincidência de ter sido simultâneo o aumento do consumo do álcool o aumento do preço do vinho. Com efeito, o preço do vinho, que nos anos de menor consumo de álcool andava abaixo dos 40$, sobe em 1957-1958 para 43$80 e em 1958-1959 atinge 64$31, por duplo decalitro.
Admitindo a coincidência, e não querendo atribuir o consumo a fins menos legítimos, como o do vinho designado por «vinho a martelo», pois que não duvidamos do maior escrúpulo na passagem de requisições de álcool, confirmamos mais uma vez a necessidade da procura de outras matérias-primas que possibilitem álcool mais barato, porquanto já se verificou a insuficiência do figo para abastecimento do mercado nacional, e não consideramos impossível a nossa presença nos mercados internacionais.
No entanto, também não ignoramos que é da maioria dos países a preocupação de evitar o alcoolismo e o estabelecimento de um leque de preços em que se possa encontrar álcool barato j ia rã as indústrias aconselhadas e álcool caro para o consumo humano ou pura indústrias ricas, de que, como título, se costuma citar as da perfumaria.
Em Portugal, o caso também foi considerado, e é do nosso conhecimento ter o Conselho Técnico do Álcool, por recurso às sobretaxas cobradas pela Junta Nacional do Vinho, encarado a possibilidade de colocar álcool no mercado com várias ordens de preço, tendo em conta a sua aplicação, conforme se destine a fins domésticos ou industriais.
Se seguirmos a política mundialmente adoptada, não duvidamos de que o álcool do figo possa ter colocação certa, dado que o custo é susceptível de melhoria, por o valor da matéria-prima só em pinico mais de 50 por cento contribuir para a formação do preço. Além disso, o preço no mercado é fixado lendo em atenção razões de higiene, sanidade e moralidade.
O problema é demasiado complexo e não se pode conter com intervenções deste tipo. Procurámos esquematicamente dar uma ideia dessa complexidade e do desânimo de produtores modestos a quem o Governo, em 1945, reconheceu os méritos e fez uma promessa em documento escrito que assim reza: «O sacrifício que se impõe no momento presente não pode, porém, deixar de ser registado de forma bem marcada e não deixará igualmente de ser considerado sempre que haja de ser encarado o problema do álcool».
Talvez por conhecimento deste facto, o engenheiro Amaral Neto fez ao Governo a pertinente pergunta que consta do Diário das Sessões n.º 170, pois que o problema do álcool está novamente a ser encarado com desconhecimento da promessa, som a presença dos produtores de figo, que só na região demarcada são 15 000, e com a presença dos industriais, que no continente são 4.
O Sr. Melo Machado: - Muito bem!
O Orador: - £ n conhecimento dos problemas da minha região que me obriga, com a maior lealdade, de espírito aberto e coração ribatejano, a trazer aqui o que vai na alma da maioria dos que lá mourejam pelo pão nosso de cada dia, um trabalho de devoção pelas coisas da nossa terra.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - É o respeito por uma economia agrária de uma zona do País que desconhece o grande latifúndio, pois que 40 por cento da totalidade da sua população é contribuinte do Estado em propriedade rústica e urbana, numa manifestação de mediania que desejaríamos ver alargada a todo o País; finalmente, é o desejo de colaborar com o Governo, especialmente com o Ministério da Economia, ao serviço do qual se encontram as magníficas qualidades do engenheiro Ferreira Dias, a quem aproveito para render as minhas homenagens.
Por isso me atrevo a pedir à Administração que, além de contemplar os casos a que aludimos, revogue a determinação que suspende a construção das destilarias cooperativas, para restabelecimento da confiança que todos querem ter e da qual comungo, crente no