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1486 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 58

A metrópole, por exemplo, tem um consumo anual de fibras de 4,9 kg, nas quais se encontram incluídos 2,9 kg de tecidos de algodão. Não é ura país que tenha atingido pleno desenvolvimento, pois, se este fosse o caso, a capitação no consumo de tecidos das diversas fibras teria de ser muito superior.
É interessante mencionar, apenas para estabelecer paralelo e ver até onde poderemos chegar um dia, os casos dos Estados Unidos, da Inglaterra e da Suíça, cujas capitações em tecidos das diversas fibras são, respectivamente, de 13.5 kg, 31,7 kg e 11,5 kg, cabendo aos tecidos de algodão os consumos de 10,3 kg, 5,8 kg e 6,6 kg.
A capitação da República da África do Sul de tecidos de algodão é de 2,3 kg e a da Federação das Rodésias e Niassalândia é de 1,3 kg.
Estes números referem-se a estatísticas respeitantes a 1958 e foram extraídos do trabalho intitulado «Considerações sobre o fomento da cultura algodoeira em Moçambique», da autoria do engenheiro Leonel Câmara, trabalho que me serviu de guia em certos passos desta intervenção.
É fácil calcular, pelos números apontados, que são enormes as possibilidades de Moçambique na indústria de tecidos de algodão para o consumo da sua própria população, à medida que a mesma for subindo na conquista de uma vida económica de nível mais elevado.
Não se compreende, portanto, que a indústria de fiação e tecidos de algodão em Moçambique não seja, já hoje, uma grande e positiva realidade, a sua primeira indústria mesmo, que daria trabalho a muitos milhares de operários.
Mas enquanto se mantiverem em vigor o artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 33924 e o artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 34 643 não será permitida a instalação em Moçambique de fábricas de fiação e tecidos de algodão além da fábrica, de Vila Pery, cuja capacidade de laboração se encontra esgotada e que também não pode aumentar a sua produção pelos mesmos motivos.
Além do grande e prometedor mercado interno, ao abrigo do qual Moçambique pode desenvolver e fazer prosperar uma indústria têxtil de grandes proporções, ficam ainda ao seu dispor importantes mercados de exportação, que poderão ser fàcilmente conquistados, com altos benefícios para o desenvolvimento da sua economia. Sobretudo a exportação de fio de algodão para países próximos de Moçambique poderá atingir proporções de grande importância.
A República da África do Sul. a Federação das Rodésias e Niassalândia e Madagáscar há alguns anos que vêm sendo regulares compradores de fio de algodão produzido pela fábrica de Vila Pery. E maiores seriam certamente as compras efectuadas por aqueles países se a fábrica moçambicana pudesse aumentar a sua produção. Pode dizer-se abertamente que o fio de algodão que aquela fábrica porventura produzisse em maior quantidade para ser exportado em nada afectaria a indústria têxtil da metrópole.

O Sr. Gamboa de Vasconcelos: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Faz favor.

O Sr. Gamboa de Vasconcelos: - No trabalho de V. Ex.ª, que eu tenho estado a ouvir atentamente, há um aspecto que me suscita dúvidas.
Há pouco, nós falámos de uma integração integral, onde está incluída, portanto, uma integração económica donde não se afasta a ideia de um espaço económico português. Se realmente se parte do conceito de integração económica, parece-me que devíamos dotar as populações, tanto da metrópole como das províncias ultramarinas, com os meios necessários para que tenham um nível de vida semelhante. Elementar se torna, pois, polo menos para um leigo nesses assuntos, como eu, que nos sítios onde a terra é vasta e propícia e a gente pouca se deva desenvolver a agricultura e, pelo contrário; nas áreas de forte demografia e em que o solo é escasso ou pobre se deva desenvolver a indústria. Só assim se poderá falar de integração e, além dela, de uma distribuição equitativa dos meios de vivência.
Isso que V. Ex.ª preconiza, de uma industrialização em Moçambique, poderá estar bem relativamente a Moçambique, mas não está inteiramente certo relativamente a uma integração económica nacional.

O Orador: - Nós defendemos certos aspectos da descentralização, como seja a descentralização administrativa. Em Moçambique nós somos tão bons portugueses como aqueles que existem noutras parcelas da Nação.

O Sr. Gamboa de Vasconcelos: - Não me referi ao aspecto político da questão. Referi-me ao condicionamento industrial, que não pode deixar de existir numa integração económica.

O Orador: - Se V. Ex.ª tivesse ouvido a minha intervenção de ontem verificaria que só defendo o condicionamento industrial dentro de cada província.

O Sr. Gamboa de Vasconcelos: - Mas isso é a negação das possibilidades de um espaço económico português.

O Sr. Presidente: - Lembro a V. Ex.ª, Sr. Deputado João Correia, que o tempo de ontem o de hoje já ultrapassa o tempo regimental. Por isso, para que possa concluir as suas considerações, sugiro que não permita mais intervenções.

O Orador: - Peço desculpa, mas não posso permitir mais interrupções.
Até em casos desta importância, que um simples diploma fàcilmente remediaria desde que houvesse o desejo de se encararem estes problemas sem favoritismos. se continua a asfixiar o desenvolvimento da província, sem se atentar que actos desta natureza, de descuido pela solução de problemas do ultramar, são punhaladas traiçoeiras dadas no próprio corpo da Nação.
Admita-se, embora isso não seja de admitir, que se mantenha em vigor, contra todas as regras da boa defesa do património nacional, legislação, como aquela a que me tenho vindo a referir, que estrangula e impossibilita o desenvolvimento de grandes parcelas da Nação, como seja, por exemplo, a província de Moçambique, porque se pretende, por esse processo, proteger uma indústria têxtil metropolitana que tem vivido, em parte, à sombra dessa protecção, muito embora Moçambique seja uma produtora em grande escala da matéria-prima dessa indústria. Mas o que não se compreende, não se aceita, nem se admite, é que a Moçambique não seja permitida a laboração de fábricas de fiação de artigo que não faria qualquer concorrência à indústria metropolitana e que poderia ser largamente exportado para o estrangeiro, com excelentes reflexos na sua economia.
Esta injustiça escava no corpo de Moçambique uma das suas feridas mais profundas, impedindo que esse grande corpo cresça e se desenvolva como seria lícito esperar-se.