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2292 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 90

E que uma é sobretudo obra urbana, do interes se local de uma grande cidade; a outra só serve uns quantos milhões de rústicos espalhados ao longo de várias centenas de quilómetros por cinco províncias de Portugal. Será então justo que paguem, nos automóveis ou camiões colectivos em que se transportem, só para não serem brutos e teimarem em viver apegados aos seus campos, quando é tão mais doce e, pelo visto, acarinhada, a vida nas grandes cidades, onde as multidões sabem fazer sentir o peso da sua força e a força das suas preferências?

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Será ..., mas fico-me a pensar onde estará então a sinceridade e a coerência em todos esses protestos e projectos que por aí se fazem de desenvolvimento regional, em todas as reprovações da hipertrofia dos centros urbanos, se à cidade se der, e em dobro, o que ao campo se impõe que pague!
Fico-me a pensar nisto por agora; talvez também algum de VV. Ex.ª que tenha tido a paciência de me escutar: mas amanhã, quando a ponte da Arrábida começar a sua útil função, se simultaneamente continuar a ser pago o uso da ponte de Vila Franca, será decerto todo o País a perguntar-se surpreso e reprovador como seja isso de haver duas medidas da dedicação do Estado ao serviço dos povos, como num sítio pode prestá-lo sem preço e noutro só contra pecúnia.

O Sr Pinto de Mesquita: - Eu nesse ponto aplaudo V. Ex.ª

O Orador: - Não quero crer que tal seja possível; confio em que este aspecto discriminatório, a verdadeira iniquidade de uma situação assim, se efectivamente se verificasse, já o Governo os terá ponderado e saberá evitar oportunamente; mas, pelo sim, pelo não, entendo do meu dever de Deputado pedir a sua atenção para a hipótese, e lembrar-lhe esta, que seria verdadeira bagatela no acervo das suas preocupações se não tocasse ao mais essencial dos seus deveres: o de administrar com justiça igual para todos os portugueses!

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Faço pois ardentes votos por que concomitantemente com a inauguração da ponte da Arrábida se suprima a cobrança da portagem na Ponte do Marechal Carmona, e, com estes, tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Presidente: - Vai passar-se à

Ordem do dia

O Sr. Presidente: - Continua em discussão na generalidade a proposta de lei de alterações à Lei Orgânica do Ultramar Português.

Tem a palavra o Sr. Deputado Herculano de Carvalho.

O Sr. Herculano de Carvalho: - Sr. Presidente: já na intervenção que fiz nesta Assembleia há coisa de um ano, ao referir-me ao sistema de administração civil do ultramar, apelei para o Governo pedindo uma profunda revisão de tal sistema. Baseando-me na experiência por mini vivida em Timor, dei a entender a necessidade de se conceder ao ultramar o direito do usufruto de um sistema municipalista tal como ele é entendido para uso na metrópole. Disse então ser preciso procedermos a «um profundo exame de consciência» em matéria de política administrativa e, muito embora nesse momento estivesse apenas visando o sistema administrativo no âmbito limitado das circunscrições e concelhos, tinha a convicção de que a reforma sugerida seria o primeiro passo para uma geral revisão do corpo das leis que regem a vida administrativa do Portugal ultramarino.
Ao apresentar aquelas minhas considerações tomei como ponto de partida a promessa contida no artigo 134.º da Constituição Política da Nação, promessa que se traduz na integração dos sistemas administrativos de cada território nos sistemas em uso nos territórios politicamente mais desenvolvidos. Deste modo, ao trazer aqui o problema da integração tive como objectivo essencial chamar a atenção para o direito que têm as províncias de além-mar de gozar dos benefícios do sistema vigente nas províncias metropolitanas, sistema esse tipicamente autárquico, profundamente radicado nas nossas tradições e que tão bons resultados tem dado.
Mas ao chamar aqui, por me parecer que não estava sendo realizado, o preceito constitucional da integração, não pus sequer em causa, por me parecer pelo menos já parcialmente realizado, o outro preceito, também constitucional, da descentralização administrativa.
Permita-se-me agora que, antes de entrar propriamente na análise da proposta de revisão da Lei Orgânica do Ultramar, refira o meu modo de ver quanto aos princípios básicos da nossa Constituição em matéria de política ultramarina, ou melhor, a forma como a meu ver esses princípios se podem realizar plenamente, tomando os dois preceitos enunciados como sequência ou consequência de um outro que é sua premissa: a unidade da Nação.
Esses princípios, por si só bastantes para definir todo um corpo de doutrina, são portanto: a unidade política do mundo português e a integração e a descentralização administrativas. Ainda que na Constituição outras disposições não se incluíssem acerca do nosso ultramar, esta tríplice indicação seria suficiente para mostrar o rumo da vida política e administrativa desse mesmo ultramar.
E assim, vejamos. Para se realizar o princípio da unidade toma-se como consequência imediata o direito à integração, ou seja. o direito de as populações de além-mar se regerem pelos princípios administrativos gerais aplicados à vida da metrópole.

O princípio da descentralização é simples enunciado de ordem prática, sensata, que traduz a ideia de que o comando à distância, centralizado, não permite o exercício eficaz da administração e, a meu ver, incide sobretudo na actividade do Poder Executivo; a descentralização é também fruto do ponto de vista realista de a ambientes particulares deverem corresponder normas de vida com cambiantes particulares.

Daqui o reconhecer-se a necessidade de, por um lado, se proceder a uma operação de desconcentração de poderes dos órgãos da administração central para os órgãos provinciais e, por outro, a de se conceder a cada território um estatuto próprio, cujas normas correspondam aos condicionamentos específicos do meio local.
Este mesmo princípio reconhece implicitamente que a diferenciação das leis será resultado das diferenças de cada território, considerado em si mesmo, em relação a cada um dos restantes, e não do ultramar, considerado em bloco, em relação u metrópole.