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15 DE DEZEMBRO DE 1960 201

os protectorados, as concessões, as companhias majestáticas, afirmavam o monopólio da exploração territorial através dos jogos da bolsa e levavam o capitalismo liberal ao mais alto da escala.
Este caso dos chocolateiros foi um caso de triste celebridade.
O grasnar das gralhas foi impugnado, batido, ridicularizado, confundido por fim - sobretudo desmascarado como processo de concorrência menos séria.
Foram de notar na altura, a lisura e dignidade com que as nossas autoridades, como Paiva Couceiro, mostraram as nossas terras, abertas a viagens e a averiguações, a vontade de cumprir lealmente as leis morais e jurídicas e a protecção que sempre se deferia aos que trabalhavam.
A campanha, cortada, de episódios, pejada de habilidades torcidas, que atacava a acção portuguesa e pretendia fazer escândalo, foi desmascarada, batida e resultou num ridículo.
Ataque mais intenso, porém, tem partido dos protestantes e quakers.
De 1878 em diante, pelos Tratados de Berlim, de Bruxelas, Anglo-Luso e de Saint-Germain, as nossas portas abriram-se de par em par às missões protestantes.
A coberto das regras internacionais, episcopais, metodistas, anabaptistas, escoceses, congregados, etc., vieram implantar nas nossas províncias de além-mar missões cristãs, pretendendo por igual difundir a fé, cristianizar, derramar civilização entre gentes portuguesas.
Os governos honraram-nas e receberam-nas em nossa casa, como se nossas fossem.
Uma propaganda hábil tem afirmado que elas fizeram mais que as outras, que estamos possuídos da maior admiração em relação a elas, que ninguém há mais dedicado e que os católicos lhes põem obstáculos que terão de vencer.
Estas missões provêm de vários lados - da Inglaterra, da Suíça, da América do Norte e do Canadá.
Mas nem todas se comportaram dentro da prudência, neutralismo e compostura recomendados pelas obrigações de hospitalidade imposta pela tolerância religiosa.
Algumas, em vez de cristianizar, levantaram a questão religiosa. Em vez de colaborarem e alinharem com as católicas, davam largas a sentimentos de rivalidade e proselitismo. Em vez de disciplina e conformidade, por meios mais ou menos ostensivos punham em cheque o prestígio da autoridade.
O célebre relatório de Mouzinho, Moçambique, 1896 1898, afirmava que aos olhos dos Árabes, dos pretos, aos olhos vulgares, o catolicismo era português, o protestantismo era inglês.
Estas missões reconheciam-se como contrárias aos nossos domínios e suscitavam uma crise de confiança, visto que a lei internacional mandava admiti-las e tolerá-las.
O que não há dúvida é de que protestantes, dentro do nosso além-mar e fora, moveram contra nós detestável campanha, pretextando fins cultuais e de catequese.
Tornaram-se uma base de fricções, de protestos, de reclamações doutros governos, alegando que estavam desfavorecidas, inferiorizadas, e eram até ... perseguidas!
A verdade é que não podia muito estranhar-se que trabalhassem, colonizassem, às escâncaras ou obscuramente, a favor dos seus países de origem.
No fundo, se as deixássemos, desnacionalizavam francamente.
Então, das missões protestantes de Londres, da América, procederam livros, artigos, relatórios, água turva de acusações e protestos, pedidos de reclamação
e intervenção, ataques à lusitanidade e o método muito sabido de pôr em dúvida as declarações, estatísticas e os relatórios oficiais portugueses.
O relatório Ross era um padrão de ataque imoderado, mas foi fácil responder que se havia desentendimento era na área de tais missões protestantes, visto que missionários e nativos não se entendiam nem falavam a mesma língua.
Ora as missões não servem para campanhas do interior nem do exterior, devem cumprir com os seus deveres religiosos, administrar a sua catequese mas contribuir para a ordem social e ajudar a consolidar a autoridade do Estado.
Nas séries de estudos publicados pela tão ilustre e reputada Sociedade de Geografia de Lisboa em 1919, reconhece-se que as missões estrangeiras usufruem direitos consagrados em normas internacionais, mas que puxam por prerrogativas abusivas; desnacionalizam escandalosamente os indígenas; violam as leis da hospitalidade; professam intuitos políticos em vez de obedecerem ao bem geral.
A Sociedade de Geografia entendia que não havia senão um remédio - contrapor-lhe as nossas missões; fiscalizar, limpar os abusos, obrigar à catequese em português e à instrução portuguesa.
Falemos agora da história trágico-marítima, que se dá como vilipêndio português em vez de desgraça marítima.
Parece, à primeira vista, que um repertório de calamidades e desgraças, um padrão de literatura popular, como a História Trágico-Marítima, devia mover à piedade, despertar delicados sentimentos de solidariedade humana, conduzir apenas a um movimento cristão condoído e de admiração pelos que estoicamente, ou cumprindo, resistiram às ondas alterosas, às agitações do céu e à fúria dos cafres; em qualquer caso - ao Destino adverso.
Mas não.
A História Trágico-Marítima, compilação de folhetos de cordel, literatura popular e ingénua, em muitos casos também foi manobrada, erguida e assestada como lâmina política dirigida no coração deste povo.
Pretende-se com ela abafar os Lusíadas e esquecer as Décadas, amarfanhar, escurecer e deitar ao cesto as páginas da epopeia para que fique, em sua vez, um rosário de calamidades.
É assim a má estrela que nos guiava do alto, e o mar, em vez das rotas, da comunicação universal, do alargamento da civilização e do comércio, apenas seria, como diz a Trágico-Marítima, a fria e ingrata sepultura!
Alguns livros que nos últimos tempos nos têm agredido na nossa reputação troçam com a declinação do Império, que substitui a imagem do português descobridor, civilizador, arrogante e corajoso pelo decadente e desleixado viajante das naus, maldizendo a sua sorte e capaz de tudo para salvar a pele.
Em vez de se estudar a história espanhola, estuda-se a nossa, acompanhando as tragédias e desastres marítimos de 1550 a 1660, medindo a sua extensão, comprazendo-se nos detalhes dramáticos, medindo a extensão das catástrofes.
Ironiza-se a nossa sorte, blasona-se e ridiculariza-se o Império.
Do arrogante cavaleiro faz-se apenas um naufragado risível.
O padrão moral do descobridor, do soldado oriental, do pioneiro e do missionário seria apenas uma demonstração de desintegração e aniquilamento.
A expansão condenar-se-ia no colapso dramático chorado pelo naufragado, um mosaico de fraquezas, de perdas, de indisciplina, de inaptidões e de confusões.