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6 DE ABRIL DE 1963 2295

no parecer da Câmara Corporativa relativo à revisão da Lei Orgânica do Império, em 1946:

Sem desconhecer alguns inconvenientes da descentralização administrativa, julgo, todavia, que ela é a que mais facilita a boa administração e estimula o desenvolvimento dos territórios do ultramar e que os seus inconvenientes com mais facilidade se corrigem que os do sistema contrário, e isto precisamente por existirem os tais meios rápidos de comunicação que o ilustre relator invoca para justificar a tese oposta.
Em todo o caso, se no sistema de descentralização se tornam possíveis as iniciativas mal ponderadas, os seus inconvenientes afiguram-se-me menos graves que os da inércia a que os governadores estão condenados no regime actual de apertada centralização, em que todas as iniciativas fecundas e todas as decisões pertencem ao Ministro.
E certo que a descentralização para ser eficaz requer ainda maior escrúpulo do que actualmente na escolha dos governadores coloniais, a qual só deve recair em pessoa que tenha revelado inequivocamente qualidades de carácter, tino administrativo e bom senso político.
Assim se vê que Vicente Ferreira, como todos os grandes vultos da nossa administração ultramarina, é partidário da descentralização administrativa, ampliando-se, como corolário, as competências e o direito de iniciativa dos governadores-gerais e governadores subalternos, sem prejuízo da fiscalização exercida pelo Ministro e da sua intervenção activa e oportuna, para definir e orientar a política geral, que em matéria de administração ultramarina o Governo da Nação entenda seguir.
Enveredar por caminho diferente, por uma política de centralização, em que a maior parte da iniciativa e da competência passam para as mãos do Governo Central, em que a administração é uniformizada e integrada, não parece realístico porque não toma em consideração os condicionalismos geográfico, social, cultural, étnico e económico dos territórios ultramarinos, nem as aspirações e os desejos das populações.
Diz o Prof. Afonso Queiró, e muito bem, no douto parecer da Câmara Corporativa: «Trata-se de regra de ouro, elementar, mas eterna, de sabedoria política, que a tais condicionalismos, quando suficientemente vincados, não pode deixar de se atender».
Uma centralização de iniciativas e competências e uma uniformidade do direito que em nome da unidade nacional entravassem o desenvolvimento e o progresso dos territórios ultramarinos e frustrassem as aspirações dos habitantes a níveis mais elevados de cultura e padrões mais altos de bem-estar só poderiam gerar ressentimentos e surda revolta, que comprometeriam irremediavelmente o bem precioso que todos queremos preservar.
Solução que não comporta já os mesmos perigos que a integração centralizadora, ainda que não exclua certas dificuldades de ordem prática e de ordem técnica, é a integração progressiva dos serviços provinciais nos serviços nacionais, conforme se prevê do n.º 3.º da base XXXVI da proposta do Governo, preceito, aliás, já constante da actual Lei Orgânica - n.º 2.º da mesma base XXXVI -, salvaguardada a descentralização já outorgada, sem o que à perda da iniciativa e competência dos órgãos locais acresceriam os males resultantes de um controle central muito distanciado e sem o conhecimento suficiente dos problemas para a sua resolução adequada e oportuna.
Assim, estaríamos em face de transferência de competências a processar-se em dois planos: verticalmente, no sentido de centralização para os órgãos locais; horizontalmente, do Ministério do Ultramar para outros sob os quais estejam os grandes interesses comuns a todo o território do Estado Português.
Sem que signifique de forma nenhuma menos apreço por todos os que, na longa história da nossa administração ultramarina, têm, através do Ministério do Ultramar, servido a Nação na defesa e valorização das suas parcelas de além-mar, não posso deixar de pensar que a concentração exclusiva dos assuntos respeitantes à administração ultramarina num único Ministério especializado, se teve alguma, vantagem do ponto de vista da coordenação e do planeamento ou na formação de especialistas e técnicos de assuntos ultramarinos, é, em grande parte, a causa, ou uma das razões, do tão discutido alheamento da metrópole nos problemas do ultramar de que todos nos queixávamos. Talvez outra fosse a consciência da Nação quanto à, sua dimensão ultramarina, mais mentalizada fosse a administração pública e mais pujantes e progressivas fossem muitas das actividades do ultramar se por todos ou mais Ministérios estivessem repartidas as responsabilidades de as impulsionar, orientar, amparar e fiscalizar.
Já tenho ouvido afirmar a inexequibilidade do sistema, mas não me consta que esteja II resultar mal, pelo contrário, nos serviços em que foi aplicado - forças armadas, aeronáutica civil e serviços meteorológicos -, apesar de quanto a estes o regime ainda ser ambíguo, já que os respectivos directores-gerais dependem, no que respeita ao ultramar, do respectivo Ministro, e não daquele a que pertencem as suas direcções-gerais.
Quem contacte com os serviços públicos provinciais, em especial os mais acentuadamente técnicos, recolhe a opinião, que é quase unânime, de que prefeririam, sem hesitar, depender, rio plano superior das competências que cabem hoje ao Ministério do Ultramar, dos Ministérios que na metrópole superintendem nos respectivos ramos de serviços.
Estes são dotados de quadros mais abundantes e de superior nível técnico e científico e dispõem de uma orgânica interna mais ampla e actualizada e, portanto, mais apta a resolver bem e depressa os problemas que se lhes apresentem. Em contrapartida, têm actualmente um desconhecimento completo dos problemas ultramarinos, o que requereria um período mais ou menos longo de adaptação e até algumas alterações na sua orgânica.
E notório que o volume, a diversidade è a complexidade dos problemas que hoje afluem ao Ministério do Ultramar excedem em muito a capacidade da sua orgânica e dos seus quadros, razão por que, mesmo apesar do esforço esgotante a que estão permanentemente submetidos os seus quadros superiores, os assuntos se amontoam, a sua solução se retarda e muitas vezes morrem estrangulados e bloqueados num canal demasiadamente estreito para dar escoante ao caudal imenso dos problemas do ultramar.
A situação vai atingindo os limites do insustentável e impõe uma opção. Ou se liberta o Ministério de um grande número de serviços, se não da maioria dos serviços que lhe estão adstritos, transferindo-os para os respectivos Ministérios, ou haverá que transformá-lo num super ministério, com tantos subsecretários quantos os ramos principais da administração pública e com os serviços largamente ampliados, o que o converterá num autêntico governo para o ultramar ao lado do Governo da Nação. Tenho sérias dúvidas se será este último o caminho mais indicado.