O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

20 DE JANEIRO DE 1961 321

Camilo de Mendonça ontem fez aqui a crítica da doutrina e das conclusões insertas na recente portaria emanada do Ministério da Economia sobre os problemas da futura reorganização da indústria de lacticínios no continente e nos Açores.
As palavras claras, as ideias nítidas proferidas e expendidas, como; aliás, é de seu estilo, pelo Sr. Eng.º Camilo de Mendonça, por certo vão encontrar no Pais, e nomeadamente nas zonas mais interessadas na resolução dos problemas do leite, justificado eco e assinalada projecção; e o relevo que a imprensa diária deu às considerações daquele ilustre Deputado são seguramente a prova desse interesse e dessa projecção.
E isso se justifica plenamente.
Com efeito, as reacções que a publicação do Decreto n.º 43 418, de 21 de Dezembro do ano findo, que reorganiza a indústria de lacticínios da ilha da Madeira, provocou naquela ilha por parte da lavoura; e, por outro lado, o estado de verdadeiro alarme em que a lavoura do continente e dos Açores foi colocada perante a ameaça que, para o seu destino, porventura decorre das directivas ou das sugestões expressas, mais ou menos explicitamente, na mencionada Portaria n.º 18 186, está a provocar, principalmente nas regiões mais interessadas do Noroeste português, reacções e protestos a que esta Câmara, até por via da sua constituição, não pode ser insensível nem alheia.
Essas reacções e esses protestos tiveram aqui ontem a sua repercussão através das palavras claras do Sr. Eng.º Camilo de Mendonça, e por forma tão expressiva, e com tal domínio da matéria que bem podemos dizer que a lavoura portuguesa, as suas reclamações e as suas queixas não podiam ter tido aqui mais sincero e qualificado intérprete.
Os apoiados com que a Câmara sublinhou as judiciosas considerações do Sr. Eng.º Camilo de Mendonça são a prova e a nota da atenção e da unanimidade de vistas que essas mesmas considerações provocaram e mereceram; e a análise por S. Ex.ª feita aos problemas que a dita portaria veio suscitar é tão completa que bem dispensa quaisquer comentários com que se pretenda assinalar-lhe o seu relevo ou vincar-lhe as suas linhas de incidência.
Nesta ordem de ideias, tentá-lo seria tarefa de todo o modo supérflua ou até intento frustrado.
Mas não será de todo ocioso ou despropositado trazer ao debate um depoimento mais, de quem, por vir da lavoura e com ela viver e conviver a todo o momento - nu sua vida atribulada, nos seus sacrifícios permanentes, nas suas angústias, mas também, por vezes, embora raras, na luz dos seus anseios e nos suas esperanças-, pode, se não mais, dar a prova de um testemunho vivo e, mais qualificadamente ainda, de um testemunho vivido.
Com efeito, Sr. Presidente, no exercício, desde há mais de uma dúzia de anos, de funções directivas num grémio da lavoura situado precisamente muna zona do Noroeste português onde a produção leiteira é uma das pequenas grandes riquezas da modesta lavoura da região, tenho assistido, desde longa data, como .espectador necessariamente interessado, se não mesmo como comparticipante directo, à dura batalha que a lavoura da região vem travando desde há longos anos contra inimigos de toda a ordem - os piares dos quais talvez não sejam mesmo os próprios elementos naturais - para se emancipar da intervenção de intermediários que a sufocam e para conquistar esse mínimo de condições de vida que lhe facilitem desfrutar, como as demais actividades, de um lugar ao sol.
Para tanto teve de travar e vencer algumas duras batalhas contra grupos de interesses que a todo o momento tentavam impedir-lhe esse movimento ascencional.
Porém, a grande batalha, a maior conquista, foi, quanto a mim, a lavoura ter conseguido fazer a sua própria organização à base do princípio corporativo que informa e define o estilo do nosso regime político e económico.
E aqui cabe e supõe-se que é devida uma palavra de gratidão a todos quantos se bateram e sobretudo proclamaram, nomeadamente em bases legais, a organização corporativa da agricultura portuguesa.
Contudo, do simples facto da organização é evidente que não decorre logo, como por milagre, a solução de todos os problemas que colidem ou implicam com o sector da agricultura, havendo por isso, muitas vezes, necessidade de contemplar mais directamente o tratamento dos problemas que contendem com determinados produtos.
Assim sucedeu com os problemas do leite e dos lacticínios.
Efectivamente, uma legislação um tanto ou quanto intensa foi contemplando sucessivamente o problema e tentando encontrar as linhas da sua solução em matéria de política de lacticínios, mas, a meu ver, sem que tal legislação tivesse conseguido estabelecer perfeito equilíbrio e rigorosa harmonia entre as três forças em presença - a produção, a transformação (e o comércio) e o consumo.
Quero referir-me, nomeadamente, ao Decreto-Lei n.º 29 749, de 13 de Julho de 1939, que criou a Junta Nacional dos Produtos Pecuários, definiu, em seu relatório, a política, ao tempo dominante em matéria de lacticínios e estabeleceu o princípio da criação de zonas do abastecimento das fábricas ou dos agrupamentos de fábricas - zonas de abastecimento essas que vieram a ser definidas e delimitadas pela Portaria n.º 9733, de 10 de Fevereiro de 1941.
Tal condicionamento provocou uma situação de verdadeira sujeição dos produtores dessas zonas ao comando, se não, muitas vezes, no arbítrio dos industriais de que dependiam, colocando aqueles produtores, já de si dispersos e sem força bastante para poderem reagir, numa posição de angustiosa inferioridade em face da indústria dominante e sem possibilidade prática de qualquer reacção capaz ou eficiente, nomeadamente para o estabelecimento de um preço equitativo do leite para além do mínimo oficialmente estabelecido.
Isto é tão exacto quanto é certo que resultaram infrutíferas, evidentemente por motivo daquelas considerações, todas as tentativas com que o Grémio da Lavoura da minha região procurou remover e modificar, em representação dos produtores, aquela infeliz e triste situação de inferioridade a que me refiro.
A delimitação das zonas e a sua sujeição a determinadas fábricas ou grupos de fábricas das Respectivas áreas, constituindo verdadeiros monopólios de abastecimento, nunca, pois, foi bem aceite pela lavoura; mas se não fora a desorientação da própria indústria, que em determinado momento, numa concorrência desordenada entre industriais, pôs em xeque o princípio das zonas de abastecimento, invadindo uns as áreas ou as zonas a outros pertencentes, tal regime de inferioridade e sujeição ter-se-ia mantido por muito tempo e não se sabe se ainda hoje perduraria.
Claro que aquele regime de monopólio derivado da criação das zonas tinha de merecer da parte da lavoura interessada justificada, reacção;...

O Sr. Camilo de Mendonça: - Muito bem!

O Orador: - ... e daí as queixas e sucessivas representações com que essa mesma lavoura sucessiva-