3278 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 131
Noutro passo do relatório, referindo-se aos factores que têm influído na baixa de produção agrícola: diz-se:
De entre estes importa destacar, por um lado, o reduzido volume de investimentos e de mão-de-obra qualificada e, por outro, a inadequação da estrutura da propriedade e do sistema de culturas tradicional à necessidade de um mais completo aproveitamento dos recursos naturais do País, implícita num processo de desenvolvimento económico acelerado ...
... Tem constituído preocupação constante dos Poderes Públicos a resolução dos constantes problemas da agricultura. Assim, o Governo tem procurado obviar à escassez de investimentos neste sector através, nomeadamente, de empreendimentos abrangidos nos I e II Planos de Fomento ...
E no parecer sobre as Contas Gerais do Estado de 1961, escreveu-se:
O não se terem tomado medidas enérgicas no sentido de descentralizar a vida industrial e até a vida administrativa relacionada com actividades económicas e de promover a modernização de estruturas agrícolas, incluindo a dos processos de exploração e a valorização dos produtos, gerou uma situação grave nos sectores agrícolas ... A percentagem de 40,5 da população activa na agricultura é alta. O produto que jesuíta da sua actividade é baixo, comparado com outras actividades. A capitação do produto neste sector subiu menos de 2000$ no decénio, enquanto noutros sectores o aumento foi superior a quatro, cinco ou mais vezes.
Todos estes factos e ainda outros que podiam apontar-se são claros e elucidativos sintomas de que a agricultura se encontra num estado de «crise», de verdadeira e grave «crise», no sentido técnico-económico, que habilitam a formular prognóstico pessimista, se não forem rapidamente debeladas as suas causas mediatas e imediatas.
Mas para debelar as causas é preciso conhecê-las.
Determinar as causas das crises ou, como diz o Prof. Doutor Costa Leite (Lumbrales) no seu Ensaio sobre a Teoria das Crises Económicas, o problema das crises é um problema que «encerra em si um tão grande número de questões fundamentais, que se pode afirmar ser um dos problemas basilares da ciência económica».
Ora eu não sou um estudioso permanente da ciência económica.
Sou pouco menos do que um leigo na matéria.
Isso não impede que, à luz de alguns conhecimentos, da observação dos factos, da vivência de alguns dos problemas do sector agrícola e de outros sectores da nossa vida económica, possa arriscar algumas considerações sobre as causas determinantes do estado de crise em que se encontra a nossa economia agrícola.
Creio que a actual crise deriva de causas gerais, ou sejam causas comuns a todas as economias agrícolas, e de causas particulares da nossa economia agrícola.
O Sr. Deputado Amaral Neto apontou, exaustivamente, umas e outras no desenvolvimento do seu aviso prévio.
As causas gerais mais se denunciam no processamento económico dos tempos que correm, em que o impulsionamento da produção em todos os ramos de actividade é subordinado a planeamentos elaborados à base de critérios científicos onde se alinham todos os factores que nela intervêm e na medida em que intervêm, para através de uma racional e lógica articulação dos mesmos obter o maior rendimento com o menor custo, fixando-se o preço da venda enquanto subsistir a conjuntura que foi considerada.
Simplesmente o processo é muito contingente na agricultura, porquanto nesta há um factor decisivo mas incontrolável, que é o factor tempo.
Da influência deste factor resulta a impossibilidade de prever e assegurar a produção unitária, o que não acontece na produção industrial.
Daqui deriva principalmente a instabilidade dos preços de custo agrícolas e a produtividade da agricultura.
Acresce que a formação dos preços de custo de produção dos produtos agrícolas depende também em boa parte, e cada vez mais acentuadamente, do preço dos produtos industriais que a agricultura tem de pagar para obter a sua produção: máquinas, fertilizantes, insecticidas, herbicidas e toda a gama de alfaias indispensáveis para a actividade agrícola.
E todos estes produtos industriais têm de ser pagos pelo agricultor por preços que incorporam altos salários industriais; benefícios sociais para os operários; lucros assegurados aos empresários e aos intermediários que se interpõem entre o industrial produtor e ele consumidor.
Para esses preços que a lavoura tem de pagar a indústria não há limitações legais nem qualquer condicionamento em geral, contrariamente ao que acontece aos produtos agrícolas considerados de primeira necessidade.
Daí provém o desequilíbrio que facilmente se estabelece entre a rentabilidade de actividade agrícola e da industrial.
Para a formação desse desequilíbrio contribui, ainda, a pressão que os salários industriais exercem sobre os salários agrícolas, pois estes tendem a
aproximar-se ou mesmo igualar-se àqueles, o que é compreensível e socialmente justo.
Tudo isto contribui para a falta de rentabilidade da agricultura.
Se estas e outras causas que aqui foram tão proficiente e exaustivamente apresentadas e demonstradas pelo Sr. Deputado Amaral Neto têm carácter geral, no sentido de que são comuns a todos os países, outras há particulares da nossa actividade agrícola que mais agravam a sua situação e arrastam a sua economia para o estado de crise em que se encontra.
Entre elas avultam a natureza do nosso solo, considerado dos mais pobres da Europa, só se assemelhando a ele o do Sul da Itália e o da Grécia; a marcada irregularidade do nosso clima, de chuvas torrenciais no Inverno e de extrema secura no Verão; a exiguidade dos nossos mercados, quer internos, quer externos, para a colocação dos produtos da nossa agricultura; a diminuta produtividade do nosso trabalho agrícola e o peso que os salários têm no custo de produção; a falta de adequada orgânica da comercialização dos nossos produtos agrícolas, que chegam às mãos do consumidor por preços enormemente elevados em relação àqueles por que são pagos à lavoura; a falto, de ajustado ordenamento das nossas culturas por carência de elementos oficiais que permitam estabelecê-lo; a circunstância de uma grande parte dos produtos industriais que a agricultura tem de utilizar para o exercício da sua actividade produtora ser de origem externa e aqui chegar onerado com direitos alfandegários e outros encargos que excessivamente elevam o seu preço.
A estas causas particulares da nossa actividade agrícola outras se podiam juntar bem conhecidas de todos por dia a dia serem apresentadas na imprensa e nas publicações periódicas de carácter agrícola.
Todas esta causas, gerais umas e particulares da nossa agricultura outras, têm vindo continuadamente a corroer a nossa economia- agrícola, conduzindo-a ao ponto de crise